Por: Romualdo Pessoa
- O Nazismo foi um movimento de Esquerda?
Negativo. De forma
nenhuma. Quem tem alguma dúvida sobre isso desconhece por completo a história.
A esquerda, principalmente os comunistas, foram os principais alvos de Hitler
logo no começo de sua jornada para consolidar o poder que havia sido conquistado.
Naquela época o movimento comunista estava em ascensão, assim como a
social-democracia. A divergência entre esses dois segmentos terminou por abrir
a possibilidade da ascensão de Hitler, na medida em que, em função de uma crise
econômica terrível – consequência da grande depressão mundial da década de 1930
– a população alemã não se sentia protegida pelo governo. Numa situação dessas
é normal que sempre surja alguém, ou algum grupo, com um discurso de ódio,
duro, sectário e moralista. Assim fez Hitler, somando-se a uma capacidade de
oratória que ele tinha. Mas o que garantiu a sua ascensão, além desse quadro
político e econômico, foi também o fato de a burguesia não ter, naquele
momento, outra opção. Assim o establishment do Estado alemão optou por
entregar o poder a quem para eles seria mais confiável. Repito, num quadro em
que a esquerda estava em ascensão motivada pela conquista e ampliação do poder
na Rússia, então transformada em União Soviética. É bom que se diga que tão
logo tomou um poder, e responsabilizar um indivíduo holandês, que seria do
Partido Comunista, pelo incêndio do parlamento alemão, Hitler iniciou uma
verdadeira caçada a todos os comunistas. Mas nunca houve prova de que isso
tivesse sido uma articulação dos comunistas. No entanto, serviu de pretexto
para dar início a uma ditadura e botar em prática os planos de Hitler da
construção de uma nação de raça pura. Aliás, entre os que eram considerados de
raça impura estavam os comunistas, negros, homossexuais, ciganos, pessoas com algum tipo
de deficiência, portanto não somente os judeus.
Incêndio do Parlamento Alemão - Reichstag (1933) |
- Porque muitas pessoas na internet costumam espalhar essa informação?
Porque a principal
característica das gerações atuais é o desconhecimento da história. Assim fica
fácil plantar uma mentira, difundi-la repetidamente e esperar que uns tolos
acreditem e compartilhem. Vivemos a época das “Fake News”. As redes sociais se
tornaram canais de expressão de ignorância, intolerância e estupidez. Apegam-se
ao fato da denominação do partido de Hitler.
- Por que o partido de Hitler tinha "socialismo" no nome?
Porque o socialismo estava em ascensão e o
capitalismo em crise profunda, com a grande depressão. O socialismo conquistara
corações e mentes nas enormes dimensões russas e na Europa, com o advento da
Revolução Bolchevique, e também as próprias experiências em curso nos EUA, para
tentar tirar o país da crise econômica, tinham no planejamento do estado
socialista os melhores exemplos para isso. O Walfare State, que surge logo
depois da guerra bebeu na fonte do socialismo. Agora a denominação do partido,
como “Nacional-Socialista, dos trabalhadores alemães” era pura retórica. Da
mesma maneira como vemos hoje aqui no Brasil partidos de direita e de
centro-direita usarem o nome trabalhista e socialdemocrata. Suas políticas não
são voltadas para os trabalhadores, embora suas retóricas enganem com
denominações assim. Mas o que define as posições são as defesas de uma
sociedade menos desigual econômica e socialmente, mais solidária e com
distribuição de riquezas, de forma clara na sua aplicação e não somente no nome
ou no discurso. Isso é o que diferencia “direita” de “esquerda”.
O nazismo é um
regime totalitário, que abomina a democracia e refuta a diversidade. Para as
concepções nazistas o que faz as pessoas diferentes do padrão que eles
consideram normais, constituem-se em deformidades que precisam ser extirpadas.
É um regime que se propunha a atender a uma parcela minoritária da sociedade e
a tratar os trabalhadores, principalmente aqueles de origem pobre, africana e
asiática, como excrescência. No caso dos judeus haviam outros elementos, além
daqueles que fizeram deles párias das sociedades desde a diáspora do mundo
antigo por conta das questões religiosas. A Alemanha estava em crise,
absolutamente falida e humilhada. A perseguição aos judeus, apesar dos
argumentos utilizados que iam nessa direção da questão religiosa, se dava muito
pela necessidade de pilhar aqueles que possuíam grandes riquezas. Os judeus
eram pessoas bem sucedidas, em sua maioria, em uma sociedade absolutamente
falida. Hitler saqueou praticamente toda a riqueza dos judeus e a incorporou ao
Tesouro do Estado alemão. Mas, sempre, nazismo e comunismo se opuseram com profundas
diferenças. Afirmar que o movimento comunista prega um Estado totalitário é
também desconhecer a história desse movimento, que defende, sim, que num
primeiro momento haja a conquista do Estado com a centralização do Poder, mas
isso se dá pela necessidade de esse Estado atender ao que é essencial,
distribuir a riqueza, diminuir as desigualdades sociais e caminhar para uma
transição onde ele, o Estado, não seja mais necessário. Claro que ocorreram
distorções e problemas nesse percurso, e erros foram cometidos levando a um
fracasso nesse objetivo. Mas o nazismo é o oposto, assume a condição de um
movimento avesso à democracia popular, menospreza pobres, trabalhadores e
mulheres, e sempre teve o apoio da burguesia e das grandes empresas e
corporações.
A maior batalha da 2ª Guerra se deu entre alemães e soviéticos, em Salingrado. |
- O que mais as pessoas precisam saber para que essa informação esteja
clara?
Conhecer a História. As pessoas não
estudam mais como antes. Submetem-se a leituras curtas e rápidas, sem dar importância às
fontes, às origens daquelas notícias, não pesquisam para saber se o que está
repetindo e compartilhando é verdade ou não e passam a assimilar mentiras como
se fosse verdades. E aí, depois que assumem essa condição, de compartilhar
inverdades, passa a acreditar fielmente naquilo. Assim seu cérebro vai sendo
condicionado e suas posições assumem características radicais e intolerantes.
Essa é uma situação que boa parte do mundo vive hoje, e que alguns chamam de
“Pós-Verdade”, como sendo uma etapa posterior à “Pós-Modernidade”. A
pós-verdade é aquele momento em que as pessoas, diante de condições
socioeconômicas e políticas complicadas, e diante de crises inclusive
identitárias, passam a ver somente diante de si uma realidade, aquela que ele
construiu para si próprio a partir de leituras feitas sem embasamento e que se
tornam crenças irredutíveis. Ele não consegue ouvir mais o contraditório, e
passa a rejeitar qualquer outra explicação para aquele fato que ele crê como
sendo a pura verdade. É um ambiente de intolerância.
Saber lidar com o conhecimento de
forma a não ver uma opinião como definitiva, estar aberto para o contraditório,
acreditar que as coisas podem ter mudanças positivas a partir do entendimento
entre as partes, enfim, ser tolerante em suas posições, ajuda as pessoas a ter
uma visão mais clara sobre a realidade. Mas, acima de tudo, olhar para o
passado. As pessoas ficam procurando enxergar o futuro, quando ele sequer
existe e sua possibilidade depende do presente. Só que a melhor maneira de
aprendermos e evitarmos a repetição dos erros, ou pegar bons exemplos para seguir,
é mirando-se no passado, conhecendo a história. Como dizia Eduardo
Galeano, “A história é um profeta com o olhar voltado para trás. Pelo que foi,
e contra o que foi, anuncia o que será”.
(*) Íntegra da entrevista concedida ao
à Jornalista Fernanda Kalaoun, do Jornal Diário de Aparecida.
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