A ORIGEM DA CRISE
A crise que atinge o Brasil há mais
de um ano, e que tomou proporções quase incontroláveis é possível de ser explicada.
Mas passa ao largo da maneira subjetiva como é enxergada pela maioria da
população. Subjetiva, por um lado, na ausência de entendimento do que realmente
acontece a partir das maquinações politicas e geopolíticas. Mas objetiva em
função do quadro econômico, do aumento de inflação e de aumento do desemprego.
Muito embora as duas questões estejam umbilicalmente ligadas.
Há, naturalmente, uma relação
dialética entre crises econômicas e políticas. Obviamente, na disputa pelo
controle do Poder, os grupos que se encontram na oposição torcem para que as
medidas adotadas por quem o controla, descarrilhem. Essa é a única maneira de
retomarem o protagonismo político e controlarem as estruturas do estado, bem
como definirem suas políticas que atendam os interesses dos setores que lhes
apoiam, ou que sejam adequadas às suas ideologias.
Então, temos uma crise econômica, que
é sistêmica, se arrasta paquidermicamente desde o começo deste século e teve o
seu epicentro em 2008, com a crise imobiliária nos EUA. Nada mais do que uma
consequência do caráter especulativo e ganancioso de como o sistema capitalista
se travestira ao longo da expansão neoliberal globalizante.
Ela não nasceu no Brasil, não teve
sua maior dimensão nem em nosso país nem na América Latina. Espalhou-se pelo
mundo no rastro da facilidade como o sistema financeiro incorporava a
tecnologia para facilitar a expansão do crédito e os investimentos em bolsas de
valores por todo o mundo. Aliava-se, também, à força de um novo poder
corporativo, essencial para a manipulação da informação e o jogo de notícias
que tornavam os poderes políticos nacionais mais frágeis: a grande mídia. Mas
esse jogo de poder, reforçado pela força da informação, se fortaleceu também
nessas estruturas financeiras, e por ele se manipula, falsifica notícia, se
especula com base em boatos e se derruba e levanta ações para os mais variados
gostos usuráveis e gananciosos. Há, na verdade, uma relação siamesa entre esses
poderes corporativos.
Contudo, outros elementos, para além
do caráter cada vez mais ganancioso e concentrador da riqueza, bem perceptível
nas estruturas do sistema capitalista, mas que o fortalece, estão nas disputas
ferrenhas pelo controle do poder político. Ao longo dos últimos séculos, desde
o final do século XIX, a burguesia procurou moldar a sociedade para a aceitação
da democracia capitalista, pela qual a liberdade garantida a todos seria a
condição para que, individualmente, cada um pudesse se tornar rico. E
apresentava essa possibilidade escorado em valores religiosos, na crença do
sacrifício, na expectativa de, em não sendo possível atingir esse objetivo,
“deles seria o reino dos céus”. Claro, a ideologia da prosperidade era
fundamentada também na esperança de que, pelo trabalho profícuo e disciplinado,
as pessoas boas teriam sucesso nesses objetivos, nesse momento entram as ideias
protestantes, hoje representadas no neopentecostalismo. Era preciso demonstrar
que tudo deveria ser fruto do afinco, da perseverança e da crença aos valores
democráticos, que permitiriam e garantiriam a liberdade individual, pelo
trabalho, aceitando-se a exploração, a pobreza e a riqueza, como escolhas
divina. Para além disso, mesmo que se visasse repartir com os mais pobres a
riqueza adquirida socialmente, soava como algo pernicioso, intentado para
roubar a riqueza dos que trabalham e enriquecem honestamente.
Desde então, o sentido de democracia
incorporou esses valores, e solidificou ideologicamente na sociedade,
principalmente entre os mais esclarecidos, a crença de que qualquer tentativa
de, mesmo por meio do Estado, se procurar distribuir a riqueza, significaria
expropriar o usufruto do trabalho. Com base nesse discurso, que se construiu em
cima de uma ideologia, e se tornou um paradigma, as classes dominantes procuraram
de todas as formas impedir qualquer tipo de governos que buscassem justiça
social. Isso se fortaleceu após a segunda guerra mundial, quando o mundo se
dividiu entre socialismo e capitalismo, período denominado de Guerra Fria, e se
estabeleceu rigidamente a necessidade de se tomar uma posição, que seria
definidora sobre qual lado se deveria estar: esquerda ou direita; socialismo ou
capitalismo.
O neoliberalismo e a onda
globalizante do final dos anos 1990, e daí em diante, mesmo que tão rapidamente
tivesse despencado abismo abaixo, reforçou esses sentimentos e contrapôs, pelo
fracasso dos países socialistas, competência (vinculada à capacidade de se
ascender socialmente) à incompetência (rotulando os que se opunham aos
mecanismos egoístas neoliberais e acusando-os de serem ineptos e preguiçosos). A
referência era, naturalmente, o fracasso dos países socialistas, naquilo que
eles pretendiam ser, mais solidários.
E, assim abriu-se uma guerra a todos
os governos eleitos democraticamente, jogando o jogo pregado pela burguesia,
que se apresentassem com projetos na contramão desses valores tornados dogmas
pelas classes dominantes, porque amplamente favorecidas com as mudanças que
começaram a serem efetivadas nos anos 1980 em outras partes do mundo, e no
interesse dos EUA e alguns países europeus, seus aliados. Aceitava-se a
democracia, desde que seus objetivos finais não incomodassem a lógica natural
do sistema capitalista e do interesse da burguesia, a liberdade para acumular
mais e mais riqueza.
A vitória de projetos políticos
progressistas durante a primeira década do século XXI, em diversos países
latino-americanos, inclusive o Brasil, mesmo que alguns deles mantendo partes
das políticas neoliberais, mas que significasse um maior protagonismo das
forças de esquerda, foi duramente combatido. Os partidos conservadores e de
direita viram-se perdidos em meio a essas mudanças. Sentiram o golpe e demoraram
a reagir, principalmente porque o suporte tradicional das ações direitistas, o
gendarme estadunidense, estava envolvido com sua sanha de caçar terroristas no
Oriente Médio.
Os avanços sociais obtidos por esses
governos, que se espalharam pela América latina com discursos que ameaçavam a
hegemonia dos partidos conservadores, provocou uma reação das camadas ricas e
tradicionalmente controladoras das estruturas do Estado, desde os tempos
coloniais. Não tardou também a despertar a preocupação dos falcões
estadunidenses, preocupados com a ampliação da força crescente, estampada no
fortalecimento do Mercosul, depois da Unasul e, principalmente, do surgimento
de uma estrutura capaz de colocar em xeque o hegemonismo estadunidense: o
BRICS.
Jamais, desde que a partir do século
XX os Estados Unidos incorporaram em seus ideários geopolíticos a necessidade
de controlar os países do centro e sul do continente americano, houve um
período tão extenso de descontrole sobre quais forças políticas comandariam os
destinos desses países. Um dos seus principais estrategistas, cujas teorias são
aplicadas até hoje nas ações geopolíticas dos Estados Unidos por todo o mundo e
na América, Nicholas Spykman, destacara a importância de exercer o controle
sobre determinados países, em especial o grupo denominado por ele ABC:
Argentina, Brasil e Chile. A Venezuela, não somente por sua enorme reserva
petrolífera, segundo alguns a maior do mundo, mas também pela posição
estratégica próxima ao Canal de Panamá, juntamente com a Colômbia, que em
tempos passados formaram um único território, a Grã-Colombia. E Cuba,
igualmente por sua posição estratégica, de um posicionamento que a tornava
praticamente controladora dos acessos marítimos para o Golfo do México.
Com a mudança de governo nos EUA, e a
decadência da dinastia Bush, obcecada em destruir governos e garantir a
retomada dos controles, por suas corporações petrolíferas, na exploração do
petróleo no Oriente Médio, sob o manto de caça aos terroristas, ocorrerá uma
alteração nas táticas a serem adotadas. Obama modifica a forma de agir, embora
mantendo a velha estratégia contida na geopolítica de Spykman, de cercar o
Heartland (leia-se Rússia), controlando o Rimland (entenda-se Leste Europeu,
Oriente Médio e Norte da África) e a América (os países citados). Além da
teoria do Rimland, a de contenção passa a ser aplicada de maneira mais sutil,
com a promoção de ações para desestabilizar governos e impedir que grupos
inimigos pudessem se fortalecer com o apoio de governantes vistos como hostis e
inimigos.
A partir do século XXI, bem em seu
começo, uma série de “revoluções” ditas democráticas, denominadas “coloridas”,
inaugurou tempos complexos do que seria o entendimento a respeito da defesa de
democracia, ou da luta para derrubar governos que não se adequassem à liturgia
do Império. A inspiração foi uma obra, tornada best-seller por ação
propagandística da Agencia de Inteligencia dos EUA, a CIA. Escrita por Gene
Sharp, “Da ditadura à democracia” tornou-se o instrumento e o guia para
diversos levantes “populares”. Por trás da “espontaneidade” das massas,
contudo, escondia-se uma série de ONGs, embora algumas abertamente financiadas
por instituições e corporações estrangeiras, a maioria dos EUA. Dentre esses
financiadores se encontrava, e se encontra, o megaespeculador George Soros, que
investe altas somas de dinheiro no financiamento de organizações que proporcionassem
o estopim dessas rebeliões, e por outro lado ganhava altas somas de dinheiro
especulando e adquirindo ações de empresas que se enfraqueciam diante das
crises criadas e fomentadas. Tudo isso está detalhadamente demonstrada e
fartamente documentada no excelente trabalho de Moniz Bandeira, “A Segunda
Guerra Fria”.
Essas ações espalharam-se pelo mundo
numa rapidez estonteante, e provocaram uma impressionante alteração na ordem
geopolítica mundial, com a derrubada de diversos governos, inicialmente no
Leste Europeu, depois espalhando-se pelo Norte da África e Oriente Médio, no
Cáucaso de forma provocativa a atingir a Rússia, e na América Latina. Claro que
em algumas dessas situações, o feitiço terminou por virar contra o feiticeiro,
fazendo surgir uma infinidade de grupos terroristas, e o maior deles, que se
transformou em governo num território autodenominado “Califado”: o Estado
Islâmico, surgido dos escombros da Síria e do Iraque.
Evidentemente, seguindo-se a
estratégia já elaborada por Spykman, antes da segunda guerra mundial, não iria
demorar para que essas “revoluções democráticas” atingissem os governos latino
americanos naqueles países de maior importância estratégica, e onde,
logicamente, estivessem governantes de esquerda que fizeram seus países
distanciarem-se das políticas imperiais. E, pior, ousaram ajudar a criar
estruturas geopolíticas que seguramente afetariam a hegemonia da maior potência
do mundo.
A CRISE ATINGE O BRASIL: A FÚRIA E O
GOLPE!
O comportamento adotado externamente,
logicamente não daria certo se não contasse internamente com setores que lutam
pela tomada do poder. Além das ações de espionagem e de agentes infiltrados em
diversos setores, sejam ONG ou grandes corporações. Nenhuma novidade para quem
já conhece os mecanismos sórdidos de destruição de governos efetivados há muito
tempo. Portanto, identifica-se internamente os setores conservadores e os mais
radicalizados ideologicamente, sejam fascistas, direitistas ou liberais, além
de antigos esquerdistas convertidos às ideias reacionárias (e esses constituem-se
nas vozes mais tonitruantes e carregadas de ódios). Isso ressoa e se espalha
pela força de estratégias goelbesianas adotadas pela grande imprensa, atingindo
um alvo potencial: ex-eleitores da presidenta da República, inconformados com o
acirramento de uma crise econômica que afeta a maioria da população,
principalmente a classe média, essa mais adepta do consumismo exacerbado e do
sonho para ascender à elite.
Naturalmente a fragilidade do governo
é condição sine qua non para que ações golpistas alcancem sucesso. A crise
econômica, principalmente, o isolamento político e o distanciamento dos setores
populares, notadamente os mais organizados, afetaram significativamente a base
de apoio do governo nos últimos anos, abrindo caminho para que as pregações oposcionistas
contaminassem uma massa de descontentes. Esse mesmo governo subestimou a
capacidade de uma imprensa venal e reacionária perder todo e qualquer senso de
respeito às legalidades constitucionais, por todo esse tempo evitou criar uma
lei de controle da mídia. Tudo que se conquistou e possibilitou levar o Brasil
ao clube das principais potencias do mundo, se desvaneceu rapidamente,
substituído por uma sequência de más notícias adredemente repetidas à exaustão.
Era preciso isso para abrir o caminho à deposição de uma governante
legitimamente eleita.
Mas, se não há mais o poder dos
canhões a ajudar na implementação de um golpe de Estado, como fazer isso? Só o
desgaste do governo não basta, porquanto se esforçasse a direita para
explodi-lo. Era preciso encontrar algum mecanismo que abrisse uma brecha
constitucional, que pudesse ser aplicada de acordo com determinadas
conveniências e que pudesse. Buscou-se os argumentos de outrora, já utilizados
na luta ferrenha para derrubar governantes, como Getúlio Vargas e João Goulart,
e se tentara fazer também com Juscelino Kubitscheck. As acusações de corrupção
que supostamente corrói todo o governo.
Sabe-se, os mais esclarecidos, que a
estrutura do estado que existe para dar sentido a um contrato social, assim
definido por Thomas Hobbes em seu livro “Leviatã”, como sendo a condição
necessária para conter uma guerra de todos contra todos, traduz uma lógica
perversa que acompanha o sentido de existência do sistema capitalista. Embora
seus efeitos danosos, da absoluta falta de escrúpulos do uso privado da “res
pública” tivesse também atingido os países socialistas, levando ao surgimento
de uma burocracia que se corrompeu no processo de crise daqueles países. Ao
mesmo tempo em que a corrupção é permanente nessas estruturas do Estado, em
qualquer parte do mundo, com gradações diferentes, a aversão à essas práticas,
principalmente em momentos de crises levam a indigação às alturas e radicalizam
a oposição a essas práticas, absolutamente nocivas à sociedade porque corrói
recursos que são do Estado, portanto do povo. Mas, efetivamente, não há
ninguém, nem mesmo os mais recorrentes corruptos que seja contra essa maldita
praga.
Exatamente por isso, sempre que os
argumentos políticos não são suficientes para derrubar o prestígio de alguma
liderança com forte penetração entre os mais pobres, surge demoniacamente, a
derrubar certezas e convicções sobre o caráter de qualquer um, a acusação de se
enriquecer por meio da política, com uso de dinheiro público, pela via da
corrução. Agregue-se a isso a repetição ad
nauseam pelos meios de comunicação, e, mesmo se porventura nada seja
comprovado no final dessas investigações, isso passa em definitivo a compor a
biografia de quem esteja na mira, ou seja o alvo, dos seus desafetos. Por uso
da massificação, da popularização de uma denúncia vista como uma aberração pelo
povo, seja qualquer mentira, ela pode tornar-se uma verdade aos olhos de uma
opinião pública manipulada.
O “JUSTICEIRO”! MAS O QUE O MOVE?
Eis que surge então um “destemido”
juiz, do Paraná, implacável a caçar corruptos, na condição de herói e
justiceiro, exorbitando na função de magistrado, que não é de investigar, mas
de julgar, e com isenção. Bem, a história se conta de forma estranha. Esse
mesmo personagem já esteve por trás da investigação de um dos maiores
escândalos de emissão de divisas ao exterior e lavagem de dinheiro, no episódio
que gerou uma CPI até hoje envolta em mistérios: a CPI do Banestado.[i]
E, por estranha coincidência, a operação que leva o nome de Lava jato se
iniciou prendendo o mesmo doleiro envolvido nesse escândalo de corrupção,
sonegação e evasão de divisas da história brasileira, com valores mais de cinco
vezes superiores aos que envolvem o escândalo em torno da Petrobrás.
Mas, porque esse doleiro se livrou
daquelas investigações e de uma CPI que identificou dezenas de personalidades
políticas, empresariais e banqueiros envolvidos no esquema? Por que não se
chegou ao fim e se prendeu todos os envolvidos? São perguntas que não encontram
respostas num escândalo que aconteceu durante o governo FHC, e teve entre os
indiciados o presidente do Banco Central, Gustavo Franco, e entre os nomes
citados por envolvimento o atual senador José Serra, do PSDB o então senador Jorge Bornhausen, do PFL
(hoje DEM).[ii]
As investigações foram bloqueadas naquela oportunidade pelo Ministério Público.
Mas o delegado da Polícia Federal encarregado do processo foi arbitrariamente
afastado numa articulação feita para garantir o encerramento da operação e
livrar os suspeitos de serem investigados.[iii]
As chamadas CC5, contas pelas quais
as operações ilegais enviaram recursos ao exterior, via Banestado, movimentaram
cerca de 124 bilhões de dólares em dez anos (alguns falam em 150 bilhões).[iv]
Dando nome ao “boi”, o doleiro envolvido nesse mega esquema, comprovadamente,
mas que saiu ileso de tal forma que a acusação contra ele se perdeu no tempo
chama-se Alberto Youssef. O mesmo pelo qual se deu início à “Operação
Lavajato”. Uma estranha coincidência que, tendo-se livrado daquela operação, sabe-se
lá por que, vê-se envolvido novamente em um grande caso que guarda algumas
semelhanças, e se encontra de novo com o Juiz Moro, com o qual começa agora a
colaborar. Mas, desta feita, os setores envolvidos naquele grande esquema, e
que escaparam da punição, hoje encontram-se na condição de acusadores,
endeusando os que antes foram fracos para os levarem até as devidas punições.
O “destemido’ juiz Moro da Lavajato,
sucumbiu às articulações políticas para enterrar tudo que tinha sido
investigado pela Operação Macuco. Mas, estranhamente, e equivocadamente, o
Partido dos Trabalhadores cedeu às pressões, bem como o governo do próprio
presidente Lula, corroborando para que a CPI do Banestado, e toda investigação da
Operação Macuco, fosse enterrada. Talvez ali, ao vacilar em jogar duro e punir
grandes corruptos, tenha sido demonstrado uma fragilidade que encerraria as
possibilidades de livrar o país das verdadeiras saúvas que se alimentam da
riqueza do país e do povo brasileiro, e impediriam que personagens frágeis na
condução daquele processo, se apresentassem atualmente como heróis na luta
contra a corrupção.
No entanto, existem outras relações a
gerar interrogações sobre como a operação lava jato chegou ao ponto atual, com,
inegavelmente, uma investigação de proporções monumentais. Provavelmente, boa
parte das informações obtidas não sejam somente como consequência da prisão
daqueles que seriam delatores. Mas a prisão deles pode ter sido consequência de
uma série de escutas, que atingiu diversas autoridades e empresas brasileiras,
entre elas a própria presidenta Dilma Roussef e a Petrobrás. Coincidência ou
não, o juiz Sérgio Moro participou de um curso em 2007, a convite do
Departamento de Estado dos Estados Unidos, indicados para “potenciais líderes”.[v]
Em 2013, o ex-analista de informática
e técnico da CIA, Edward Snowden, denunciou para o mundo como a Agência
Nacional de Segurança (NSA, em inglês) obtinha informações estratégicas de
vários países, entre os quais o Brasil, através de um sofisticado sistema de vigilância
e de espionagem sobre setores importantes e que eram de interesse dos EUA.[vi]
Naturalmente, o Brasil sempre foi considerado importante estrategicamente, e
seguramente isso adquiriu uma relevância muito maior quando se descobriu nas
costas marítimas brasileiras uma das maiores reservas de petróleo do mundo, o
pré-sal.
As ferrenhas disputas sobre qual
método de exploração dessa riqueza será adotada, entre indas e vindas, já
demonstram que há algo muito poderoso em disputa, que envolve grandes
corporações e megainvestidores. Dentre eles a Chevron e o especulador
milionário Georges Soros, envolvido também no financiamento de ONGs usadas para
desestabilizar o governo ucraniano aliado da Rússia. Soa estranho saber que
Soros,[vii]
como todo megaespeculador sempre devidamente informado pelo controle de
informações seletivas, vendeu todas as ações que adquiriu da Petrobrás, em
2015, e na sequência se desfez também de ações da Embraer e da Tim. [viii]
Às vésperas de analisar um recuro da oposição, o ministro Gilmar Mendes, se reuniu com José Serra e Armínio Fraga (ex-assessor de Georges Soros) |
Como se percebe, já estava em curso
todo um trabalho de desestabilização do Brasil, e, essas informações
estratégicas, seguramente já davam conta de que poderosos interesses levariam a
situação brasileira ao limite do desgaste.[ix]
Mas, além de desestabilizar o governo, essas ações tinham outro alvo, focado mais
no futuro do que no presente: o ex-presidente Lula e seu forte carisma. A
possibilidade de ele vir a ser candidato nas próximas eleições elevou o
termômetro político ao limite da insensatez, gerando um vale-tudo que
desconsidera todo o desequilíbrio econômico comum em momentos de crises
políticas. Principalmente quando já existe internacionalmente uma crise
sistêmica de difícil solução e que afeta todo o sistema financeiro
internacional.
Mas, para além de tudo isso, a
conjuntura é moldada pela velha e conhecida luta de classes. O que se disputa é
quem controlará o Poder, já por tanto tempo, e inaceitavelmente na mão do
Partido dos Trabalhadores, com forte aliança com o Partido Comunista do Brasil,
e os tendões de Aquiles, expresso em frágeis apoios de parlamentares oportunistas
dispersos por outros partidos, que neste momento, abandonam o barco em busca de
outras alianças que satisfaçam seus interesses mesquinhos particularistas.
Estes flutuam entre um e outro governo em busca de cargos e proximidade com o
Poder.
O atual momento político é
absolutamente imprevisível. Uma guerra está aberta e o objetivo é destituir a
presidenta da República, e, principalmente, impedir que o ex-presidente Lula
venha a se constituir em um nome imbatível nas próximas eleições presidenciais.
Se isso não ocorrer, garantir a governabilidade será um desafio hercúleo, em
função dos interesses políticos em jogo. Seguramente entraríamos imediatamente
já no processo político visando as eleições de 2018, demarcando campos e
prosseguindo a tática de fustigamento de forma a impedir que o governo se
recupere.
Caso aconteça o impeachment o país
poderá atravessar um período mais turbulento ainda, com fortes mobilizações
populares e possível enfrentamentos de entidades e organizações que neste
momento se articulam para barrar o ímpeto golpista conservador. Não parece que
o resultado do golpe de estado institucional que se pretende aplicar tenha
paralelo com a inanição que acometeu as organizações de esquerda em 1964. O que
se espera, dado a radicalidade expostas nas ruas, é que haja forte reação,
tornando o ambiente político e social absolutamente indefinido quanto a uma
estabilidade institucional.
Outros elementos, no entanto, deixam
o quadro institucional brasileiro fraturado. O protagonismo político
apresentado pelo Ministério Público e pelo Judiciário, além da insistente
quebra de hierarquia de segmentos da Polícia Federal, fere de morte a
democracia brasileira e o Estado de Direito, essencial em um regime
republicano. Nitidamente, esses setores ressoam as vozes conservadoras e
demonstram não saberem distinguir suas origens de classes com um comportamento
isento que deve ser, sempre, condição sine
qua non para que não haja perseguições infundadas a quem não tem
condenações, nem para que se condene alguém simplesmente porque ele pode ser
ameaça aos interesses políticos conservadores.
Há de ser preciso nos próximos dias
muita firmeza por parte daqueles que defendem a legalidade constitucional. Não
se pode simplesmente aceitar, como normal, uma votação absolutamente de cartas
marcadas no Congresso Nacional, com parlamentares que compõe a comissão do
impeachment envolvidos em processos de corrupção, muitos apontados pela própria
Operação Lava Jato e sob investigação da Procuradoria da República. Além desse
processo estar sendo conduzido por um indivíduo, que se sustenta na Presidência
da Câmara por sucessivas manobras, e que, esse sim, já é réu por determinação
do Supremo Tribunal Federal. Mais bizarro ainda é o fato desse crápula ser um
dos mais próximos na linha sucessória, depois do vice-presidente, também citado
em deleções como envolvido na indicação de diretores envolvidos até o pescoço
na corrupção da Petrobrás.
É diante desse quadro bizarro, e de
um ódio e estupidez que se espalha na inconsequência do juiz que comanda a
Lavajato e de uma mídia que se assusta agora com o seu futuro e manipula
descaradamente a verdade dos fatos, que se torna imprevisível saber o que pode
acontecer nos próximos meses. Seguramente, tudo vai depender da força e
determinação dos movimentos sociais, de entidades e organizações que ajudaram
nas duas últimas décadas a mudar os rumos da história política brasileira. O desafio está posto, ou retrocedemos a um
passado que se imaginava enterrado nos escombros de tempos intolerantes e
ditatoriais, ou avançamos para um futuro que consolide as transformações
democráticas e assegure a continuidade da inclusão e justiça social para as
camadas pobres, e secularmente excluídas, da sociedade brasileira.
LEITURAS COMPLEMENTARES (artigos
escritos em 2015)
4. http://gramaticadomundo.blogspot.com.br/2015/07/o-brasil-diante-do-enigma-da-esfinge.html
[ii]
http://horia.com.br/noticia/o-que-diferencia-o-caso-banestado-da-operacao-lava-jato
[iii]
VALENTE, Rubens. Operação Banqueiro. São
Paulo: Geração Editorial, 2013. Pp. 119-139
[vii]
http://www.debatesculturais.com.br/george-soros-com-fhc-no-brasil-somente-drogas/
"Um governo ou governa sustentado por uma sólida base parlamentar ou assentado no poder social dos movimentos populares organizados.
ResponderExcluirNa Bolívia, Evo Morales Ayma buscou apoio na vasta rede de movimentos sociais, de onde ele veio como forte líder. Conseguiu, lutando contra os partidos. Depois de anos, construiu uma base de sustentação popular, de indígenas, de mulheres e de jovens a ponto de dar um rumo social ao Estado e lograr que mais da metade do Senado seja hoje composta por mulheres. Agora os principais partidos o apoiam e a Bolívia goza do maior crescimento econômico do Continente.
Lula abraçou a outra alternativa: optou pelo Parlamento no ilusório pressuposto de que seria o atalho mais curto para as reformas que pretendia. Assumiu o Presidencialismo de Coalizão. Líderes dos movimentos sociais foram chamados a ocupar cargos no governo, enfraquecendo, em parte, a força popular." etc. etc. é o artigo de Leonardo Boff
Meu caro: quando se erra na estratégia não há tática que dê conta!!! Na "Carta ao Brasileiros" ou carta aos banqueiros, a estratégia de conciliação está clara. E foi com ela que perdemos a maior chance de transformação na história recente brasileira. Pouco se avançou na reforma agrária, o Bolsa Família não apresenta porta de saída, nas palavras de Frei Betto. Junte-se a isso as vaidades dos Aloisios Mercadantes e Dilmas, com suas incapacidades de negociar (num governo de coalizão...) + o apostar tudo no pré-sal e esquecer as energia renováveis (ai a queda do preço do petróleo é fatal) + a falta de gestão competente. O quadro foi montado com ótimos ingredientes para o avanço da direita.
Recomendo a leitura do livro de José de Souza Martins "Do PT das Lutas Sociais ao PT do Poder" (editora Contexto), o 45º livro da carreira, o professor aposentado da USP e docente da Cátedra Simón Bolivar. Ele acompanhou de perto a formação do partido e a influência de protagonistas sociais - como Igreja, camponeses e intelectuais - na criação da sigla, no começo dos anos 1980. Ao separar os ingredientes da atual crise política - externos e internos ao PT -, ele identifica "partidos falidos" e pessoas "cheias e cansadas". "Estamos vivendo uma crise que é do Estado e da sociedade."
O momento exige mais análise e menos ideologia. Palavras de ordem de lá ou de cá pouco acrescentam para o Brasil sair desse imbróglio.
Meu caro professor Marco Antonio Sperb. Concordo em boa parte de sua argumentação, e já fiz essas críticas em outros artigos aqui publicados (os links estão no final deste artigo). Houve mais do que uma escolha, mas também uma ilusão, decerto Lula e o Partido dos Trabalhadores julgaram possível poder governar um Estado capitalista acima ou negando a existência da luta de classes. O Poder, é sempre o primeiro e último objetivo de quem está envolvido na política. Mas, é certo também que a esquerda não conseguiu fazer maioria no parlamento, pelo fato de a sociedade brasileira ser conservadora. E aí são muitas as explicações, desde a cultura colonialista que conforma os mais pobres a aceitação de uma realidade opressiva e exploradora, e para isso cai bem o papel das igrejas, principalmente as neopentescostais, bem como o absoluto desconhecimento do que signifique ideologia, e a forma como através dela se processa a manipulação midiática. Mas, tudo isso se potencializa com o poder que exercem os meios de comunicação, há anos o verdadeiro grupo de oposição aqui no Brasil, a ditar qual caminho deve seguir os parlamentares que compõem os partidos de fora do Poder.
ExcluirMas eu gostaria de corrigir uma informação em seu comentário. É verdade que o Pré-Sal tornou-se prioritário ao governo, e, penso que não poderia ser diferente. Afinal ainda é a maior fonte de energia do mundo, e pelo qual os países se enriquecem, embora estejam sujeitos à políticas rapaces das grandes corporações e seus países. Por ainda muito tempo o petróleo será a principal fonte energética. Mas, o Brasil foi o país que mais avançou no mundo em busca de fontes de energias alternativas, principalmente a eólica. Só que são notícias que não tem destaque, principalmente nos canais de TV e são fortuitas, para não elevar a moral do governo. Longe está, também, o tempo em que essas energias superarão o petróleo. Elas são muito caras, e quando se investem nela a OPEP e as corporações petrolíferas fazem o jogo do mercado capitalista, aumentam a produção de petróleo, para derrubar qualquer outro tipo de investimentos em novas fontes energéticas. É o jogo do capitalismo. Para ilustrar o que digo anexarei links para duas reportagens que toca nesse assunto. Obrigado pela participação no Blog. Abç.
http://www.ebc.com.br/noticias/economia/2015/05/brasil-e-um-dos-paises-que-mais-investem-em-energia-eolica-diz-associacao
http://exame.abril.com.br/economia/noticias/os-paises-que-mais-empregam-em-energia-renovavel
Prezado Prof. Romualdo, sou apenas um cidadão (com alguma instrução) que assiste aos fatos, estarrecido com as personagens e seus "papéis". De sua análise não há o quê corrigir, apenas ilustrar: vivemos a trilogia das sagas, e o capítulo atual é (o velho e "desconhecido" de muitos de nós): "O Império Contra-Ataca".
ExcluirPerdoe-me a pueril citação acima, mas estamos em guerra faz tempo, e creio que nossa "resistência" está acordando do "porre" inicial (da era Lula/Dilma) pois, perdemos uma batalha agora, mas a guerra continua!...
não sei se é do conhecimento de ambos, mas mister se faz a leitura de um belo projeto sobre os 20 anos de nossa economia (1995-2014) - límpido como água da fonte!!!: http://docplayer.com.br/220398-Vinte-anos-de-economia-brasileira-1995-2014-gerson-gomes-carlos-antonio-silva-da-cruz.html
esqueci de lembrar que o Brasil (dos BRIC) é o único sem MEGATONS!!! daí,...
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