quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

QUE SEJAM FELIZES OS DIAS QUE VIRÃO. VAMOS INVENTAR UM 2012 COM SOLIDARIEDADE, AMIZADE E AMOR


Não sei o que dizer do que será. Resta-me analisar o que se foi. Assim, na reconstrução do passado, que me pode dar a compreensão dos erros e acertos do tempo que se foi, posso melhor inventar o meu futuro. 2012, e o que mais vier. Repito aqui, os mesmos desejos do ano passado, pois eles são permanentes, apenas envelhecemos um ano a mais.
Seguramente uma das coisas boas em minha vida nesses dois últimos anos foi a força para criar e consolidar este Blog. Gramática do Mundo, como já disse, um nome quase emprestado de Fernand Braudel que criou sua Gramática das Civilizações, representou para mim muito mais do que uma catarse como eu pretendia que se fosse inicialmente. Transformou-se em um fórum de debate bem provocativo, como sempre fui, e sou, em minha peculiaridade.
Mas, claro que ele foi também aquilo para o que se propôs, fazer com que eu pudesse libertar do fundo da minha intimidade todos as angústias motivadas pela perda de minha filha, Ana Carolina. Através do Gramática do Mundo, e tentando ainda fragilmente seguir o lema da filosofia antiga, exposta inicialmente em um poema de Horácio, no século I, antes da Era Cristã, com a expressão Carpe Diem, não me preocupo em viver obcecado com o futuro, mas buscar a compreensão do presente, de forma a vivê-lo em toda a sua intensidade.
Por isso minha mensagem de transição entre dois momentos simbólicos (2011-2012), construídos seguindo uma lógica que interessa ao consumismo capitalista, mas que inegavelmente também se constitui em um momento de confraternização, e de expiação de todos os nossos problemas, eu quis fazê-lo aqui. Transformo, assim, todos os meus seguidores e eventuais leitores, em personagens de minha vida, com os quais estabeleço abertamente, por essa ferramenta espetacular que é a internet, momentos de franca discussão ideológica e intelectual, bem como compartilho todos os meus sentimentos pela perda irreparável que me consumiu e me consumirá pelo resto da minha vida. 
Recebi, principalmente nas postagens mais sofridas, nas datas que mais me lembram da Carol, mensagens de amigos, e até mesmos de pessoas anônimas para mim, que só conheço pela internet, e foram e têm sido fundamentais para a recomposição de meu caminho. São, seguramente, estímulos para a superação das adversidades e me ajudam a viver a vida como expressado na filosofia antiga, nessa loucura do mundo moderno. E nos dão também a convicção de que a solidariedade só precisa ser praticada, porque muito embora nos seja vendida uma imagem de um mundo cruel, as pessoas, em sua maioria, tem sim, sensibilidade e expressam ainda isso de várias formas. O velho altruísmo que nos salvou em épocas primitivas, permanece, ainda que hibernado pelos tempos individualistas, resquícios do neoliberalismo. Em certo momento ele se manifesta e desperta o lado sensível dos indivíduos, homens e mulheres.
2011 não foi o ano que eu esperava. Mas segui repensando uma série de comportamentos que me acompanharam por vários anos, e que somente um choque em nossas vidas é capaz de nos fazer refletir. Sigo sendo eu mesmo, com a minha “ranzizesse” privada, que diz respeito aos defeitos que cada um de nós possui e compõe a nossa personalidade. Mas adquiri uma capacidade maior de compreender os dramas e fragilidades da vida humana.
Não sou partidário de princípios doutrinários, segundo os quais o sacrifício é um fator essencial para que o sentimento humano se realize. Não temos que, necessariamente, buscarmos o sofrimento a fim de termos nossos “pecados” expiados. Mas é inegável que ele nos trás um choque de uma realidade da qual não esperamos experimentar. Construímos nossos mundos (assim como nossos deuses) de acordo com o que queremos, e esquecemos que não podemos querer aquilo que é inusitado, ocasional. O inevitável pode nos trazer surpresas para as quais não nos preparamos, e da fragilidade de uma vida aparentemente perfeita, desfazem-se sonhos e ilusões de futuros construídos quase que moldados por fantasias que nos são impostas por mecanismos exteriores à nossa vontade.
Converso com minha companheira, Celma, sob óticas diferentes de ver a vida. Ela, sempre otimista, construiu toda a sua resistência à tragédia que nos abateu, buscando espiritualmente forças que traduzisse sentimentos de solidariedade e de um pensar positivo que vê ao longe, além do momento em que estamos, e constrói positivamente um futuro de esperança. Assim ela vai lidando com os programas que o Instituto Ana Carol tem construído e, mais do que um projeto, a realidade que é a Bordana, Cooperativa de Bordadeiras a consolidar essas certezas construídas com o olhar para adiante.
Não tento desconstruir os sonhos, mas parto de outra perspectiva. A de que o que imaginamos ser a construção de um futuro nada mais é do que a realização do presente. Dialeticamente, ele vai sendo tecido, e termina por concretizar algo que foi pensado. Mas o que seria desse “futuro” se no presente não tivéssemos construído as bases das mudanças? Ademais, não há futuro, pois o que idealizamos como sendo isso, ao imaginarmos tê-lo construído, ele já se torna presente. E, como o tempo não pára, em frações de segundos já se torna passado.
Digo isso para afirmar que são as realizações do presente que possibilitam aos nossos pensamentos se concretizar. Contudo, nada do que se constrói hoje, ou do que se imagina construir, está livre do acaso. Mas, como não podemos ficar pensando no acaso, assim como não faz sentido a obsessão pela morte, devemos pensar sempre em viver toda a intensidade do presente. Abstraindo o egoísmo e o individualismo, logicamente. Afinal, a nossa vida não se realiza isoladamente.
Assim, 2012 se construirá a cada dia. Por isso, a mensagem que quero passar é a de que cada ano novo só se completa em seu final, até lá ele simplesmente é a somatória de dias, semanas e meses. E cada um de seus dias, deve ser vivido em seu tempo, na duração que lhe foi dada por essa espetacular e indecifrável condição que adjetivamos como vida.
Então, não nos basta pensar no ano de 2012. E sim na construção dele, a partir da vivência ativa e intensiva de cada dia, individualmente. Viver um dia por vez, ao invés de nos perdermos em angústias e desesperos do que fazer depois de amanhã. Isso parece óbvio, mas estranhamente não é visto dessa maneira.
Mas alguns dirão que isso é utopia. Que é ilusão se imaginar preso apenas ao que acontecerá a cada dia, na medida em que isso acarreta um efeito em sequência e, seguindo a própria lógica da vida, impõe naturalmente o pensamento no que se seguirá.
Isso também é verdade. Mas aí reside a beleza, a incógnita e o segredo da dialética. A vida em sua mais perfeita contradição. Pela qual não conseguimos jamais compreendê-la por completo, nem vivê-la a cada momento. Pois que ela nada mais é do que uma tridimensionalidade que nos cerca: vivemos o presente, a partir de coisas que construímos do passado e que seguiremos levando adiante, naquilo que se traduz como o futuro.
Que 2012 seja assim, então, para cada um de nós. Cheio de saúde, alegria, amor e fraternidade. Que a solidariedade jamais deixe de estar conosco cotidianamente, por mais que tenhamos em nossas ideologias o sentimento de que tudo que está aí deve ser mudado na construção de um mundo novo.
Tudo bem. Mas as pessoas que vivem a sofrer, por uma condição de sujeição à lógica irracional do mundo, têm direito a superar seus sofrimentos. Não devemos esperar as pessoas morrerem na miséria para tomar isso como exemplo de que o sistema é injusto. Devemos condená-lo, mas salvando as pessoas... e não somente as matas, as árvores, os animais. “Hay que endurecerse, pero sin perder la ternura jamás” (Che).
Que 2012 inspire solidariedade, amizade e amor. Que construamos um novo mundo a partir de nossos próprios exemplos. Que não nos limitemos à crítica, pela crítica, mas que apresentemos alternativas concretas para realizarmos o sonho das pessoas viverem seus presentes com dignidade. E façamos isso também com nós mesmos. Que consigamos viver intensamente cada dia, cada momento, e nos coloquemos um desafio: de a cada dia que superarmos, conseguirmos aumentar o número de amigos que nos cercam.
Quem sabe assim atingiremos nosso objetivo de inventar um 2012 que corresponda ao que desejamos para cada um de nós em particular, e para todos coletivamente.
E o façamos tornar-se realidade.

Carpe diem!
“Tu ne quaesieris, scire nefas, quem mihi, quem tibi finem di dederint, Leuconoe, nec Babylonios temptaris numeros. ut melius, quidquid erit, pati. seu pluris hiemes seu tribuit Iuppiter ultimam, quae nunc oppositis debilitat pumicibus mare Tyrrhenum: sapias, vina liques et spatio brevi spem longam reseces. dum loquimur, fugerit invida aetas: carpe diem quam minimum credula postero”.

“Tu não procures - não é lícito saber - qual sorte a mim qual a ti os deuses tenham dado, Leuconoe, e as cabalas babiloneses não investigues. Quão melhor é viver aquilo que será, sejam muitos os invernos que Júpiter te atribuiu, ou seja o último este, que contra a rocha extenua o Tirreno: sê sábia, filtra o vinho e encurta a esperança, pois a vida é breve. Enquanto falamos, terá fugido ávido o tempo: Colhe o instante, sem confiar no amanhã”.
 "Odes" (I,, 11.8) do poeta romano Horácio (65 - 8 AC) 

IMAGENS:


Um comentário:

  1. Parabéns, Muca! Belo texto. Grande abraço e que em 2012 continuemos tocando a vida com dignidade e amor.

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