Mais uma vez o mundo assiste a uma
escalada de violência entre israelenses e palestinos. O Estado israelense contra o
que deveria ser o Estado palestino. Mas o povo palestino ainda não tem um estado reconhecido
pela ONU, e esta guerra se constitui em mais uma agressão sobre esta região ocupada há décadas.
É interessante ouvir o porta-voz
israelense dizer que está respondendo a um ataque. Mas na verdade a Faixa de
Gaza está completamente isolada, por terra e por mar, e até mesmo alguns navios que tentaram levar ajuda humanitária aos palestinos foram interceptados por Israel. Um deles, inclusive foi atacado violentamente no ano
de 2010, causando o assassinato de dez pessoas, todas de origem turca, o que
causou um rompimento nas relações entre os dois países. Mais de trinta
militantes de organizações humanitárias ficaram feridos no ataque, em mais um
ato de terrorismo de estado praticado por Israel que permaneceu impune.
A Faixa de Gaza, que é uma das
maiores concentrações de pobreza do mundo, é na verdade um território ocupado por Israel e uma parte do que deveria ser o Estado Palestino. O outro pedaço é a Cisjordânia, apartada de Gaza por território israelense. E é da
natureza do ser humano reagir a todo processo de agressão e ocupação. O que o
palestino faz é natural, em qualquer território ocupado e dominado no mundo, e
um direito reconhecido até mesmo pela própria ONU. Mas sempre que se aproximam
as eleições em Israel, o governo daquele país começa a matar palestinos.
Argumenta-se que pontos israelenses
próximos à fronteira foram atacados primeiramente. Na verdade o começo de tudo
desta vez se deu em função da morte de um jovem, que seria deficiente mental, e
da não aceitação por parte dos soldados israelenses para que o seu corpo fosse
retirado do local, deixando-o exposto por mais de seis horas, motivando uma
reação de militantes palestinos. O jovem havia sido morto por
soldados israelenses, por ter se aproximado sem ordem da cerca fronteiriça.
Dois dias depois outro jovem, de 13 anos, também foi morto em ação semelhante,
em incidentes que tem se tornado rotina, mas que seguem impunes e sem que a
comunidade internacional consiga tomar providências.
São fatos que acontecem
aparentemente por motivos fúteis, banais, e quase sempre elas tomam uma
dimensão multiescalar, principalmente quando se aproxima do processo eleitoral
israelense.
É uma estratégia baseada na
política do medo, em relação à população israelense, quanto também devido à
necessidade de agregar ao governo aqueles discursos mais conservadores e mais
fundamentalistas. Além de procurar, com essas medidas, alterar o sentimento de
aceitação do próprio governo, em baixa como decorrência da extensão da crise
mundial que tem afetado fortemente a economia daquele país. Segundo analistas,
que se basearam em pesquisas realizadas houve um aumento de 20% no apoio ao
governo após o início dos ataques. Mas a razão do adiamento do ataque por terra
deveu-se à mesma pesquisa indicar que 84% da população posiciona-se contrariamente
à invasão.
É uma política macabra, à custa de
mortes de centenas de civis palestinos, bem como também israelenses, embora em
quantidade ínfima, em torno de 5% em relação àqueles.
Mas, nas condições de uma crise que
o mundo vive hoje, a eminência e a possibilidade que esse conflito tome uma
proporção muito mais abrangente, é plenamente possível, infelizmente. Em
primeiro lugar porque Israel não vai ficar sozinho nesse conflito, e depois
porque o mundo árabe não é mais o mesmo. O próprio Egito, que é o vizinho mais
incômodo, em termos de poderio militar tem um governo atualmente bem diferente
e muito mais consistente em termos de adoção da própria linha muçulmana. E também
em função da instabilidade que há na região, como consequência das revoltas
árabes e das mudanças dos perfis dos governos e pelo conflito ainda em curso na
Síria.
Crianças palestinas atingidas no bombardeio à Gaza |
Mas é possível que Israel esteja
utilizando uma estratégia não somente focada no problema eleitoral, mas também
há uma tentativa de provocar o Irã. O governo israelense não nega que deseja há
muito tempo atacar instalações nucleares iranianas, esse é um projeto que ele
está a todo custo tentando convencer o governo de Barack Obama a dar o apoio
logístico para que isso possa ser feito.
É preciso dizer, no entanto, que
Israel não precisa do apoio dos Estados Unidos para atacar o Irã e destruir o
que ele quiser naquele país. Ele tem o maior arsenal bélico daquela região. Se
juntar Irã, os escombros do Iraque, as condições em que está a Síria, e todos
aqueles países que passaram pelas revoltas árabes, o Líbano, mesmo se todos
eles se unificarem numa guerra contra Israel, não conseguem superar o poder de
fogo do estado judeu. Este tem armas muito sofisticadas, talvez Israel tenha
hoje a indústria bélica mais sofisticada do mundo, rivalizando com o próprio
Estados Unidos, de quem é parceiro nesses proejtos, e tem o serviço secreto
mais eficiente, que é o Mossad. Mais eficiente, cruel e implacável. Então,
independente disso, o que Israel não deseja é ficar isolado na geopolítica
mundial, por isso ele precisa do suporte dos Estados Unidos.
Blog Democracia & Política |
Na idade média sequer era permitido
aos judeus terem a posse da terra. Essa situação de condenação dos judeus a
condição de párias, vem desde a antiguidade, quando a eles foram imputadas as
responsabilidades pela morte do mito cristão. E isso perpassou por todo o mundo
antigo e idade média, uma situação de pária do povo judeu. Até, claro, o
pós-segunda guerra mundial, quando, embora dominando o capital mundial – que
até hoje se encontra majoritariamente em mãos de judeus – eles não tinham um
Estado que os pudesse proteger, daí a origem da criação do Estado de Israel que
é um Estado judeu. Muito embora sendo uma república secular, laica. Não existem
somente judeus em Israel, mas também cristão, muçulmanos, apesar de serem
minorias. Há também, do ponto de vista da ótica burguesa, um sistema
democrático parlamentarista, com processo de escolhas democráticas, com todas
as artimanhas possíveis de serem aplicadas por quem detém o poder, em qualquer
outro país. Quando a democracia permite que sejam utilizados todos os
artifícios possíveis para poder manter o poder, ou seja, dentro dos limites que
a própria democracia impõe. Mas Israel é,
sim, um Estado criado para dar guarida
aos judeus, exatamente em função dessa situação de ser um povo por muito tempo
perseguido em várias partes do mundo. Isso representou o fim da diáspora dos
judeus, incentivados a se mudarem para o novo Estado, possibilitando
deslocamento em massa de populações da antiga União Soviética e da Europa,
principalmente da Alemanha.
O poderio bélico-militar de Israel é incomparável |
Mas com o tempo isso tomou outra
direção. O Estado israelense, pelo apoio que passou a ter em várias partes do
mundo, se constituiu em um ponto estratégico importantíssimo para os Estados
Unidos. Por sua localização, no continente americano, mas detendo o controle do
comercio de petróleo do Oriente Médio, os EUA necessitava de exercer sua
influência na região de forma mais presente, mais próximo. Muito embora existam
bases militares em vários países árabes aliados, esses sempre viveram em
constantes instabilidades políticas. Diferente de Israel, que se consolida
politicamente pela força e se torna o aliado perfeito dos Estados Unidos, mais
confiável. Até porque muito provavelmente a maior parte dos judeus não esteja
em Israel, e sim nos Estados Unidos. Principalmente aqueles que detêm um
montante bastante elevado de riquezas. E é dali que eles dominam boa parte do
capital mundial, no controle de grandes corporações, principalmente
financeiras.
Israel é como se fosse uma espécie
de novo estado da maior potência americana. Mesmo correndo o risco de uma
afirmação exagerada, é possível considerar dessa maneira metaforicamente, já
que é inegável a soberania do Estado de Israel. Mas pela sua importância política
e relação política umbilical com os EUA, são laços muito fortes que os
aproximam, a ponto de nas eleições estadunidenses Israel tornar-se um dos mais
importantes temas. A própria declaração de Barack Obama, em relação a esses
novos ataques de Israel confirma isso. Muito embora o seu adversário
conservador tenha sido o que mais enfaticamente defendeu o estado judeu, a
primeira declaração de Obama reafirma a importância dessa aliança e destaca que
Israel tem todo o direito de se “defender” de ataques palestinos, numa clara
parcialidade diante de uma questão tão complexa.
Como sempre, portanto. E os EUA
jamais irão querer que os estados árabes se unam para combater Israel, e dessa
maneira ele manda um recado aos governos desses países, que precisam de sua
ajuda. “Nós continuamos fortes aliados de Israel”.
Esse conflito, logicamente, deve
ser visto mais pelo aspecto geopolítico do que por questões religiosas. E
provavelmente outra hipótese levantada por alguns analistas para esses ataques
desproporcionais de Israel se deve ao fato de a Autoridade Palestina estar
preparando um novo pedido a ONU para que seja oficialmente aceito a inclusão do
Estado Palestino naquela Organização, na próxima Assembleia Geral. Algo
inaceitável por Israel, não propriamente em função da criação do Estado
Palestino, mas porque para o governo israelense algumas questões relacionadas à
sua segurança e às fronteiras deveriam ser acertadas em um pacto de paz. Mas
que nunca se realiza, até porque não somente a radicalidade se dá por parte dos
israelenses, como também pelas ações do Hamaz e do Hesbolah, grupos
fundamentalistas que controlam a Faixa de Gaza e o sul do Líbano.
São avaliações que consideram a
escalada de força de Israel como uma forma de gerar um impasse político que
impeça essa decisão na ONU. E, de antemão, estaria tomando uma iniciativa de
destruir toda uma infraestrutura do que poderia ser parte do Estado Palestino,
no caso a Faixa de Gaza, já completamente arrasada pelo bloqueio que dificulta
qualquer tipo de desenvolvimento na região.
Há possibilidade desse conflito se
expandir é real. E a Rússia já tentou aprovar uma resolução condenando Israel
no Conselho de Segurança da ONU, no que foi bloqueado pelos Estados Unidos, que
alegaram não haver referência às origens do conflito, numa tentativa de
responsabilizar os palestinos pelo começo dos ataques. Mas a Rússia promete
insistir, e caso não haja uma trégua a resolução será novamente apresentada. Consolida-se
mais uma vez a disputa geopolítica no Conselho de Segurança, conforme já
explicitei aqui em outro artigo, desta feita com uma resposta russa à tentativa
dos Estados Unidos de aprovar uma resolução que permitiria a invasão da Síria.
É impossível prever até onde irá
essa disputa. Mas o que é preciso estar atento é como esse conflito se situa em
um ambiente de crise econômica mundial. Historicamente sabemos que nenhuma
grande crise, de proporção mundial, conseguiu ser debelada sem que antes
acontecesse uma grande guerra. Essa possibilidade se acentua mais na medida em
que essas crises aproximam-se das grandes potências hegemônicas. Mas é de
difícil previsibilidade. O que se sabe, contudo, é que prosseguirá o aumento do
número de vítimas civis, a desproporcionalidade das respostas israelenses e,
principalmente, a manipulação da mídia sobre esse conflito.
Quase nunca a mídia e a ONU responsabilizam Israel pelos crimes |
É visível, e vergonhoso, o tratamento
diferenciado da mídia quando se trata de noticiar as agressões e assassinatos
em massa cometidos pelo estado israelense. Procura-se nas reportagens
apresentar ume equilíbrio nos ataques, quando isso é absurdamente falso.
Pode-se fazer uma comparação entre as informações relatadas pelos repórteres das
grandes mídias na cobertura da guerra na Síria, para falar da mais recente e à referência
à “brutalidade” do ditador sírio com sua condenação pelas mortes de dezenas de
vítimas também apresentadas como civis. Mas o enfoque é muito parcimonioso
quando a guerra envolve Israel, em situação semelhante, de ataques violentos em
bairros civis de Gaza. De cidades israelenses, os repórteres tentam dramatizar
o momento em que sirenes tocam nessas localidades e seus moradores correm a
proteger-se em bunkers. Mas esses mesmos repórteres não buscam situar-se do
lado palestino, onde a proporção de foguetes destrutivos é dez vezes maior e
muito mais fatal e eficaz, pela capacidade nítida de poder de fogo e poderio
bélico de Israel. Os que discordarem dessa análise quanto à manipulação
midiática podem fazer uma pesquisa na internet e analisar as informações
passadas sobre os dois conflitos. O que coloca em xeque, e precisa ser sempre
averiguado, as informações que são repassadas pelos grandes veículos de
comunicação.
Enquanto esse artigo era finalizado articulava-se uma trégua, coordenada pela ONU, os Estados Unidos e o Egito. Não se sabe até que ponto ela será respeitada, mas seguramente a condição de aceitação por parte de Israel deve-se às pesquisas indicarem rejeição da população quanto a uma invasão de Gaza por terra, e seguramente pelo fato de ter ocorrido um atentado em Telaviv, quase seis anos depois do último que ocorreu alil, trazendo de volta pânico e insegurança para a população. Até porque desta feita os mísseis do Hamaz estavam atingindo a capital israelense, e, se não têm a mesma eficácia dos que são disparados contra o território palestino, são o suficiente para gerar intranquilidade e afetar os planos do governo, que é justamente com esses ataques obterem maiores índices de aceitação que facilitem uma vitória nas próximas eleições. Mas dificilmente essa trégua irá durar muito tempo. E em que pese esse acerto, nada será dito sobre as responsabilidades dos assassinatos de civis, entre os quais muitas crianças. Os crimes de guerra somente são punidos quando são cometidos pelos inimigos do império.
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