Desta feita minha
abordagem semanal será sobre o PODER JOVEM. Aproveito para fazer uma espécie de
homenagem à minha geração, que na década de 1980 fez história, e não estou aqui
me referindo ao curso que eu fiz. Mas porque efetivamente nos engajamos, fomos
à luta e ajudamos a derrubar uma ditadura militar perversa que fez de 21 anos
uma longa e tenebrosa noite. Nós fomos protagonistas desse processo. Por isso
direciono essas palavras em primeiro lugar para meus companheiros e
companheiras de luta, os que comigo participaram do movimento que criou a
tendência estudantil VIRAÇÃO, mas também aos que estiveram nos embates conosco,
embora divergindo em questões ideológicas e estratégias. Porque tínhamos bem
claro o objetivo de derrotar um governo nefasto e criminoso, cuja prática
abominável da tortura fez-se rotina nos porões e subterrâneos de seu sistema de
vigilância e informação. Vigilância contra os que ousassem se opor aos seus
crimes.
E nós fizemos
isso, com muita dedicação e até mesmo sofrendo consequências cruéis desse nosso
engajamento, tanto em defesa de nosso país, como o que acreditámos ser o
caminho para construir um outro tipo de sociedade, mais justa e igualitária: o
socialismo. Combatemos o bom combate, e fomos vitoriosos, embora o que se
seguiu depois não fosse necessariamente o que desejássemos. Por isso cunhei uma
frase que insisto em repetir, porque pode ensinar as novas gerações: “Acreditávamos
ser real, o que era um ilusão”. Me refiro especificamente, por um lado ao
preconceito latente, mas submerso, existente na sociedade. E por outro lado ao
equívoco de se deixar de lado a compreensão de que a nossa sociedade é construída
sobre uma luta de classes, que dá a necessária dimensão da existência real das
estruturas do sistema capitalista e de como ele funciona.
Minha outra
homenagem é para a geração atual, esta que sofre nesses tempos de perversões e
retrocessos, de ódios e de intolerâncias, num movimento que minha geração não
previu, da ascensão ao poder de mentes estúpidas, de extrema-direita,
defensores de ditaduras, torturadores, milícias e exterminadores de conquistas
e direitos adquiridos com muita luta. Essa juventude de hoje carrega esse peso,
de uma responsabilidade diferente da nossa, mas talvez de uma dimensão bem
maior. Porque a minha geração pegou um movimento que estava embalado ao favor
das forças progressistas, ao contrário dos dias atuais. E, em nome dessa
juventude de hoje, faço a homenagem ao meu filho, IAGO MONTALVÃO OLIVEIRA
CAMPOS, Presidente da combativa, representativa e destacada UNIÃO NACIONAL DOS
ESTUDANTES. Evidente que falo isso com muito orgulho, por ele ser meu filho e
por eu também ter sido, com muita honra, diretor dessa entidade, entre os anos
1984 e 1986, período de intensa lutas em defesa da democracia e das nossas
liberdades individuais e escolhas.
O título, O PODER
JOVEM, eu me apropriei indebitamente, de José Artur Poerner. Esse livro foi um
dos que eu li com mais sofreguidão, lá no começo da minha militância no movimento
estudantil. Ele foi para mim uma referência histórica importante, porque eu
quando entrei na universidade pouco conhecia da luta da juventude. Posto que eu
era um jovem alienado, como a imensa maioria daquela juventude de minha época,
final da década de 1970 e começo dos anos 1980, contido pela censura e pelas
repressões das estruturas militares.
Apesar de eu ter
vindo dos movimentos das comunidades eclesiais de base, naquele momento em que
ingressei na universidade, meu ímpeto era mais religioso do que político.
Exatamente em 1981, quando o livro de Leonardo Boff foi lançado, “O caminhar da
Igreja com os Oprimidos”, eu vivia a minha transição, da militância na igreja
para a militância comunista. Mas esse livro foi essencial também em minha formação
e me fez manter até hoje o respeito por esse segmento progressista da igreja
católica, a Teologia da Libertação. Exatamente por isso, embora tendo me
tornado ateu, nunca fui de agredir ou atacar seja símbolos ou os valores
religiosos. Porque eventualmente esse pode ser apropriado por pessoas sem
caráter, mas existem muitos de boa fé, que conseguem se manter firmes na
disputa para que as crenças não se tornem objetos de fanáticos perversos. O
que, infelizmente nos tempos atuais, está acontecendo.
Mas, voltando ao
PODER JOVEM. Por que da identificação de minha conversa aqui com esse livro?
Naturalmente há uma relação intrínseca. Faço isso porque o que pretendo aqui é
exatamente reforçar a importância do papel da juventude na luta pelos direitos
sociais, contra as desigualdades, por liberdade e democracia. Por uma
verdadeira democracia, não esta em que vivemos, com uma desigualdade estúpida,
onde 1% da humanidade controla mais de 90% da riqueza. Isso não é democracia, é
plutocracia.
O que POERNER
descreve por todo o seu livro é exatamente a essência do título, o poder da
juventude. Ele vai buscar fatos históricos ainda no século XIX e adentra o
século XX apontando o quanto foi importante em momentos cruciais de nossa
história o papel e o engajamento da juventude. O surgimento da UNIÃO NACIONAL
DOS ESTUDANTES, a gloriosa UNE, foi consequência desse protagonismo da
juventude, e a partir de sua criação a organização e força da juventude se ampliou
consideravelmente, tendo nas universidades os alicerces que sustentaram essas
lutas. Secundadas, mas não com menos importância, pela UNIÃO BRASILEIRA DOS
ESTUDANTES SECUNDARISTAS – A UBES.
Foram muitos
momentos na história política do Brasil em que a participação da juventude,
organizada, se deu com muita força e tornou-se essencial em muitas conquistas.
Na luta contra o nazifascismo; em defesa do petróleo e da criação da Petrobrás;
na defesa da legalidade quando na tentativa de impedir a posse de João Goulart;
na oposição firme à ditadura militar, com muitas de suas lideranças sendo
presas, torturadas e assassinadas; e em defesa de nossas liberdades. Sempre a
juventude esteve na linha de frente, aguerrida e corajosa.
Pois bem. Esse
momento terrível em que estamos vivendo, como costumamos dizer é apenas uma
fase que será superada, mas isso pode ocorrer para mais ou para menos tempo do que o desejável. E pode tornar pior
uma situação que já é degradante socialmente. Afinal, temos um governo
destruidor das conquistas sociais, incentivador do armamento, pusilânime com as
milícias, intolerante politicamente e estimulador de ódios e preconceitos. Tudo
vai depender da capacidade de reagir com indignação contagiante e rebeliões
explícitas que façam como tem feito o povo chileno, e como fizemos por aqui em
outras situações.
Claro que a
situação exige prudência, a pandemia segue ceifando vidas e a juventude não é
invulnerável. Enquanto não tivermos uma vacina não se pode subestimar a
capacidade destruidora desse vírus. Deixemos essa exposição suicida para os
negacionistas estúpidos. Mas está em jogo não somente testar a paciência dessa
juventude. Está em jogo o seu futuro. Estamos vendo ser destruídos mecanismos
sociais minimamente necessários para conter a ampliação das desigualdades. A
previdência social já foi implodida, os direitos previdenciários para as novas gerações
não são mais os mesmos que conquistamos com a Constituição de 1988, e até mesmo
por conquistas anteriores. Os contratos de trabalho, que afetam e afetarão as
novas gerações estão sendo implementados após uma reforma trabalhista que só
veio para beneficiar os proprietários dos meios de produção. E para piorar,
assistimos a uma destruição da estrutura educacional de nosso país, que já era
frágil apesar das lutas e conquistas obtidas na primeira década deste século.
Já falei em vídeos
anteriores que vejo somente na organização social a condição de sairmos dessa triste
situação. Mas dentre todas as formas de organização social, e de segmentos
capazes de empunhar com força as bandeiras e instrumentos necessários para
barrar essa destruição, está, como sempre esteve, a juventude, e suas entidades
como a UNE e a UBES. Infelizmente a
pandemia e o distanciamento social, tragicamente, beneficia as loucuras de um
governo que pouco se importa com a população, mas que se vê protegido pelo
distanciamento da ira da juventude, impedida de ocupar as ruas nesse momento.
Mas quero finalizar,
depois de enfatizar a importância que a juventude tem nesse processo, indicando
que é fundamental usufruir daquilo que as redes sociais possibilita, para além
dos algoritmos e das fake news, como forma de manter a juventude em estado de
alerta, e utilizando dessas ferramentas para fortalecer as organizações
estudantis, mesmo que virtualmente, para que, dessa forma, se espalhe e se
acumule o sentimento de revolta contra as medidas destrutivas e restritivas que
estão sendo impostas, principalmente às universidades, até com quebra de sua
autonomia e democracia interna. Para que, no momento possível, essa revolta
possa explodir pelas ruas, como já fizemos em outras épocas, impondo derrotas a
fascistas e a uma extrema-direita defensora da barbárie que torturou e matou
centenas de jovens que lutavam por seus direitos e por liberdades.
Não digo que somente
a juventude será a responsável por dar uma guinada nessa situação de retrocesso
político que o nosso país está vivendo. Mas ela é fundamental para inundar as
ruas e praças de luta e de esperança, e restabelecer a razão em um país dominado
pela estupidez, pelo ódio e pelo fundamentalismo religioso. Mais do que isso,
que essa juventude possa criticamente ter a plena convicção que esse sistema,
absolutamente perverso e desigual, não lhe dá garantia de futuro decente e que
atenda a todas as pessoas. E compreendam, que como nós tínhamos sempre em nosso
horizonte, é essencial construir a utopia, a crença de que podemos superar as loucuras
geradas pelas crises sistêmicas capitalistas, e construir uma nova sociedade,
para o futuro que obviamente representará o presente desta e das novas
gerações.
É urgente pensar
como lidar com essa situação, agora e no pós-pandemia, tendo como foco a
necessidade de ocupar as ruas e mais uma vez fazer ecoar o grito do PODER
JOVEM, contra a tirania e o arremedo de ditadura que lunáticos implantar, e que
pode se tornar uma realidade com um segundo mandato de governo que nos deixa
até sem adjetivos para qualificá-lo. O futuro, que é uma construção, como
nunca, está nas mãos da juventude. Que a UNE
e a UBES saibam construir uma unidade necessária entre suas diversas
tendências, que seguramente se opõem a esse descalabro que aí está, e possam
marchar para ocupar as ruas com organização e brandir com a ponta de seus lápis,
os gritos de guerra que imponham derrotas a esse poder decrépito e desvairado
que nos governa.
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