quarta-feira, 23 de junho de 2010

A GREVE, A REPRESSÃO E O QUE É DE DIREITO.


Não é nenhuma novidade. Mais uma vez os professores vão para o enfrentamento com o governo, neste caso a Prefeitura de Goiânia, por conta de reivindicações antigas, históricas e reconhecidas como merecedoras por todos que discutam os problemas da educação, em Goiânia, Goiás e no Brasil.

Em primeiro lugar o imponderável: o descumprimento do governo do município de Goiânia (e também do Estado de Goiás) em pagar aos professores o que é de direito, um piso salarial definido em Lei Federal. Já é um absurdo ter que fazer greve para professores reivindicar salários justos, que dirá para que uma lei seja cumprida. E ainda mais por governos que apóiam o governo federal, responsável pela elaboração e aprovação desta lei.

Em segundo lugar a necessidade de se estabelecer, em definitivo, salários compatíveis com o exercício da função de professor, por muito tempo desprezada, na medida em que não interessava a governos conservadores investir na formação educacional da população. Por si só a realidade hoje demonstra o quanto este tipo de política foi nefasta para o país, no momento em que nos deparamos com dificuldades de encontrar profissionais qualificados no mercado para atender a uma demanda crescente da economia brasileira.

O estranho em tudo isso é que esse enfrentamento está ocorrendo em um momento que se poderia dizer como da consolidação da “democracia” brasileira. Mas há algo de estranho em tudo isso. Se na época em que participei do movimento estudantil a repressão se dava com toda agressividade com guarnições especializadas para esse enfrentamento, incluindo a Polícia Federal e a Polícia do Exército, desta vez vemos a Guarda Municipal envolvida em repressões bizarras, como se fossem lutas de corpo-a-corpo com professores grevistas. Isso em um governo de caráter progressista.

O governo de Goiânia não tem o direito de tratar os professores como vem fazendo. O argumento para justificar tal atitude é o comportamento agressivo dos grevistas. É bem verdade que isso ocorre, e tende a aumentar na medida da radicalização do movimento, até pela maneira como se dá a repressão. Muito embora existam interesses políticos partidários envolvidos no próprio movimento. Sempre existe. Mas não pode servir como pretexto para se negar o que é justo a uma categoria essencial para a sociedade.

A atitude coerente da administração do prefeito Paulo Garcia é chamar os professores, representados no Sintego e Comando de Greve para abrir uma mesa de negociação. Essa é a estratégia mais produtiva não somente para demonstrar coerência por trás de uma história daqueles que estão hoje no poder e que outrora estiveram em manifestações semelhantes. Mas também desarma aqueles que no movimento buscam a radicalização a fim de obterem dividendos políticos.

Nessa dividida a categoria é que perde, por mais que esteja coesa na greve. O ensinamento que tiramos em nossa luta na Universidade é que o enfrentamento, embora seja a greve um instrumento legítimo e por vezes necessário, nem sempre trás vitórias concretas para a categoria. Pode dar visibilidade à lideranças que forçam o confronto para se consolidarem não somente no movimento, mas para garantir espaços políticos que depois impulsione candidaturas, e ás vezes tem como resultado percentuais irrisórios de reajustes que agradam alguns e esvaziam o movimento.

A categoria só tem ganhos consistentes quando se estabelece canal de negociação e, a partir daí, a um prazo que não deixe a deixe suspeitando de enganação, possa ser apresentada proposta concreta que resgate a importância que os professores devem ter e que resolva, em definitivo, o problema da carreira. Mas para ter negociações é preciso haver disposição para o diálogo. E, claro, um percentual de aumento, justo e imediato.

Da parte do governo, saber reconhecer a necessidade de resolver um problema que é crônico, pagar bons salários para os professores. Inclusive para professores do ensino fundamental. Esses, aliás, deveriam receber tão bem quanto os professores universitários. Para evitar, aliás, que na universidade tenhamos que abrir cotas para alunos da rede pública, devido à baixa qualidade de ensino. É lá que o problema começa. Só não dá para aceitar o velho argumento da falta de recursos para tornar factível um plano de carreira justo para os professores. Educação e Saúde devem ser, sempre, prioridades de todo e qualquer governo que tenha preocupação social.

Da parte dos professores é saber que a greve é um instrumento de pressão, que tem como finalidade forçar a administração pública municipal, no caso, a reconhecer suas reivindicações ao limite de buscar esse canal de negociação. Mas ao contrário de se imaginar que ela possa traduzir uma luta de classes como ouvi em debates, só trás prejuízos para os alunos (que já se deparam com um ensino deficiente) e mais contratempos para os professores que depois são obrigados a repor os dias parados em época de férias. O que se vê, na verdade, é uma categoria lutando por reivindicações que garantam um pagamento justo e decente como reconhecimento da importância que têm na sociedade. Mas não se trata de uma luta contra patrões em que estes saem prejudicados por afetar a produção e consequentemente seus lucros. Não é isso que está em jogo.

(http://www.sneri.blog.br/?p=4308)

Em minha opinião já passa da hora de a educação fundamental e secundária pública ser federalizada. Está mais do que comprovado, que Estados e Municípios não estão aptos a transformarem o ensino como deveriam, de uma maneira geral. E sequer o Ministério Público toma atitude quanto ao fato do descumprimento de leis como a que estabelece o piso salarial.

Enquanto isso as camadas mais pobres da sociedade, que dependem do ensino público para de alguma maneira ver seus filhos terem alguma qualificação, se vêem completamente desamparadas, e na medida de um movimento radicalizado que deixa seus filhos um, dois ou mais meses sem aulas, não têm a quem recorrer. E assim, gerações e gerações vão se mantendo no limiar de baixo, sem possibilidade de ascender socialmente, muito embora as oportunidades possam estar aparecendo.

3 comentários:

  1. Grande Romualdo,

    análise lúcida e coerente, além de texto bem escrito. Parabéns!!

    Anselmo.

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  2. Romualdo,
    segue o link de um texto que fiz respondendo sua análise sobre a greve.

    http://emgreve.ning.com/forum/topics/texto-contra-a-greve?xg_source=activity

    Vamos para o debate.
    Até mais,
    Lucas

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