Estamos vivendo momentos tensos, de
definições políticas e de decisões tomadas por um governo que assumiu o poder
por meio de manobras constitucionais. Essa condição faz com que as medidas
implementadas não tenham sido submetidas ao crivo da aprovação popular. Nessas
circunstâncias, as reformas propostas não objetivam agradar a maioria da
população brasileira, mas dar respostas àqueles setores que controlam a riqueza
do país, os meios de produção e, por conseguinte, influenciam nas decisões
tomadas por parlamentares que foram eleitos sendo financiados por esses
segmentos.
As propostas apresentadas pelo
governo de Michel Temer, visam corrigir os problemas da crise brasileira com
medidas que afetam setores que são cruciais para o desenvolvimento nacional e
social do nosso país. Em especial, a saúde, educação, investimentos em
programas sociais, questões ambientais e da defesa de nosso território. A
partir de um projeto de emenda constitucional, transitada na Câmara dos
Deputados sob o número 241, e agora no Senado identificada como PEC-55, esse
governo deixa bem claro para que veio, e as razões de impor o impedimento a uma
presidenta legitimamente eleita.
O controle dos gastos, feito de
forma indistinta, como se estivesse gerenciando uma empresa, demonstra o grau
de insensibilidade com setores que são estrategicamente importantes para o
nosso crescimento enquanto Nação. Por outro lado, demonstra o quanto está sendo
feito para agradar o setor empresarial, principalmente por abrir o Estado, mais
do que já está ocorrendo, para a atuação de empresas privadas, terceirizando uma
quantidade cada vez maior de atividades aos interesses da ganância privatista.
Esses pressupostos,
acrescentando-se o fato de atingir de forma crucial a educação, tem gerado uma
onda de revoltas que fez os segmentos que atuam diretamente nessa área, ou que
são beneficiários dela, se mobilizarem para combater tais medidas. Como sempre,
a juventude tem demonstrado não ter perdido seu espírito de rebeldia, e
radicalizaram a luta, entendendo que há uma força coesa no parlamento, dominado
pelos conservadores, que garantem o apoio à essas reformas, como um rolo
compressor, em troca de benesses, cargos e apoio às suas reeleições. As
ocupações de escolas, institutos tecnológicos e faculdades, tomaram uma
proporção que não era esperada pelo governo, e tende a se ampliar, muito embora
o cerco efetuado pelo ministério público e justiça federal estejam atuando para
por fim a essas ocupações.
Por outro lado, os servidores
técnico-administrativos já deflagraram em âmbito nacional, um movimento
grevista, paralisando por tempo indeterminado suas atividades, e somando-se às
lutas de outros setores da sociedade, também pressionam para conter a sangria
que está sendo feita nos direitos trabalhistas e sociais.
São movimentos que guardam suas
especificidades e lidam com as formas de lutas que lhes são mais adequadas e
possíveis de serem levadas adiante de acordo com suas próprias características.
Ressalto como importante a intensidade da luta estudantil, pelo vigor que ela possui
e pelo receio que todos os governos sentem de ter que encarar grandes
mobilizações da juventude nas ruas. Essa juventude carrega a esperança de poder
ampliar as reações a medidas que são nocivas à maioria da população brasileira.
Como resposta ao movimento grevista
dos técnicos, e os que também já foram aprovados por professores em diversas
universidades e institutos federais, o Supremo Tribunal Federal cumpre o papel
de guardião das reformas conservadoras em curso. Decidir pelo direito que os
governos tem, de imediato solicitar o corte dos pontos dos grevistas, sinaliza,
na prática, pelo impedimento dos servidores públicos poderem decidir livremente
um direito que historicamente sempre foi crucial nas lutas dos trabalhadores, do
Brasil e do mundo, de deflagrar greves quando julgarem que suas reivindicações
não encontram canais de negociações, e, de forma impositiva estabelecem-se
mudanças que lhes serão prejudiciais.
O direito de greve dos servidores
públicos é legitimado pela Constituição brasileira, e somente não foi
regulamentado em alguns aspectos porque foge do interesse de uma maioria
conservadora, que protela discussões que são do interesse dos trabalhadores. No
entanto, concordemos ou não, isso impõe aos professores a necessidade de a
deflagração de uma greve ter que contar com o apoio da ampla maioria dos
professores, caso contrário será um movimento de apenas uma parcela, somente
sendo possível parar em sua totalidade por meio de formas coercitivas e
impedimento de acesso á universidade. O que imporia uma realidade de confronto
entre nós mesmos.
Mas, em que pese esses
questionamentos, e a tentativa de cercear o direito de greve, é preciso
analisar se entre os professores universitários, esse instrumento se faz
necessário neste momento, e até que ponto ele não dificulta ainda mais as
possibilidades de mantermos a universidade em movimento, em condições de
debater e discutir as questões postas que irão nos afetar diretamente pelos
próximos anos. Aliás, pelos longos vinte anos que estabelece a famigerada PEC.
Como eu disse anteriormente, a
greve é um instrumento de pressão que tem por intuito forçar a abertura de
diálogo e de negociação, a fim de termos nossas demandas atendidas. Mas, contra
quem estamos lutando neste momento? Não se trata de reivindicações pontuais,
salariais ou diretamente relacionadas à nossa categoria, especificamente. Essas
medidas afetam um leque de setores muito amplos e estão sedimentadas pela
formação de uma ampla maioria constituída a partir do golpe
parlamentar-judiciário que destituiu a presidenta Dilma. Portanto, não temos
interlocutores a nos atender em um movimento grevista, que foge das
características tradicionais, quais sejam, a luta contra o arrocho salarial e
em defesa de melhorias em nossas carreiras, a partir de pautas de
reivindicações construídas com esse objetivo. Assim, a greve deixa de ter um
foco específico, e passa a acontecer em cima de reivindicações gerais, que
extrapolam a nossa própria categoria e até mesmo os limites da comunidade
universitária e da educação. As reformas em curso são bem mais abrangentes, e
além de nos atingir afetam milhões de brasileiros por diversos setores em que
atuam ou que por algum programa é beneficiado.
Assim, problematizo a questão: qual
o objetivo da greve? O que seria possível fazer para combater as reformas do
governo Temer, neste momento inseridas na PEC-55, num movimento grevista, que
não seja possível de fazer com a universidade aberta e apta a discutir essas e
outras questões que se tornarão cruciais para nós nos próximos anos? Valerá a
pena diante dessas circunstâncias parar a universidade, e vermos a maioria de
nossos colegas distantes de um ambiente que deveria ser instigado a debater com
mais frequência esses e outros problemas que nos cercam? Não somente a nós,
comunidade universitária, mas a toda a sociedade?
Técnicos-administrativos da UFG decidem pela greve |
Não estou querendo questionar o
movimento dos técnicos-administrativos, que possuem outras demandas e tem
características distintas dos professores e, principalmente, porque eles não
tiveram cumpridos acordos firmados em paralisações recentes. A greve dos
técnicos afeta sobremaneira a universidade, as atividades que eles desenvolvem
são cruciais para um bom desempenho da instituição, mas efetivamente não leva a
um esvaziamento do nosso espaço, e nos força até mesmo a ter a compreensão de
suas importâncias em nosso cotidiano.
Mas uma greve de professores, como
tem sido nos últimos movimentos grevistas, esvazia a universidade, não atrai os
professores para as atividades desenvolvidas e não causam repercussão na
sociedade. Muito menos irá sensibilizar um governo que tem no questionamento ao
ensino público um de seus objetivos já definidos. E, afinal, até onde o
movimento iria? Seria uma greve por tempo indeterminado ou tendo em vista a
votação da PEC no Senado? Se porventura houver aprovação dessa proposta (algo
previsível, pela ampla maioria que o governo tem no Congresso) como o movimento
encararia essa questão? Sabendo-se que mais adiante virão outras medidas que
irão nos afetar mais uma vez, e sempre. Deflagraremos uma greve a cada proposta
de reforma apresentada pelo governo? Isso significa a mais pura banalização da
greve, sem objetivo específico, por meio de combates a medidas amplas e que nos
levará ao enfraquecimento do movimento, a uma divisão entre os professores e a
uma situação de instabilidade em nossa instituição, o que provocará mais ainda
o seu enfraquecimento.
Erguer a bandeira da greve neste
momento não significa, necessariamente, a mais revolucionária das posições a
ser adotada. Mesmo que consideremos que setores conservadores, existentes na
universidade, posicionam-se sempre contra essas paralisações. Mas há de se
considerar também, que muitos que não aceitam sob hipótese alguma, a PEC-55,
também não consideram a greve o instrumento adequado a este momento. Eu me
incluo nesse segmento.
Na década de 1980 foi criado o Fórum em defesa da UFG. Na foto o reitor Joel Ulhoa dirige assembléia |
Para além dos possíveis maniqueísmos
que se queiram criar, não é possível encarar essa situação como numa escolha
entre o oito e o oitenta. É possível construir mecanismos internos à nossa
instituição para levarmos de forma aprofundada a discussão sobre as consequências
que essas medidas trarão. Mas também construirmos outra agenda, não só interna,
mas que possa levar para a sociedade essa discussão, por meio de associações,
entidades representativas dos diversos segmentos públicos ou privados, e a
necessidade de criarmos um movimento a partir da universidade, como já o
fizemos em outros momentos de crises, quando criamos os Fóruns em Defesa da Universidade Pública,
Gratuita e de Qualidade.
Os movimentos em curso, cada qual
com suas características e formas de lutas, podem ser incorporados em uma iniciativa
que envolva os sindicatos e entidades, para construir uma agenda permanente de
debates, discussões e formas de organização para barrarmos a sequencia de
medidas restritivas á educação superior pública que virão pela frente. Também não
pode se esconder dessa luta e responsabilidade, a reitoria e seus órgãos
complementares. É preciso que haja coragem de se bater de frente com atitudes
que ferem a autonomia da universidade e que visam cercear nossa liberdade de
ação, de movimento e de discussão. O dirigente da universidade, assim como os
das demais entidades que representam as nossas categorias, devem se postar de forma
corajosa à frente dessas atividades e demonstrar cabalmente sua postura em
defesa da nossa instituição, das nossas condições de trabalhos, na garantia de
recursos suficientes para que o ensino e a pesquisa prossigam com qualidade,
sem redução dos quantitativos financeiros que são necessários a esse bom
desempenho.
Por essa razão, imagino que a
deflagração de uma greve manterá somente um pequeno número de pessoas
envolvidas, como tradicionalmente acontece, enquanto as demais se limitam a
definir a data em que irá retornar a assembleia para votar pelo fim da greve.
Isso esvazia nossa universidade e não cumpre o objetivo de garantir que haja
uma mudança de comportamento internamente, que nos leve a um interesse maior
para as questões que vão além do nosso laboratório de pesquisa, de nossa sala
de aula, ou da burocracia que nos amarra.
Neste momento, a comunidade
universitária deve ser chamada à responsabilidade de defender o que foi
conquistado com muito esforço nos últimos anos. E, se porventura, existir (e
existe) quem queira defender as medidas restritivas do governo federal, que
esses colegas possam se manifestar e vir abertamente para o debate, se posicionar
com seus argumentos. Duvido que tenham condições de negar que tais medidas irão
afetar perversamente nossas instituições, afinal, se as estatísticas são manipuláveis,
os números não mentem. E as ideias que estão por trás das medidas construídas
na elaboração dessa PEC, nitidamente demonstram um caráter de perversão sobre a
necessidade de o Estado brasileiro assegurar o ensino público, gratuito e de
qualidade.
Professores da UFG aprovam paralisação nos dias 11 e 25 de novembro contra a PEC 241/55 e FORA TEMER! |
Ademais, conforme já aprovado em assembleia,
devemos paralisar nossas atividades nos dias 11 e 25 de novembro, aderindo a
uma greve geral nacional nessas datas, como forma de repúdio às medidas
impostas pela PEC 55. Isso já é um passo importante para demonstrarmos a nossa
indignação e de que não estamos parados diante desse quadro político.
Isso não contrapõe às lutas
travadas pelos estudantes, que seguem suas dinâmicas próprias. Mesmo com as
ocupações, ou com outras formas de manifestações, o movimento estudantil tem
outro perfil. E, quanto mais formas alternativas de se contrapor a medidas
indesejáveis, por parte dos estudantes, mas isso servirá para atrair a atenção
para as suas demandas. Além do mais, a vida em si, da universidade, depende dos
estudantes. São eles que tornam a universidade diversa, inquieta e provocativa.
Se os estudantes portam-se passivamente, a universidade perde em essência,
acomoda-se e tem como foco somente a formação para o mercado. Por isso, as questões
que aqui coloco, não estão relacionadas aos movimentos dos estudantes, e,
entendo que porquanto durar suas ocupações, muito embora isso traga como consequência
uma reação jurídico-policial, devemos vê-las com respeito, sem confrontá-los, muito ao
contrário, contribuindo com o que for necessário para que, mais do que
ocupações, isso signifique espaços de diálogos, de defesa de uma universidade
crítica e de formação de jovens que olhem para frente enxergando muito mais do
que tão somente sua formação profissional, mas também como cidadãos engajados e
dispostos a lutarem por transformações sociais mais justas e menos desiguais.
Com isso ganha não somente a universidade, mas sociedade como um todo.
Assembléia dos estudantes (FH) decidem por ocupação. Mas as ocupações não acontecem em todas unidades |
Mas, qualquer que seja a decisão a
ser tomada, nenhuma atitude pode implicar em causar prejuízo aos estudantes,
notadamente àqueles que estão à frente do movimento de ocupações. Não cabe aos
professores estabelecerem uma situação de animosidade nessas situações. Da
mesma forma que não devemos adotar uma atitude policialesca de identificar de
forma pejorativa qualquer um que apresente opinião contrária, a fim de não
criarmos um clima de beligerância entre nós, comunidade universitária. Afinal,
como dizia o Cazuza em uma de suas músicas, e que serve nessas circunstâncias
que envolvem nossa universidade, “meus inimigos estão no Poder”.
Se a assembleia que ocorrerá no próximo dia 09/11, no entanto,
aprovar greve, devemos fazer todos os esforços possíveis para unificar a nossa
categoria e desenvolver atividades em conjunto com os demais setores. É
essencial que as decisões da maioria sejam respeitadas, e por isso se faz
necessário uma grande presença, sempre, nessas assembleias. Devemos criar um ambiente de debate e mobilização permanente, pois o que virá
para além dessa PEC tende a prejudicar sobremaneira as universidades e
institutos federais de ensino e tecnológicos. Saber fazer isso, de forma a
ampliar pelo convencimento as nossas forças, será essencial para garantirmos os
recursos que são necessários ao bom funcionamento da universidade, a melhoria de nossos salários e a defesa da
autonomia universitária.
CALENDÁRIO:
DIA 07/11 - 14 horas - Assembléia Universitária no Centro de Eventos da UFG
DIA 09/11 - 14 horas - Assembléia Geral dos Professores para decidir sobre a greve geral - Centro de Eventos da UFG
DIA 11/11 - Greve geral nacional. Ato na praça dos Bandeirantes às 9 horas
DIA 25/11 - Greve geral nacional.
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