segunda-feira, 5 de julho de 2010

Vamos aprender a torcer com as crianças

Na sexta-feira, após o jogo da seleção brasileira saí de casa para aproveitar o tempo. Resolvi fazer compras, ritual que sigo toda semana como uma necessidade. Parecia um daqueles feriados prolongados. A diferença era que as pessoas estavam em Goiânia. A cidade não estava vazia. As pessoas, em suas casas, entristecidas, davam a dimensão do que se transforma o país, quando se cria uma expectativa nacional em que a vitória, no caso do futebol, passa a ser a condição da alegria, satisfação, orgulho de todo um povo.

Muito embora um povo “mal-acostumado”, para quem ganhar, sempre, é o que importa. Isso, potencializado pela maneira como a mídia trata o assunto, de forma, inclusive, a angariar audiência, criando um clima de tragédia, aumenta o sentimento de frustração. Cabisbaixos, saímos à busca dos culpados, precisamos de um, para torná-lo o “bode expiatório”, o “cristo”, sobre o qual descarregaremos nossa ira.

Esse ambiente de tristeza e frustração espalhava-se por todo o supermercado. Eu, mesmo tentando encarar o resultado de forma racional, também lamentei a derrota da seleção. Portanto me incorporei àquele sentimento coletivo. Mas as crianças, mesmo que influenciadas por nós adultos, tem um limite na euforia. Envolvem-se pela festa, mas se algo saiu errado, imediatamente elas recompõem-se e buscam outro pretexto para divertirem-se.

Até hoje, passados dois anos e sete meio da morte de milha filha, andar pelos corredores de supermercados ainda me traz fortes lembranças dela. Eram raras as vezes em que ela não me acompanhava. E, claro, as lembranças são carregadas de tristezas. Naquele dia, em meio à todo aquele lamento da derrota, triste como todos os brasileiros, e saudoso pela lembrança da minha filha, me vejo na fila do caixa tendo à minha frente uma garotinha, cuja idade não deveria ultrapassar os oito anos.

Serelepe, alegre, por todo o tempo chamando a atenção dos pais, como toda criança nessa idade, ela parecia não dar importância ao motivo por aquele dia triste.

Lembrei-me mais ainda de minha filha, e como sempre acontece nesses casos, é difícil segurar a emoção. Passa um filme pela minha cabeça. Me vejo diante dela, pois os gestos são parecidos, afinal, trata-se de uma criança.

Como disse no primeiro post que incluí nesse blog, uma das razões por eu tê-lo criado é para aliviar esse sentimento, extravasar minhas emoções, algo que sempre me habituei a fazer desde quando era estudante de segundo grau. Escrever sempre acalmou meus ânimos. Além de registrar momentos que são importantes em nossas vidas, como se assim eu pudesse materializar as minhas memórias.

Por isso esse texto é uma catarse, mais também uma introdução ao texto que postarei em seguida. Trata-se de um dos artigos que escrevi para o livro que dediquei à minha filha, publicado em dezembro de 2007, um ano depois de sua morte: DEPOIS QUE VOCÊ PARTIU.

Dentre todos os textos que ali escrevi, o que eu considero aquele que sempre me acompanhará pelo resto de minha vida, sem desmerecer os demais, é o que eu intitulei “Minha Pequena Wendy”. Na sexta-feira, em meio às lembranças e saudades de minha filha, amplificado por aquela frustração que não era somente minha, lembrei-me do que havia escrito um ano e meio atrás, e resolvi que iria colocar esse texto no blog. E assim o farei.

Espero que ao lê-lo as pessoas percebam o quanto de pureza as crianças carregam, e porque a humanidade depende, para ter justiça, tolerância e amor, de sabermos tratá-las com justiça, tolerância e amor. Repito, quase de forma redundante, para dar ênfase àquilo que, embora pareça óbvio, não é aplicado na prática em milhões de lares pelo mundo afora. As crianças, por serem frágeis, terminam sendo vítimas das neuroses de uma vida estressante que aflige as pessoas. São espancadas, abusadas, tratadas covardemente por quem deveria dar exemplos de bom comportamento.

Como incluí no prefácio de meu livro, muitas vezes elas “se transformam em instrumentos para conter neuroses e desabafos de pais ou outros tipos de parentes, que por vezes descontam toda sua ira de momentos ruins seja no trabalho ou no ambiente familiar, nos elementos mais frágeis. As crianças, impotentes diante da raiva de alguns adultos, tornam-se alvos e vítimas das agressividades e transtornos causados por uma sociedade que vive à beira do colapso”.

Às crianças, em nome de minha filha, dedico o próximo texto que publicarei aqui.

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