O que acontece no mundo? Em qual
direção a história nos levará? O que temos visto, em termos de decisões que
envolvem amplas massas populares, são adoções de saídas para situações de crises
que acentuam cada vez mais as contradições, e apontam para uma direção de
ampliação dos conflitos, da intolerância e da estupidez como mecanismos de
enfrentamento de uma realidade que condiz com a feição de um sistema em crise.
Infelizmente, os resultados
eleitorais no Brasil só são surpreendentes para quem esteve hibernando em um
sono intenso nos últimos anos, em um coma que o fez ficar absolutamente
descolado da realidade. Mas isso não se reduz ao Brasil. O reacionarismo de um
Donald Trump, pode se sagrar vitorioso mesmo com um discurso estúpido e
recheado de expressões politicamente incorretas. Mas devidamente incensado por
grupos ultra-conservadores, alguns religiosos, outros que carregam em seus DNAs
os feitos perversos de associações racistas, como a klu-klux-klan.
Na Europa, os nacionalistas de
direita assumem um comportamento cada vez mais raivoso, xenófobo, centrado
principalmente no aumento do número de refugiados que invadem aquele
continente, empurrados por uma série de equívocos geopolíticos, quando atitudes
mesquinhas de países ocidentais, movidos por interesses de grandes corporações,
apostaram na destruição de uma série de governos na África e na Ásia. A
proliferação de grupos terroristas, movidos por sectarismos religiosos e
fundamentalismos tresloucados, são consequências de tais atitudes, e dessas
políticas insensatas, mas profundamente conectadas com o Poder econômico e as
disputas hegemônicas imperialistas.
O “Brexit”, resultado do plebiscito
no Reino Unido, que empurrou seus países para fora da União Européia, já
bastante analisado e ainda incompreendido em seu resultado surpreendente, não
será a decisão mais estapafúrdia do ano, em termos de escuta popular. Como é
possível uma população ser contra um acordo de paz, para botar fim a uma
guerrilha que já dura 50 anos e foi responsável, em suas ações e nas formas de
lhe combater por parte do Estado, por mais de 200 mil mortos? Pois assim foi
mais um plebiscito de resultado surpreendente. O povo colombiano, rejeitou no
limite, o acordo de paz entre o Estado colombiano e as FARC (Forças Armadas
Revolucionárias da Colômbia). O destaque, neste caso e o que analisarei a
seguir, das eleições brasileiras, foi o número extremamente elevado de
abstenção, cerca de 60% da população não compareceu às urnas.
Mas, qual a razão de convocar um
plebiscito para decidir sobre algo tão complexo, sabendo-se que há interesses
belicistas, inclusive de quem se projetou politicamente combatendo esse
conflito, mediante as políticas postas em práticas pelos EUA? O ex-presidente
da Colômbia, Álvaro Uribe, cujo favorecimento não foi somente político, mas
econômico, tinha interesse em fazer fracassar esse acordo. Ao mesmo tempo, as
marcas e cicatrizes de tantos anos de luta e de vítimas desse enfrentamento,
naturalmente deveriam servir de alerta ao governo colombiano. Não se fazia
necessário tal plebiscito, e ele perde força na medida em que a abstenção
chegou a 60%, mas não pode ser negado como mecanismo institucional, o que dá um
nó nas articulações para se por fim a esse conflito. Para onde irá a Colômbia?
Mas a estupidez, em todos esses
casos citados acima, foi o sentimento motivador dessas atitudes. São decisões
políticas, inevitavelmente. Opções encontradas para definir futuros políticos
de países e regiões. Mas quem disse que decisões políticas também não podem ser
estúpidas? Claro que podem. Em tempos de redes sociais, de informações céleres
e fragmentadas, e da manipulação que se faz desses mecanismos de
relacionamento, a idiotização das pessoas tem sido uma marca desse tempo. Essa
não é uma constatação motivada somente por um olhar ideológico à esquerda. É
também por isso, pois não se espere isenção de opiniões e de artigos que
analisam decisões de caráter político. Contudo, basta um pouco de equilíbrio e
sensatez para se observar que determinadas decisões são um caminho inequívoco
para acentuar conflitos e ampliar crises dentro da sociedade. O que temos visto
nos últimos anos, é a derrota da política. E a derrota da política traz como consequência
a violência, a ampliação dos conflitos, a guerra.
Existem motivações para
transformarem as pessoas em um rebanho de gado que segue cegamente em uma
direção, quando do estouro da boiada, de forma descontrolada. Há de forma
arquitetada e planejada, com objetivos estratégicos definidos, interesses
políticos reacionários que visam manter os indivíduos, e a sociedade, como uma
massa alienada, estúpida na forma de raciocinar e vingativa na reação ao que
para ela é apontada como o que pode ser responsável por seus infortúnios. Mesmo
que isso não seja verdade. Mas uma massa
cega, incontrolável, ela pode ser num primeiro momento um instrumento eficaz
para destruir sonhos, até mesmo daquilo que só pode ser construído lentamente,
e que tenderia a lhe favorecer. Ela pode inclusive vir a apoiar e a endeusar
indivíduos perversos, com visão de mundo preconceituosa, que não vacila em
eliminar os que segundo eles sejam diferentes e com maneiras de agir com as
quais eles discordam. Os governos fascistas se beneficiaram dessa volatilidade das
massas populares, e as manipularam de forma a apoiá-los em atitudes odientas e
criminosas. Ela pode, mesmo que democraticamente, ser também o instrumento pelo
qual decisões estúpidas podem transformar um país num caos.
Por que o processo eleitoral
brasileiro também pode ser enquadrado nessa lógica? Ora, basta ver o resultado.
As pessoas votaram cegamente – ou não votaram – induzidas por uma guerrilha
midiática que fez dessas eleições, uma das mais incompreensíveis, se
analisarmos a história recente do país. Um discurso moralista, ético, mas
fundamentalmente hipócrita, centrou seus ataques na tentativa de marcar um
partido como o responsável pela corrupção que caracteriza todo o sistema
eleitoral brasileiro. E as massas assim cumpriram seu destino, como na
debandada da boiada. Condenaram um partido, não pelos seus erros, mas pelo que
se apontaram de seus erros. E negaram todos os seus acertos e avanços que
influenciaram na transformação social brasileira nos últimos 15 anos.
Mas por que há um perverso equívoco
nessa vingança? Simplesmente porque não se julgou por completo o sistema
político, nem muito menos a perversão que em si representa o sistema
capitalista e possibilita esses desvios morais, éticos e de caráter. Se
listarmos todos os envolvidos nos casos de corrupção que se tornaram públicos e
que estão sendo investigados, e não somente a Lava Jato, veremos que
praticamente todos os partidos estão envolvidos. Com algumas honrosas exceções
de pequenos partidos ideológicos. No entanto, quando olhamos o resultado
eleitoral identificaremos que aqueles grandes partidos responsáveis por casos escabrosos
de corrupção, e com lideranças já acusadas e apontadas pela Procuradoria da
República como comprovadamente corruptos, veremos que à exceção do Partido dos
Trabalhadores, todos os demais ampliaram suas participações no espectro
político brasileiro. Ora, onde está, então, a coerência de se negar votar em um
partido, carimbado por uma mídia que se envolveu diuturnamente por meses no
golpe que destituiu uma presidenta, como corrupto, a pretexto de se “limpar” a
política?
Não há coerência. Não se votou com
coerência. A motivação para a aversão a um partido é decorrência de uma
campanha orquestrada, de caráter nitidamente ideológico, e com objetivos
estratégicos também definidos, de retomada do poder por parte de uma elite
reacionária que não está absolutamente preocupada com os destinos do povo
brasileiro, senão da garantia de manter suas regalias e seus interesses
gananciosos.
PP (Partido Progressista); PMDB
(Partido do Movimento Democrático Brasileiro); PR (Partido da República); PSDB
(Partido da Social Democracia Brasileira)... estão entre os partidos que mais
obtiveram resultados positivos nessas eleições, mas são também os partidos mais
citados em casos de corrupção. Se analisarmos o perfil dos candidatos, eleitos
ou não, constataremos facilmente que a política medíocre, em toda a sua
essência, sagrou-se vitoriosa nos objetivos propostos por quem construiu toda
essa perversão. O país marchou para traz, recuou àqueles tempos em que a
população votava nos menos piores, com candidatos escolhidos pela ditadura
militar dentre aqueles que não importunaria suas decisões. Ou não votou, o
número de abstenções é recorde, lavaram as mãos, e esses optaram por deixar que
aqueles tomassem decisões estapafúrdias. Mas não se pode condená-los, é uma
decisão gerada por decepção e descrença.
Há um objetivo nisso tudo.
Desacreditar a política como elemento crucial para definir nossos destinos.
Alienar as massas populares a partir da identificação de que seus sonhos
fracassaram ao apostar em quem lhes prometiam menos desigualdades e mais melhorias
sociais, porque esses buscaram se beneficiar nas estruturas do Estado. É essa
uma verdade hipócrita, trágica por ser aceita pela população, porque se volta
contra ela própria, e foi construída por quem age de forma vil na manipulação
do que é real. E absolutamente direcionada a não permitir que essas mesmas
pessoas não identifiquem que do outro lado a corrupção, a malandragem, o
banditismo, funciona de forma profissional e cumulativa de riqueza construída
sobre o seu trabalho.
Mas o que não se conta é que a cada
ação corresponde uma reação em sentido contrário. Se os erros daqueles que
ofereceram bonança à população, mas que se corromperam nas estruturas do
Estado, lhes foram fatais, tendo sido as massas manipuladas ou não, o mesmo
ocorrerá, quando a um certo tempo, essas mesmas pessoas, pelo acentuado da
crise, perceber que foram enganadas, ludibriadas e se constituíram em fantoches
nas mãos de setores que só olham para seus próprios umbigos. Em momentos de
crises econômicas como o que estamos vivendo, as camadas abastadas não tomam
atitudes políticas para beneficiar os trabalhadores e os mais pobres. Suas
decisões são pragmáticas, calcadas nas necessidades de se manterem sempre numa
estrutural social abastada. Portanto, não demorará a essa multidão perceber que
o caminho que tomaram seguindo o estouro da boiada a levará para um precipício.
Caberá, então, àqueles setores que ideologicamente planejam construir outro
tipo de sociedade, saber adotar estratégias que possam direcionar essa multidão
para o caminho certo. Tem sido assim os momentos de viradas revolucionárias na
história, quando no limite das crises e das contradições, uma população
oprimida percebe que só há um caminho apto a livrá-la das submissões e das manipulações
das classes dominantes.
Tirá-las do torpor, da indolência,
da estupidez e da intolerância não será fácil, mas as dificuldades que virão
para elas abrirão possibilidades de conduzi-las, pela política, pela
organização popular, pela conscientização e, acima de tudo, pela luta de
classes, a construir um projeto revolucionário de uma nova sociedade. A utopia
continua no horizonte.
A luta continua!
Excelente artigo retrata bem a atual situação politica brasileira
ResponderExcluirÉ isso, temos que superar a própria descrença e arregaçar as mangas. Muito trabalho nos espera... A luta continua!
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