segunda-feira, 27 de setembro de 2010

DECIFRANDO O SISTEMA CAPITALISTA – CRISES ECONÔMICAS E O PODER DAS GRANDES CORPORAÇÕES

Iniciarei na próxima semana um mini-curso. É uma idéia que eu já vinha alimentando há mais de um ano, desde que as notícias sobre a crise econômica se espalharam pelo mundo a partir de 2008, muito embora ela já estivesse ocorrendo pelo menos desde 2006. E tudo isso começou devido às minhas angústias em trabalhar um tema cuja profundidade não era devidamente noticiada, falseava-se naqueles elementos basilares para se compreendê-la. Ou seja, de que era uma crise estrutural, decorrente da lógica natural do sistema capitalista, que se fundamenta na busca obsessiva pelo lucro e tem a ganância como seu motor principal.

Aproveito o blog Gramática do Mundo, como instrumento importante para difundir idéias que possam se contrapor ao monopólio da informação tradicionalmente repassada pela mídia, quase sempre distorcida, para apresentar aos que nos acompanham o conteúdo deste curso, e convidar os que se interessarem a participar do mesmo. Ele será realizado no Instituto de Estudos Sócioambientais (IESA-UFG) e faz parte da programação do Laboratório de Estudos e Dinâmicas Territoriais – Laboter e do Núcleo de Pesquisas e Estudos em Geopolítica – Nupeg. Serão quatro dias de curso: 05, 06, 07 e 08 de outubro, sempre das 14 às 18 horas. As inscrições devem ser feitas na sala 20 do IESA, até sexta-feira (01/10), mas o número de vagas é limitado.

Logo a seguir transformo em texto o conteúdo do programa e da metodologia que aplicarei ao mini-curso Decifrando o sistema capitalista – crises econômicas e o poder das grandes corporações.

A estrutura do curso

Procurarei, mesmo que de maneira sucinta, analisar o processo histórico que levou à consolidação do sistema capitalista e a partir disso explicar didaticamente como funciona o modo de produção capitalista. Para isso é necessário, antes de tudo, saber como se deu a ascensão da burguesia, as revoluções que ela fez e os mecanismos que adotou para revolucionar uma época e o que viria daí em diante. Também é preciso analisar as principais transformações estruturais que aconteceram, principalmente a partir do século XIX e, já no século XX, a consolidação de um modelo de vida que impulsionou o capitalismo. As transições do poder mercantil – industrial – financeiro e o ápice do sistema capitalista, quando o seu controle passa para as mãos das grandes corporações. E, as crises econômicas, como elementos que alteram mecanismos de controle do capitalismo e acentuam as desigualdades sociais, mas tornam-se elas próprias, novos elementos propulsores de um sistema que se aproveita também das desgraças, sejam sociais, causadas por guerras ou provocadas por catástrofes naturais.

Para entender as crises.

Muito se fala das crises econômicas do capitalismo. Algo que passa a acontecer de forma cada vez mais constante, conforme já dizia Lênin, uma vez que se encurtam as distâncias entre elas. Mas o que pouco se diz é que elas fazem parte da própria dinâmica de funcionamento do sistema, ou seja, o capitalismo se retroalimenta dessas crises.

É para analisar esse processo, e a maneira como o capitalismo encontra saídas para as crises econômicas que ao longo da história definiram a maneira como ele evoluiu, que apresentamos alguns elementos para sua compreensão.

O objetivo é entender o mecanismo de funcionamento do sistema capitalista e encontrar respostas para a sua acelerada ascensão, mesmo que à custa de enormes contradições, como inúmeras guerras, catástrofes, disputas hegemônicas pelo controle do poder mundial, concentração de riqueza paripasso com o crescimento da miséria, definindo como uma de suas características básicas a forte desigualdade social. Paradoxalmente essa desigualdade se dá na contraposição de um enorme sucesso da descoberta de mecanismos cada vez mais sofisticados para produzir mercadorias tecnologicamente avançadas e agregadoras de renda.

O Deus Mercado potencializando divindades menores, mas necessárias para fazer o sistema seguir mantendo sua lógica, o mito do consumo, e a sensação de felicidade que ele carrega, elevado a isso pelas forças ideológicas dominantes, passam a se constituir na base mais importante para a superação de crises econômicas. Renascendo o keynesianismo o Estado surge, em momentos de crise, como a salvação para amenizar seus impactos, mas, fundamentalmente para manter erguida toda a estrutura do modo de produção capitalista, potencializando investimentos que garantem às grandes corporações seguir concentrando renda e riquezas.


Até onde pode ir o poder dessas grandes corporações? E em que medida o Estado, no capitalismo, pode resolver os problemas da distribuição de rendas, da miséria, das desigualdades sociais? É compatível uma lógica concentracionista, em crescimento, do poder das grandes corporações, com a necessidade de impor um freio à usura e ganância a fim de reduzir as desigualdades sociais?

Queremos por meio deste mini-curso, senão encontrar as respostas para essas indagações, reforçar aquelas dúvidas sobre o que fazer, para frear o ímpeto ganancioso dessas corporações e se é possível encontrar saídas, sustentáveis, a um ritmo de desenvolvimento desigual, injusto e concentrador de riquezas.


Objetivo do curso:

O objetivo do curso é identificar como o sistema capitalista se robustece a cada crise. Quais os mecanismos que são responsáveis por essa aparente contradição. E ao mesmo tempo demonstrar como esse sistema vem se transformando ao longo do tempo, no sentido contrário daquele expresso nas primeiras idéias sobre o liberalismo comercial, quando a burguesia combateu o monopólio exercido pelas grandes companhias controladas pelo Estado Absolutista. O que se vê nos dias atuais é um aumento do poder concentrado nas mãos de poucas grandes corporações, a ponto das pessoas não perceberem que se deparam nas gôndolas de supermercados com produtos aparentemente concorrentes, mas que são fabricados pela mesma corporação. Além do controle que elas exercem sobre os Estados, inclusive na definição de determinadas políticas, na medida em que algumas delas possuem valores patrimoniais maiores do que os PIBs de muitos países.

A globalização abriu caminho para essa concentração de poder, presente em todos os setores que lidam com negócios, desde a religião até a mídia, passando pelo controle de marcas, do mercado, e do sistema financeiro. Para onde vai o capitalismo, pós-globalização, com o neoliberalismo desmoralizado, mas mantendo-se ainda de pé esse poder econômico fortemente centralizado nas mãos de poucas corporações que definem, inclusive, nosso modo de viver? Existem saídas ao final desse túnel? São questões que este mini-curso pretende abordar.

Programa e metodologia:

O programa do curso seguirá uma metodologia que visa buscar em filmes e documentários os bastidores de funcionamento do sistema. Serão apresentados quatro filmes/documentários em que esses elementos são postos, a seguir, numa segunda parte da aula serão feitas análises com base naquilo que foi apresentado com o conteúdo de alguns textos que serão deixados à disposição dos inscritos.

1) Na primeira aula o FILME será WALL STREET, PODER E COBIÇA, do diretor Oliver Stone. É interessante começar por esse filme porque ele retrata os Estados Unidos durante o governo de Ronald Reagan, momento de crise econômica, mas de retomada do capitalismo seguindo um novo modelo, o neoliberalismo. O filme foi finalizado no ano de 1985, bem no final do primeiro mandato de Reagan. A partir desta época e daquela que ficou conhecida como a década perdida, o mundo entra em uma nova era, conhecida como GLOBALIZAÇÃO. Com o neoliberalismo o capitalismo retoma sua lógica original e escancara sua opção pela concentração de riqueza, buscando na liberdade de mercado o argumento para desmontar toda a rede de apoio social construída pelo welfare state, de viés keynesiano. Nesta semana entrou em cartaz nos circuitos comerciais a continuação deste filme, abordando agora a crise de 2008, do mesmo diretor, Oliver Stone e estrelado por Michael Douglas.

2) Na segunda aula o documentário a ser exibido é ENRON – OS MAIS ESPERTOS DA SALA. A lógica que impulsionou o capitalismo pós era Reagan, foi a mesma que possibilitou um crescimento meteórico desta grande corporação, que em pouco tempo, devido principalmente pelas relações perniciosas com a família Bush se tornou uma das maiores do mundo no ramo de exploração de energia. Acontece que, segundo o crescente processo de especulação financeira, boa parte daquilo tudo que se apresentava como uma mega-empresa correspondia simplesmente à atividades fraudulentas, inclusive com criação de empresas virtuais encarregadas de vender ações no mercado das bolsas de valores sem nenhum tipo de atividade produtiva.


3) No terceiro dia será apresentado o documentário CORPORATION, dirigido por Jennifer Abbott e Mark Achbar, amplia muito o universo que é representado pelo documentário ENRON. Mostra como as corporações tornaram-se mais poderosas do que o próprio Estado, bem como todo o processo de exploração que leva à uma acumulação espantosa e a um poder incontrolável. O documentário parte de uma decisão judicial nos Estados Unidos que deu às corporações os mesmos direitos que os indivíduos, baseando-se na 14ª Emenda da Constituição dos Estados Unidos, que proíbe ao Estado que este negue, a qualquer pessoa sob sua jurisdição, igual proteção perante a lei. Com base nisso os diretores constroem uma crítica bem humorada ao mundo corporativo e ao poder que ele carrega.

4) No último dia será a vez de vermos o último trabalho do diretor Michael Moore , com seu documentário CAPITALISMO, UMA HISTÓRIA DE AMOR. Seguindo seu estilo mordaz, de uma crítica fortemente irônica, mas bem fundamentada, Moore parte da crise financeira que atingiu os Estados Unidos e explodiu para o mundo em 2008, para mostrar as mazelas do capitalismo, especialmente a lógica gananciosa e egoísta que move o sistema e se apropria do trabalho, da riqueza e da esperança dos trabalhadores. Contudo, Moore aponta possibilidades de superação, a partir da organização das pessoas e do enfrentamento com a lógica perversa que caracteriza esse sistema.

Seguiremos uma nova metodologia, bastante utilizada nos últimos tempos, e expresso em inúmeros artigos que incluiremos na bibliografia. CINEMA E GEOGRAFIA compõem esse novo caminho metodológico, onde exploraremos a capacidade que diretores, produtores e atores encontram para retratar o cotidiano de nossas relações, e buscar em fatos e acontecimentos reais a expressão que transforma em arte nossos cotidianos.

Não necessariamente procuraremos tecer críticas às qualidades artísticas, na medida em que somos leigos neste assunto, mas queremos extrair da capacidade que o cinema possui de nos envolver, para buscar produções cujos temas além de sérios são retratados com competência e qualidade. E que nos servem para irmos construindo o retrato do mundo em que vivemos, a geopolítica mundial, também para nos perguntarmos sempre: para onde iremos? Há vida após o capitalismo?


(*) Será concedido certificado de participação correspondendo a 20 horas/aulas, desde que o percentual de presença não seja inferior a 75%. Ou seja, só poderá haver uma ausência nos quatro dias do mini-curso.

sábado, 25 de setembro de 2010

SOBRE A INTEGRAÇÃO LATINO-AMERICANA

Na semana passada pude discutir um pouco da realidade latino-americana, em um evento na PUC-GO, no HGSR, com o público sendo composto por alunos dos cursos de Relações Internacionais, História e Sociologia. O objetivo do Seminário, coordenado pelo prof. Silvio Costa, era debater a integração do continente americano, desde o Sul até o Caribe.

Gostei do convite porque me deu a oportunidade de me aprofundar em um tema que tem uma extrema relevância, mas que está carregado de simbolismo e ideologia. E, porque coincide também com a proximidade de duas eleições extremamente radicalizadas, embora em níveis diferenciados: Brasil e Venezuela.

Como expositor participou um representante do Itamaraty, especializado na área de Comércio latino-americano. Embora importante as suas observações, apontando os avanços principalmente no financiamento brasileiro em obras de infraestrutura entre o Brasil e demais países com quem temos limites fronteiriços, julguei uma intervenção exclusivamente pautada por elementos econômicos, de certa maneira excessivamente técnica.

Mas não acho esse o melhor olhar sobre a América Latina. Qualquer que seja a abordagem a se fazer sobre as transformações que esse continente vem passando nos últimos anos, ela deve partir das transformações políticas que levaram a alterações significativas nos rumos de países que por muito tempo ficaram hipertrofiados em seus desenvolvimentos, em decorrência da existência de governos ineptos e fortemente submissos aos interesses dos Estados Unidos.

O século XXI trouxe novos ventos à América Latina. Uma sucessão de governos em países como Brasil, Argentina, Bolívia, Equador, Venezuela, Nicarágua, Uruguai, Paraguai, dentre outros, passaram a adotar políticas antineoliberais e impulsionaram fortemente o Estado em direção ao estabelecimento de políticas voltadas para um novo tipo de desenvolvimento.

Além disso, a forte sinergia que passou a existir entre eles possibilitou, concretamente, a consolidação de antigas aspirações bolivarianas, da integração latino-americana. E isso avançou não somente com o Mercosul, mas com a criação da Unasul, firmando objetivos que visavam tornar esses países menos dependentes dos Estados Unidos, disparadamente a maior economia do continente americano, apesar de estar atolada em uma enorme crise econômica.

Mas avancei em outro elemento que considero crucial para explicar o sucesso da integração latino-americana. A existência de uma liderança capaz de garantir que os nossos vizinhos não nos olhem com a desconfiança costumeira, chegando-se ao ponto de em certos países o Brasil ser considerado imperialista, em função do forte desequilíbrio econômico que existe.

Acredito que o protagonismo de Luis Inácio Lula da Silva foi um elemento fundamental para o sucesso dessas mudanças que ocorrem na América Latina. É claro que devemos também ressaltar a aplicação de uma política externa extremamente competente, não somente em relação ao nosso continente, mas também ao resto do mundo. Tudo isso comprovado pela mudança da imagem do Brasil no exterior e do reconhecimento da capacidade de Lula em aglutinar em torno de si todas essas novas lideranças que despontaram por aqui nos últimos anos.

Isso se confirmou também no aumento das exportações brasileiras para praticamente todos os países, especialmente os da América Latina, bem como no papel que tem desempenhado o Banco de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e o Banco do Brasil, no financiamento de obras estruturais tanto nas fronteiras, como garantindo aportes a empresas privadas seja do Brasil ou de outros países do continente, no sentido de reforçarem suas infra-estruturas e o comércio. Isso se deu tanto através dos acordos firmados pelos blocos criados, como em negociações bilaterais, reforçando as relações políticas entre praticamente todos os países do continente, à exceção da Colômbia.

Nesta e na outra semana viveremos um momento de avaliação dessas políticas, através de duas eleições marcadas por forte radicalismo. Apesar da forma traiçoeira como essas eleições tem sido noticiadas pela mídia, tudo indica que os rumos não serão alterados, e tanto aqui quanto na Venezuela o povo votará favoravelmente à essas mudanças, mantendo na condução do governo brasileiro um braço forte de Lula, e naquele país a garantia da maioria parlamentar de apoio ao governo Chavez.

Essas eleições, e as demais que deverão acontecer noutros países, tornam-se essenciais para comprovar os acertos que esses governos tem feito, muito embora incomodem raivosamente uma elite dominante que por muito tempo manteve o controle desses estados, governando sempre a favor dos mais ricos e a serviço dos interesses das corporações estadunidenses. O resultado pode ser visto nos índices econômicos e na desigualdade social, herança perversa dos governos neoliberais, que passaram a reduzir neste século, fruto da aplicação de políticas neo-keynesianas de forte incentivo à pequena economia e ao mercado interno, naquilo que Fernand Braudel chamava de “economias inferiores”, escoradas na preponderância do papel do Estado.

Todas essas ações resumem-se em um aspecto que jamais pode ser esquecido. A necessidade de os países latinoamericanos reforçarem-se tanto econômica quanto políticamente, a fim de garantir algo que sempre foi muito caro a esses países: a soberania nacional. Isso significa manter permanentemente um olhar estratégico sobre suas riquezas e fronteiras, e jamais descuidar das políticas agressivas de outros países que sempre trataram esse continente como uma extensão de seus domínios territoriais.

domingo, 19 de setembro de 2010

A RADICALIZAÇÃO DA CAMPANHA ELEITORAL, E O DESEJO DO POVO

Nos últimos dias, como acontece no final de todo processo eleitoral, a campanha segue um rumo de radicalidade. O velho denuncismo, uma prática nefasta da política brasileira, porque se baseia muito mais em boatos e evidências do que em fatos concretos, e assim somente possível de ser comprovado depois das eleições, segue ditando o ritmo da eleição presidencial. Na última eleição do Lula, aliás, quiseram até mesmo responsabilizá-lo pela queda do avião da Tam na cidade de São Paulo.

Mas um aspecto do discurso da oposição ao governo Lula tem me chamado a atenção, pelo absoluto despropósito de sua afirmação.

Muito se diz que a democracia é a vontade do povo, expressa livremente e de preferência em caráter absoluto, garantindo que a maioria defina qual o governo deseja.

Acontece que pelos discursos dos derrotados, ou dos assumidamente derrotados, já que não conseguem fazer avançar seu candidato mesmo com toda a avalanche de denúncias, algumas maquiavelicamente guardadas a sete chaves por vários meses para serem desovadas à quinze dias das eleições, o povo é o grande errado nessa história.

Como pode querer o povo eleger uma candidata que dê continuidade ao governo atual, e ao mesmo tempo fazer um limpa no Senado e Câmara Federal, deixando de fora aqueles mequetrefes que arrotaram arrogância, alguns até ameaçando dar surra no presidente da República?

Ora, pelo discurso dos desesperados o povo não deve vetar esses “guardiões”, visto que isso significaria aniquilar a oposição, deixando assim “capenga” a democracia.

Vejam só, a democracia não serve! Como é possível ao povo não eleger a oposição? Por essa lógica, enviesada, de ponta-cabeça, a democracia seria aquele regime onde o povo deveria se preocupar em eleger uma oposição para um governo que ele considera legítimo, popular, e que tem garantido melhorias para a sociedade.

Portanto, garantir maioria parlamentar para um governo que tem aceitação popular, seria golpismo, uma tentativa de “aniquilar” a oposição. E acusam o presidente Lula de, com seus discursos, contribuir para esse esmagamento.

Pobre oposição. Sugerir que o povo não vote segundo seus anseios, democraticamente, é assinar um atestado de incompetência. Daí partir para o desespero, e recorrer ao velho denuncismo, na esperança de que, seguindo os ensinamentos de Goebbels, Ministro de Propaganda de Hitler, esses últimos quinze dias consigam mediante a massificação de denúncias, fazer inverter a vontade popular. Se isso não acontecer, o povo será culpado, por jogar a oposição golpista na lata de lixo.

A sabedoria popular sabe que isso é o que deve acontecer. Para o bem da democracia. Se há necessidade de haver oposição, e essa é uma premissa verdadeira (para um desejo falso dos antigos senhores do poder, que segundo o falecido Sergio Mota, deveriam ficar pelo menos 20 anos no governo) esta deve ser refundada, excluindo para sempre os velhos coronéis, os brucutus de discursos arrogantes, que se apóiam na complacência da velha mídia para arrotarem ofensas e ameaças a fim de retornarem ao poder.

Aliás, devem ser excluídos os coronéis que existem dos dois lados, pois é fato que há também ao lado do governo Lula, e no apoio à Dilma, alguns dessa estirpe, posando de velhos democratas, quando em sua existência tudo que fizeram foi usar da máquina pública para enriquecer-se.

Embora eu defenda a candidatura de Dilma Russef, por uma necessidade de manter o país em um ritmo forte de crescimento, escorado na força e no papel do Estado a fim de reduzir as desigualdades sociais, coisa que essa oposição moribunda jamais fez, ao contrário, sempre governou para os ricos, acredito que uma reforma política é condição sine qua non para começar a dar uma guinada na democracia brasileira.

Portanto, ao contrário do chororô da oposição ao governo Lula, acredito que é fundamental para o país consolidar o seu ciclo de modernização reduzindo esses setores à sua devida insignificância em termos de importância nessa caminhada do Brasil para se tornar uma grande potência mundial, embora o caminho ainda seja longo e conturbado.

Os que sobreviverem aos desejos democráticos do povo saberão que será necessário mudar o rumo de seus discursos. Parar de bajular os Estados Unidos, preocupar-se com a população pobre, reconhecer a importância do Estado para o desenvolvimento Nacional e, investir na educação e no desenvolvimento científico e tecnológico, e, principalmente, perceber que práticas tradicionais de um tempo em que se fazia política à custa da ignorância do povo devem ser revistas, garantindo a esse povo o mínimo de decência e auto-estima.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

MÍDIA BRASILEIRA - MANIPULAÇÃO E GOLPISMO

Diante da verdadeira guerra de informações que se trava atualmente no Brasil, por conta do processo eleitoral, em que, abertamente a grande mídia já fez opção por um candidato, e tenta de todas as formas aplicar um último golpe que altere, à força, os desejos do povo brasileiro, resolvi também entrar nessa briga.

Não pude participar no mês de agosto do Encontro Nacional de Blogueiros, em São Paulo, porque estava na Expedição do Araguaia. Lamentei profundamente, porque nos cabe uma tarefa hercúlea de combater incansavelmente o papel vergonhoso que a grande mídia brasileira tem desempenhado nos processos eleitorais aqui em nosso país, desde o escândalo patrocinado pela Rede Globo, para fraudar a eleição de Leonel Brizola no Rio de Janeiro em 1982 (escândalo Proconsult) , passando pela farsa montada no último debate entre Collor e Lula, na primeira eleição pós-redemocratização em 1989, até à última eleição quando outra farsa foi montada no primeiro turno, com fotos preparadas e estampadas em todos os jornais a fim de criar um clima que pudesse levar as eleições ao segundo turno em 2006. E foi o que aconteceu.

Desta vez, o vale-tudo assume proporções escandalosas, e a preferência da mídia por um candidato que tem uma rejeição popular de 50% nas pesquisas de intenção de voto, desanda de tal forma que um ex-presidiário, preso por roubo de cargas, sonegação fiscal e outros crimes, tendo ficado dez meses presos, tornou-se a última fonte de denúncias (sem comprovação) exposta pela Folha de São Paulo. Isso sem falar na pustulenta revista Veja, uma publicação necrótica que não merece nenhuma credibilidade.

Parafraseando um ditado popular, "há algo de podre no reino da mídia brasileira". Certamente a alteração do centro do poder, que deixa de ser a política do eixo SP-MG e assume uma maior diversidade territorial, incomoda aqueles setores que por muito tempo tiveram no Estado brasileiro um porto seguro para ampliar seus negócios. Isso já acontecera em nossa história, e levou à Revolução de 1930 e ao Estado Novo. Depois ao intenso combate à Juscelino Kubstischeck que culminou com o golpe de Estado em 1964.

Rede Globo, Grupo Abril, Grupo Estado de São Paulo, Grupo Folha de São Paulo, constituem-se nos principais monopolizadores da comunicação no país, e temem as transformações que tem ocorrido ultimamente na América Latina.

Cabe-nos neste momento cumprir o papel oposto, e desencadear, como a maioria dos blogueiros sérios estão fazendo, uma verdadeira contra-ofensiva, uma tática de guerra de guerrilhas na comunicação, para combater poderosas estruturas de uma mídia, principalmente televisiva (por ser mais vista), que manipula e falseia as informações causando estragos irreparáveis naqueles que são vítimas das aleivosias dessas corporações.

A internet pode cumprir um papel importante neste momento. Mas ela própria está completamente impregnada de sordidez, na medida em que circulam livremente informações caluniosas, sem a mínima preocupação em se comprovar o que está sendo divulgado e repassado de emails em emails, atingindo milhões de pessoas, transgredindo valores e transformando a propalada "democracia" num velho baú apodrecido de boas intenções, e a "liberdade", num instrumento de achincalhes e ofensas impossíveis de serem reparadas.

Assim, a partir de agora vou repercutir neste blog alguns textos que considerar interessante para melhor esclarecer aqueles que nos lêem. E, eventualmente, também expressarei minha opiniões a respeito da guerra que se trava hoje no Brasil para suceder o mais popular dos presidentes brasileiros, por sete anos achincalhado perversamente, numa tradição da elite que nos acompanha desde os tempos coloniais, por essa mídia representativa de interesses dos setores mais ricos do país.

Vejam o desabafo de Dilma Rouseff à uma matéria mentirosa da Folha de São Paulo:
http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=137455&id_secao=1

Para começar insiro abaixo um texto de Leandro Fortes, sobre como a revista semanal Carta Capital passa quase que como invisível, na medida em que é a única que procura desvendar as maracutais e os interesses de grandes grupos econômicos.




15.10.2010

A quem interessa tornar a Carta Capital invisível?

Vivemos essa situação surreal em que as matérias da CartaCapital têm enorme repercussão na internet e na blogosfera – onde a velha mídia, por sinal, é tratada como uma entidade golpista –, mas inexistem como notícias repercutíveis, definitivamente (e felizmente) excluídas do roteirinho Veja na sexta, Jornal Nacional no sábado e o resto de domingo a domingo, como se faz agora no caso de Erenice Guerra e a propina de 5 milhões de reais que, desaparecida do noticiário, pela impossibilidade de ser provada, transmutou-se num escândalo tardio de nepotismo. O artigo é de Leandro Fortes.

Data: 15/09/2010

Do blog Brasília, eu vi - Leandro Fortes

Desde o fim de semana passado, tenho recebido uma dezena de e-mails por dia que, invariavelmente, me perguntam sobre a razão de ninguém repercutir, na chamada “grande imprensa”, a matéria da CartaCapital sobre a monumental quebra de sigilo bancário promovida, em 2001, pela empresa Decidir.com, das sócias Verônica Serra (filha de José Serra, candidato do PSDB à Presidência da República) e Verônica Dantas (irmã de Daniel Dantas, banqueiro condenado por subornar um delegado federal). Juntas, as Verônicas quebraram o sigilo bancário de estimados 60 milhões de correntistas brasileiros graças a um acordo obscuro fechado, durante o governo Fernando Henrique Cardoso, entre a Decidir.com e o Banco do Brasil, sob os auspícios do Banco Central. Nada foi feito, desde então, para se apurar esse fato gravíssimo, apesar de o então presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer (PMDB-SP), ter oficiado o BC a respeito. Nada, nenhuma providência. Impunidade total.

Temer, atualmente, é candidato da vice na chapa da petista Dilma Rousseff, candidata do mesmo governo que, nos últimos dias, mobilizou o Ministério da Justiça, a Polícia Federal, a Controladoria Geral da União e a Comissão de Ética Pública da Presidência da República para investigar uma outra denúncia, feita contra a ministra-chefe da Casa Civil, Erenice Guerra, publicada na revista Veja no mesmíssimo dia em que a Carta trazia a incrível história das Verônicas e a quebra de sigilo bancário de 60 milhões de brasileiros.

Justíssima a preocupação do governo em responder à denúncia da Veja, até porque faz parte da rotina do Planalto fazer isso toda semana, desde 1º de janeiro de 2003. É quase um vício, por assim dizer. Mas por que não se moveu uma palha para se investigar as responsabilidades sobre, provavelmente, a maior quebra de sigilo do mundo ocorrida, vejam vocês, no Brasil de FHC? Que a mídia hegemônica não repercuta o caso é, para nós, da Carta, uma piada velha. Os muitos amigos que tenho em diversos veículos de comunicação Brasil afora me contam, entre constrangidos e divertidos, que é, simplesmente, proibido citar o nome da revista em qualquer um dos noticiários, assim como levantar a possibilidade, nas reuniões de pauta, de se repercutir quaisquer notícias publicadas no semanário do incontrolável Mino Carta. Então, vivemos essa situação surreal em que as matérias da CartaCapital têm enorme repercussão na internet e na blogosfera – onde a velha mídia, por sinal, é tratada como uma entidade golpista –, mas inexistem como notícias repercutíveis, definitivamente (e felizmente) excluídas do roteirinho Veja na sexta, Jornal Nacional no sábado e o resto de domingo a domingo, como se faz agora no caso de Erenice Guerra e a propina de 5 milhões de reais que, desaparecida do noticiário, pela impossibilidade de ser provada, transmutou-se num escândalo tardio de nepotismo.

Enquanto o governo mete-se em mais uma guerra de informações com a Veja e seus veículos co-irmãos, nem uma palha foi mexida para se averiguar a história das Verônicas S. e D., metidas que estão numa cabeludíssima denúncia de quebra de sigilo bancário, justamente quando uma delas, a filha de Serra, posava de vítima de quebra de sigilo fiscal por funcionários da Receita acusados de estar a serviço da campanha de Dilma Rousseff. Nem o Ministério da Justiça, nem a Polícia Federal, nem a CGU, nem Banco Central tomaram qualquer providência a respeito. Nenhum líder governista no Congresso deu as caras para convocar os suspeitos de terem facilitado a vida das Verônicas – os tucanos Pedro Malan e Armínio Fraga, por exemplo. Nada, nada.

Então, quando me perguntam o porquê de não haver repercussão das matérias da CartaCapital na velha mídia, eu respondo com facilidade: é proibido. Ponto final. Agora, se me perguntarem por que o governo, aliás, sistematicamente acusado de ter na Carta um veículo de apoio servil, não fazer nada para apurar a história da quebra de sigilo bancário de 60 milhões de brasileiros, eu digo: não faço a menor idéia.

Talvez fosse melhor vocês mandarem e-mails para o Ministério da Justiça, a Polícia Federal, a CGU e o Banco Central.

domingo, 12 de setembro de 2010

A QUESTÃO NUCLEAR E A POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA


Este texto foi escrito para Seminário realizado na PUC-GO, para alunos de Relações Internacionais, Sociologia e História, no dia 10.10.2010.

Talvez pela minha formação de Historiador, mas também devido à base marxista que definiu minha maneira de ver o mundo, utilizando o materialismo dialético como metodologia para compreender as transformações que se sucedem ao longo da história, sempre procuro analisar quaisquer fatos a partir de uma rede de eventos e(ou) situações que possam me dar uma visão de totalidade diante daquele problema que estou analisando.

Essa temática que estamos tratando não é nova. Na verdade ela foi definidora das estratégias adotadas pelas duas grandes potências que protagonizaram a Guerra Fria, durante mais de 40 anos. O equilíbrio entre A URSS e os EUA dependia da capacidade que um e outro apresentavam de construir armas nucleares capazes de atingir seus alvos em pequenas frações de tempo, a depender da distância. Mas não havia limites para esse alcance, na medida em que por todo o globo terrestre as disputas territoriais eram completadas com a instalação de bases militares que possibilitavam a uma ou outra potência atingir seu inimigo.

Durante todo esse tempo, em que perdurou a guerra fria, o que percebemos foi uma constante tentativa de ameaças por partes dessas potências escoradas em suas capacidades armamentistas, notadamente o poder que possuíam em termos de tecnologia militar nuclear.

O fim dessa bipolaridade, com o desmonte do bloco socialista, criou uma nova correlação de forças após um período de instabilidade, gerado pela necessidade de os novos Estados-Nações que surgiram a partir daí, se acomodarem geopolíticamente. Uma complexa e pouco noticiada engenharia política se estabeleceu com o intuito de se fazer uma repartição do aparato nuclear que existia na extinta União Soviética.

Várias negociações e acordos, somente acessíveis aos órgãos de inteligências de poucos países, foram assinados para possibilitar a transferência de inúmeros artefatos nucleares que se encontravam nas antigas Repúblicas Soviéticas para a Rússia. E, no bojo desse movimento, alguns tratados foram sendo feitos e/ou sendo acrescidos de novos protocolos, para atender agora à uma nova realidade geopolítica, caracterizada não mais por uma bipolaridade, mas por uma multipolaridade que muitas vezes se confundiu com unipolaridade, devido à enorme distância do potencial bélico e nuclear dos Estados Unidos em comparação com as demais nações. Muito embora tenha crescido de forma acelerada o poder militar da China e a recuperação da Rússia.

O ano de 2001 tornou-se paradigmático, em termos de alterações nas tensões geopolíticas mundiais. Eu diria que o atentado ao World Trade Center despertou as mais perversas sensações bélicas dos EUA, diante da necessidade de atender a duas demandas: a da energia, com o controle de regiões importantes para a obtenção e criação de rotas de deslocamentos de óleo e gás; e por outro lado, pela necessidade de se ampliar sua capacidade de comercialializar armamentos cada vez mais sofisticados em um mercado que se tornaria muito mais atrativo para esse setor, com a crescente insegurança gerada pela irresponsável “Guerra ao Terror”.

Mas pode-se também dizer que se abriu a caixa de Pandora a partir do fatídico 11 de Setembro, que completou este mês nove anos. Na medida em que o “equilíbrio” de forças foi rompido, por muitos países pipocaram uma infinidade de conflitos, potencializados pela ação de grupos treinados e armados por mercenários surgidos com o fim da “guerra-fria”, além do crescimento, paradoxalmente, da Al Qaeda, que passa a se constituir em uma franquia que espalha-se por aquelas partes do mundo mais fragilizadas, principalmente naqueles países cujo processo de descolonização deixaram feridas mais difíceis de serem cicatrizadas.

O mundo tornou-se mais vulnerável, quando a iminência de uma guerra ao terror prometia torná-lo mais seguro. Fez crescer enormemente o comércio e contrabando de armas, e a aceleração tecnológica tornavam-nas cada vez mais sofisticadas e rapidamente superadas, praticamente descartáveis. A terceirização da guerra surge como mais um novo elemento descortinado nesses novos tempos de absoluta insegurança, e ao mesmo tempo de fortalecimento da “indústria da segurança”. O medo e o terror passam a se constituírem em políticas de determinados governos, interessados em investir nesse poderoso mercado, tendo à frente os EUA e a péssima imagem do então presidente Bush Jr.

Nesse ambiente de “caos” internacional, gerado tanto pela (des)ordem mundial pós-guerra fria, como pela ineficiente mas brutal “guerra ao terror”, algumas transformações que eu chamaria de “efeito colateral” vão se destacando. A incapacidade de os EUA cumprir seus objetivos belicistas no tocante à eliminar um inimigo invisível; a instabilidade que se espalha em parte considerável da África, principalmente em uma região estratégica no golf de Aden, denominada “Chifre da África”, palco de uma série de ataques piratas a navios cargueiros importantes e adentrando na África praticamente por toda a região chamada de Sahel, uma região que corta o meio-norte da África formando um corredor desde o Oceano Atlântico até o Mar Vermelho; a radicalização da política segregacionista do governo Israelense; e as dificuldades encontradas pelo Exército mais poderoso do mundo, cercado de aliados, para eliminar milhares de focos de resistências espalhados pelo Iraque, Afeganistão e Paquistão.

No meio de tudo isso, certamente ainda como conseqüências do onze de setembro e das ações belicistas estadunidense uma grave crise econômica que surge nos EUA e irradia pela Europa e por praticamente todo o mundo. Uma bolha financeira, fruto da ganância expressa na especulação do mercado financeiro, especificamente no mercado de imóveis, apenas detona uma situação que já vinha se arrastando desde a queda do símbolo da pujança capitalista virtual, o World Trade Center.

Com a crise econômica, mais os revezes na frente de batalha, em função da infrutífera tentativa de ocupação principalmente do Afeganistão, mas também diante das dificuldades no arrasado Iraque ainda com forte insurgência, cai o frágil e desmoralizado governo Bush, abrindo-se a possibilidade para algumas correções de rumo com a eleição de Obama.

O cenário, contudo, já não dizia mais respeito às dificuldades nesse lado do mundo. Na América Latina também se descortina um novo horizonte, com eleições de governos que fogem do padrão obsequioso que marcou a presença de vários governos subservientes. O século XXI se inicia com uma mudança radical na política internacional latino-americana, que vem a somar-se ao estrepitar das fissuras que atingem o império estadunidense.

Brasil, Argentina, Venezuela, Bolívia, Equador, Paraguai, Uruguai, e tantos outros países, desde o sul até o Caribe, passam por transformações mais ou menos radicais, mas com um aspecto em comum, o desalinhamento automático com as políticas dos Estados Unidos. O destaque maior, obviamente, vai para o Brasil e a figura do presidente Luis Inácio Lula da Silva, cuja presença na política internacional tem sido fortemente marcada por uma competente ação do corpo diplomático brasileiro, que possibilitou uma forte guinada na maneira como o Brasil sempre foi visto pelo mundo afora.

Seguindo uma linha de manter-se independente das amarras costumeiras aos Estados Unidos, a política externa brasileira procurou ao longo desses últimos sete anos do Governo Lula estabelecer um forte protagonismo não somente na América Latina, como também na África, Ásia, Oriente Médio e Europa.

Um destaque deve ser dado: as ações da diplomacia brasileira, aliada à Turquia, no sentido de buscar uma solução pacífica para um problema que se arrasta há vários anos, e por que não dizer há décadas, o programa nuclear iraniano.

Sabe-se que os Estados Unidos não prima sua política externa pela concessão, e sim pela pressão extrema à submissão. São infindáveis os casos cujos resultados foram a truculência militar como forma de se impor diante de alguma Nação que eventualmente ouse fazer frente ás decisões daquele país, ou a tomar decisões soberanas em questões que possam significar riscos á hegemonia que ele ainda detém no mundo. Há aí, do ponto de vista geopolítico, uma própria necessidade de sobrevivência enquanto potência hegemônica. Chega-se a um ponto em que qualquer tentativa de algum país se impor regionalmente, contra os interesses imperialistas, passe a significar de alguma maneira uma afronta e alardeada como atos hostis e potencialmente terroristas.

Secretamente age mediante dois mecanismos conhecidos nos bastidores da espionagem. De um lado com os chamados “assassinos econômicos”, agentes que atuam disfarçados de CEO, executivos de grandes corporações, ou profissionais técnicos como engenheiros, economistas, cientistas etc, com o objetivo de criar algum tipo de crise política ou econômica, em determinado país que esteja dificultando as ações de setores que defendem os interesses estadunidenses. De outro lado, na possibilidade dessa estratégia falhar, entram em ação os chamados “chacais”, assassinos especializados em eliminar lideranças destacadas, principalmente chefes de governos, forçando por uma forma mais radical as mudanças que venham a interessar aos Estados Unidos. Assim se deu também em relação ao Irã, quando o governo de Muhammad Mossadegh adotou uma política nacionalista e estatizou as principais empresas de extração petrolífera, em sua maioria britânicas e estadunidenses. Um golpe em 1953 com a clara participação dos Estados Unidos impôs ao povo iraniano o governo autocrático do Xá Reza Pahlevi até que a revolução dos turbantes, comandada pelo Aiatolá Khomeini derrotou o regime pró-ocidente e deu uma virada na política iraniana, com o estabelecimento de um estado religioso fortemente escorado no Alcorão.

Na contramão de tudo isso, a política externa brasileira, buscou ocupar espaço através de uma ação baseada no diálogo. Além de focar na ampliação da influência econômica, abrindo novos mercados para os produtos brasileiros, outros objetivos foram fortalecidos. Um deles era, como continua sendo, garantir um assento permanente do Brasil no Conselho de Segurança da ONU. O presidente Lula mantinha em sua agenda esses dois objetivos, abrir espaços econômicos e ampliar o espaço de influência do Brasil na Organização das Nações Unidas.

Contudo, outras questões de natureza política com elementos mais complexos, fez com que a diplomacia brasileira entrasse em campo no sentido de tornar-se protagonista da tentativa de conseguir um acordo que garantisse ao Irã enriquecer urânio a fim de ser utilizado como fonte de energia, bem como na medicina. Em articulação com o primeiro-ministro turco Recep Tayyip Erdogan, e obtendo a aceitação do presidente do Irã Mahmud Ahamadinejad, firmaram o acordo que seria semelhante ao que fora tentado meses antes pela Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA).

Assim “o Irã, que deseja urânio enriquecido a 20% para o reator de pesquisa de Teerã (construído para o xá com tecnologia dos EUA) produzir isótopos de uso médico e científico, enviaria 1,2 mil quilos de seu estoque de urânio enriquecido a 3,5% para a França ou para a Rússia em troca de 120 quilos de urânio a 20%” (revista Carta Capital, nº 597, maio de 2010).

Mas a reação que se seguiu, ato contínuo, foi de tentar mundo afora descaracterizar o acordo sob vários argumentos, dependendo da caráter ideológico por trás. Os EUA, através da Secretária de Estado, Hilary Clinton, cuja aparição logo após o anúncio do acordo entre Brasil-Turquia-Irã, deixa uma clara impressão de uma noite mal-dormida. A ressaca, contudo, foi empurrada neurônios abaixos através do Conselho de Segurança, com novas propostas de sanções contra o Irã. O argumento principal para a não aceitação era que a quantidade de urânio em fase de enriquecimento existente no Irã é bem maior do que aquela que o acordo propõe deslocar para a Turquia.

Contudo, nos subterrâneos da diplomacia e na luta renhida que se trava nos bastidores da geopolítica mundial é sabido que os problemas são outros, de diversas naturezas. Em primeiro lugar, as grandes potências que compõe o restrito clube atômico, e que dominam o cenário geopolítico mundial, dificilmente aceitariam um novo protagonismo na cena internacional, transferindo para países emergentes a condição pela qual a paz e acordos internacionais seriam estabelecidos.

Em segundo lugar trata-se de manter sob controle a tecnologia nuclear, amarrando os países que estão fora desse clube através do Tratado de Não Proliferação Nuclear, e principalmente com o Protocolo Adicional, pelo qual os inspetores da AIEA poderiam fazer visitas surpresas a todos aqueles países onde existam tecnologias suficientes para realizar o enriquecimento de urânio, independente disso está sendo realizado para fins pacíficos ou não, num claro atentado à Soberania Nacional.

Naturalmente, a posição do Brasil diz respeito à defesa de sua soberania, e a doção de uma política de busca de alternativas energéticas em função de seu rápido crescimento econômico. Além do que, torna-se inconcebível o fato de um tratado que surgiu com o intuito de eliminar as armas atômicas, não tenha atingindo esse objetivo mais de quarenta anos depois. Apesar dos acordos bilaterais, entre EUA e Rússia, visando reduzir o arsenal nuclear, sabe-se que a quantidade de ogivas existentes nas mãos desses países, somando-se ao demais, China, França, Inglaterra, e correndo por fora Coréia do Norte, India, Paquistão e Israel, que não são signatários do Tratado, seria suficiente para destruir a humanidade mais de cinco vezes.

Portanto, a leitura que devemos fazer da Política Externa Brasileira e da questão nuclear, passa por uma análise criteriosa de todo o quadro geopolítico mundial. As disputas que estão em jogo no controle de territórios ricos em produtos minerais imprescindíveis para gerar energia necessária para o desenvolvimento industrial, seja petróleo, óleo ou outros minérios de importância estratégica para a indústria tecnológica e a militar em especial, determinam os interesses por trás dos acordos e sanções estabelecidas. De outro modo, a necessidade de se manter a hegemonia das políticas internacionais forçam as grandes potências a fecharem-se de tal forma a impedir que tenham acesso a um seleto grupo potências emergentes que possam ameaçar essas condições.

O jogo do poder é mais complexo do que a elaboração de acordos que envolvam atores tão díspares e que representam uma tacada de mestre nas relações políticas internacionais. Sun Tsu, há mais de dois mil anos, já escrevera sobre como determinadas estratégias podem ser minadas pela força e poder do seu oponente.

É esperar para ver qual a próxima peça do tabuleiro de xadrez será mexida.



Fotos deste post:
1. Símbolo atômico - pbrasil.wordpress
2. Mísseis nucleares da antiga URSS: pbrasil.wordpress
3. World Trade Center, 11.09.2001 - Reuters
4. Guerra no Afeganistão - 09.2001 - O Globo
5. Mapa da África - Revista Escola (web)
6. Símbolo da UNASUL - pbrasil.wordpress
7. Livro Confissões de um assassino econômico - Ed. Cultrix
8. Chefes de Estado Brasil - Turquia - Irã - Foto Uol.
9. Usinas nucleares no Irã - Defesanet
10. Logomarca da Agência Internacional de Energia Atômica - pbrasil.wordpress
11. Arsenal Nuclear no Mundo - Defesanet
12. Irã e o jogo de Xadrez nuclear - pbrasil.wordpress

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

DE VOLTA AO ARAGUAIA



Estive no Sul do Pará (São Geraldo) e Norte do Tocantins (Xambioá) a convite da Coordenação do Grupo de trabalho do Tocantins, organizado pelo Minitério da Defesa com o objetivo de Cumprir decisão da Juiza Solange Salgado, que determina imediata apuração sobre os restos mortais de guerrilheiros e moradores da região do Araguaia, local onde aconteceu um movimento guerrilheiro no começo dos anos 70 do século passado, A Guerrilha do Araguaia.

Essa expedição acontece pela 5ª vez. Ela resulta na demora em o Governo Brasileiro atender às reivindicações dos familiares dos guerrilheiros mortos e desaparecidos, que buscam encontrar vestígios que identifiquem possíveis lugares onde seus corpos foram enterrados.

O relato que se segue visa emitir minha opinião sobre a importância da decisão judicial, dessas expedições, e de como isso contribui para reforçar nossa compreensão sobre um fato histórico importante em nossa história e de repercussão internacional. Tanto que esse é um tema já inscrito na Organização dos Estados Americanos (OEA) onde se discute, inclusive, possíveis punições ao Brasil como decorrência da incapacidade, até então, de o Estado Brasileiro dar resposta à demandas que inscreve-se como sendo de importância no âmbito das discussões sobre direitos humanos.

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Meu trabalho de pesquisa para o mestrado em História da Universidade Federal de Goiás, mais a continuidade pela busca de informações que durou um ano após a defesa e a conseqüente publicação do primeiro livro sobre a Guerrilha do Araguaia, fez com que o meu nome fosse incluído dentre as principais fontes sobre o assunto. Creio, principalmente pelo ineditismo, em se tratando de trabalho acadêmico, e por ele ter como uma importante característica a informação baseada em depoimentos colhidos com personagens que viveram intensamente aqueles momentos de angústias por que passaram os moradores do Sul do Pará e Norte do Tocantins (então Goiás).

Para mim representava um novo desafio. Voltar à região mais de 15 anos depois bem às vésperas de iniciar os trabalhos para reedição do meu livro, já acertado com uma editora desde o final de 2009.

Embora tendo tomado conhecimento pelos jornais e por alguns dos membros das expedições anteriores, sobre o procedimento adotado, a minha expectativa era grande sobre como me comportar em meio a uma equipe bastante diversificada e com profissionais de áreas diferentes, embora essenciais para as buscas que estavam sendo feitas. Mas, a meu ver, faltava a presença de um historiador, pois embora a decisão judicial tenha um caráter específico e seja bastante objetiva, o que não questiono, muito ao contrário, algumas informações sobre dados, lugares e personagens, precisa necessariamente ter o olhar historiográfico. E, qualquer que seja o resultado, mesmo que focado no arrazoado da sentença judicial, representará um passo a mais para se compreender a história da guerrilha do Araguaia.

Ao chegar me surpreendi com a logística adotada para garantir que o trabalho fosse desenvolvido plenamente. Contamos com todo o apoio do Batalhão Logístico de Selva do Exército e seguimos para a cidade de São Geraldo, em um destacado comboio militar. Registre-se aqui, faço questão de dizer isso, que não somente em termos de garantia de infraestrutura, mas também no estabelecimento de relações respeitosas e amigáveis. Pude perceber, pelo menos com os oficiais com os quais pude conversar, não haver nenhum tipo de resistência em cumprir as decisões tomadas a fim de encontrar vestígios de restos mortais de guerrilheiros.

Claro que, do ponto de vista político, e geopolítico, o tema Guerrilha do Araguaia continua sendo emblemático, mas creio, como inclusive escrevi ao final do meu livro, podermos separar cada momento, assim como as diferenças de comportamentos nas instituições militares da época do regime militar para os dias de hoje. Isso não significa dizer que não existam concepções diversas dentro delas, mas mantêm-se nos limites que a democracia permite. Instabilidades políticas e possibilidades de retrocessos existem em qualquer país ou regime político, mas os riscos serão menores se as instituições funcionarem solidamente e em sintonia com a sociedade.

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A convicção que firmo, a partir do que presenciei nesses dias em que participei da V Expedição GTT-Araguaia, é que são enormes as dificuldades a serem enfrentadas na busca por identificação de corpos de guerrilheiros no cemitério de Xambioá. Contudo, isso não significa que tenho uma compreensão contrária à existência desses restos mortais ali naquele local.

Acredito que até o final da segunda campanha, por volta do mês de setembro/outubro de 2002, os guerrilheiros que foram mortos e levados para identificação tiveram seus corpos enterrados naquele cemitério. Provavelmente, pelas indicações feitas por alguns guias, também é possível que alguns guerrilheiros presos com vida, mortos por alguma razão, seja por tortura ou execução, podem também ter sido sepultados ali.

A partir da terceira campanha, com uma nova estratégia e táticas adotadas pelas forças que combatiam os guerrilheiros, houve uma mudança de logística, passando a ter maior importância as bases da Bacaba, na Transamazônica e do antigo DNER em Marabá. Nelas se acumularam as principais ações repressivas, comandadas pela equipe do Major Curió, além de concentrarem a maior parte dos prisioneiros, seja de guerrilheiros ou de moradores da região.

A partir de então passou a haver uma constante conexão entre essas duas bases, com os prisioneiros sendo deslocados da Bacaba para Marabá onde se concentravam, ao que tudo indica, as equipes mais preparadas para extrair as informações dos prisioneiros. Em alguns casos esses não resistiam e eram enterrados por ali mesmo. Segundo depoimentos de guias eram sepultados no terreno do próprio DNER, mas há possibilidades de alguns corpos terem sido lançados no rio ou enterrados em valas clandestinas no próprio cemitério de Marabá.

Outra possibilidade é que em certos casos alguns prisioneiros foram levados para dentro da mata com o intuito de apontarem locais estratégicos da guerrilha e em seguida executados, com seus corpos sendo deixados onde se deu a execução.

Considero pertinente a hipótese de ter havido uma “operação limpeza”, objetivando retirar os corpos de determinados lugares, que possivelmente foram utilizados em função das mortes de alguns guerrilheiros sob tortura. Embora haja certa resistência de alguns guias, em reconhecer essa operação, parto do pressuposto que essa foi também uma atividade de inteligência, cuja ação ficou restrita a um pequeno grupo de suboficiais do qual fazia parte o Major Curió. Não havia nenhuma razão para que alguns desses guias fossem observadores de uma operação tão comprometedora.

Acredito que também é crível que a Serra das Andorinhas também tenha sido o local de “desova” desses corpos. Pela dificuldade de acesso e porque jamais passaria pela cabeça dos seus executores que ali viesse a ser uma Área de Proteção Ambiental, com a possibilidade de se tornar, inclusive, atrativo turístico, como planeja setores ambientalistas ligados ao governo estadual.

Há uma versão, a ser comprovada, que antes desse conflito aquele local chamava-se “Serra dos Martírios”, por ter sido um lugar para onde eram levados negros e índios escravizados que tentassem fugir dessa situação. O nome atual teria surgido por indicação dos próprios militares depois da guerrilha, a fim de evitar levantar suspeitas sobre a possibilidade da existência de cemitério clandestino naquela região.

É provável que outros corpos, além dos que foram enterrados nas bases da Bacaba e de Marabá, tenham sido retirados de onde estavam originalmente e também levados para a Serra das Andorinhas. Acredito, no entanto, que a maior parte dos corpos daqueles que foram abatidos dentro da mata tenham lá ficado, primeiro pela dificuldade de serem transportados, segundo pela absoluta impossibilidade de esses corpos serem depois localizados para o traslado. Para que isso acontecesse eles teriam que ter contado com a ajuda de guias, mateiros experientes que sempre estiveram à frente das equipes, o que naturalmente colocaria a operação sob risco.

Por fim, acredito que a maneira de se chegar ao fim de tamanha agonia, seja tentar extrair informações precisas dos militares que participaram efetivamente da repressão ao movimento. Principalmente os oficiais, pelos quais passavam todas as decisões. Esses, não há dúvidas, detém em suas memórias – e provavelmente documentado – a verdade sobre quais foram as destinações dadas aos corpos dos guerrilheiros. Desde aquele que estava no comando maior, aos demais oficiais que comandaram as equipes e depois participaram da provável limpeza da área após o término do conflito. Principalmente aqueles que ali permaneceram por mais tempo, e que compunham a equipe do major Curió, decisiva na repressão final ao movimento guerrilheiro.

Mas, entendo também, que apesar de todas as dificuldades encontradas, e mesmo com algumas frustrações desanimadoras para os participantes do GTT, em consequência de buscas fracassadas em locais apontados com segurança como sendo covas clandestinas, é preciso persistir nessas investigações. Há uma enorme complexidade no caso do cemitério de Xambioá. Uma completa desorganização, incompatível, inclusive, com a própria origem e significado dos cemitérios cristãos, torna mais difícil o trabalho.

Não considero falsas as informações passadas por pessoas da região, alguns ex-guias do Exército. Mas penso que existe uma necessidade de haver uma equipe de historiadores, que fique responsável por fazer um cruzamento delas, de forma a definir com mais lucidez à luz das transformações ocorridas no tempo e no espaço. Se nesses 14 anos que separam minha penúltima visita, em 1996, à presença nessa expedição agora em 2010, muita coisa mudou na região, somando-se aos anos anteriores até à data do início da guerrilha contam-se 38 anos passados e, consequentemente um acumulo maior de alterações.

Para finalizar, registro minha satisfação de poder mais uma vez contribuir com o resgate de uma história que pode ser pequena na dimensão do espaço em que ela se desenrolou, mas de uma enorme dimensão pelos seus significados e aprendizados. Para que tal não se repita, é mister que as mortes de guerrilheiros e soldados não tenham sido em vão, e nos sirvam de exemplos na construção de uma Nação justa e democrática, de maneira a podermos viver em harmonia, sociedade e instituições que são fundamentais na defesa dos reais interesses do povo brasileiro. E, que acima de tudo, esses esforços sejam compensados garantindo-se às suas famílias o desejo de dar a seus filhos o descanso merecido dentro do significado que suas religiões estabelecem.

Espero para breve poder fazer uma discussão sobre esse tema na Universidade Federal de Goiás, no Instituto de Estudos Sócioambientais, onde trabalho, juntamente com a Fundação Maurício Grabois. Além de detalhar melhor essas questões que listei aqui faremos uma exibição do documentário Camponeses do Araguaia: a guerrilha vista por dentro. Não esquecerei de divulgar a data neste blog.


Infeizmente não pude anexar fotos desta última expedição. Aguardo ainda as fotos que foram tiradas pela fotógrafa do MD. Fico devendo. Abaixo a lista dos locais de onde as fotos deste post foram retiradas.


1. Foto da primeira expedição do GTT - Diárioliberdade

2. Livro Guerrilha do Arguaia: a esquerda em armas - editoraufg

3. torturanuncamais.

4. navegadormt..

5. redebrasilatual

6. Documentário-DVD: anitagaribaldi.