“O
bom estrategista, para vencer uma batalha, faz antes muitos cálculos no seu
templo, pois sabe que eles são a chave que o conduzirá a vitória. É calculando
e analisando que o estrategista vence previamente a guerra na simulação feita
no templo. Portanto, fazer muitos cálculos conduz à vitória, e poucos, à
derrota”. (Sun Tzu)
A política é como uma guerra, já
diria outro teórico, estudioso da estratégia, ela é a continuidade dessa por
meios violentos. Lênin por muitas vezes repetia isso, dito por Carl Von
Clauszewitz. Quando entramos em um movimento trabalhista, principalmente uma
greve, mesmo que não seja contra um patrão-burguês, em nosso caso contra um
governo que dirige um estado-nação, devemos saber que entramos em uma guerra,
mas que nela exercitamos também a arte da política. Tanto pelo comando,
liderança que é exercida sobre os trabalhadores, bem como pelo embate que necessariamente
medirá forças. E dele sairá o resultado desse confronto.
Mas nenhum exército ou grupo
organizado pode jamais entrar em um confronto sem saber do seu poder de forças,
assim como das forças que possuem o inimigo. Para tal, é preciso estabelecer
não somente estratégias inteligentes, como também táticas coerentes com o
objetivo que se deseja alcançar. Conhecer o inimigo e a si mesmo, é condição
para evitar colocar a vitória em risco. Esse é mais um ensinamento de Sun Tsu, outro
estrategista que por séculos tem orientado aqueles que estudam a guerra, e
também os que desejam saber dos ensinamentos que possam orientar suas decisões
e escolhas no cotidiano de um tempo de permanentes desafios. Nos dias de hoje,
mais do que nunca, saber tomar as decisões baseadas em estratégias corretas é
condição sine qua non para obter
sucesso na busca por alcançar determinados objetivos.
Antes da assembleia que deflagrou a
greve na UFG escrevi um artigo para o meu blog que o qualifiquei como um
“desabafo”. Eu já participei de várias greves. Logo que entrei na universidade,
em meio à empolgação, aceitei ser representante de minha unidade no Conselho de
Representantes do Sindicato. Em seguida estourou uma greve da qual eu
participei ativamente, embora um novato na universidade. No ano seguinte
tornei-me vice-presidente e, logo depois, por forças das circunstâncias
virei presidente da ADUFG. O então presidente assumiu a tesouraria da Andes e
deslocou-se para Brasília. Foi quando aconteceu uma nova greve. Voltei mais uma
vez a ser presidente da Adufg de 2004 a 2006, em um momento em que divergimos
profundamente da Andes e consolidamos um rompimento que já vinha da diretoria
anterior.
Mas foi mesmo no final dos anos
1990 que fui inicializado em um ambiente de um sectarismo extremo, onde a
empolgação superava qualquer análise racional. Não me excluo, também fui
contaminado por esses comportamentos. Mas logo passei a estranhar a lógica do
movimento, pelo qual se criava um comando e a diretoria do sindicato,
legitimamente eleita, praticamente ficava à margem das decisões. O sindicato
servia apenas para bancar as despesas, que não eram poucas, e via suas receitas
esvaírem-se com atividades que nem sempre traziam resultados. O deslocamento de
“delegados” para Brasília e o pagamento de diárias e hotéis traziam gastos
exorbitantes. E o mais estranho, quem passava a dirigir os professores em greve
não eram os diretores eleitos, mas um comando de greve, escolhidos em
assembleias cujas participações eram bem menores do que o quantitativo daqueles
que davam o quórum para as eleições. O resultado dessa equação, esquisitamente
democrática, era que o comando passava a ser dirigido majoritariamente por
aqueles que não tinham conseguido sagrar-se vitoriosos nas disputas eleitorais.
E assim essa prática persistiu por
todas as demais greves acontecidas. Isso levava quase sempre a um embate, e alterava
a lógica do processo de escolha daqueles representantes que deviam dirigir o
movimento: a diretoria do sindicato. É claro que existe uma lógica nisso tudo,
na medida em que o “comando” é formado em assembleias radicalizadas, escolhe-se
para compô-lo aqueles com discursos mais radicais, quase sempre os mais
engajados no movimento e com vinculação com a Andes, sempre apontando greve até
os extremos. Isso possibilita que na composição do Comando Nacional da greve
seus membros sejam afinados com essas posições, contribuindo para emperrar
qualquer negociação, já que não se abre mão daquilo que se revindica
inicialmente. É uma estratégia, mas que já se demonstrou completamente nociva
para a categoria, e talvez seja a responsável, em larga medida, pelos fracassos
na definição de uma carreira mais coerente com nossa importância na estrutura
do Estado.
Mas, além dessa bizarrice
“democrática”, em que a diretoria do sindicato fica praticamente “destituída”
momentaneamente, o movimento transforma-se em uma verdadeira batalha política
pelo desgaste não somente do governo, mas também daqueles que porventura
discordem dos encaminhamentos dados pelo “comando”. A prática sempre foi
agressiva, de intimidação, de discursos duros contra os que se opõem aos
encaminhamentos, de manobras nas pautas das assembleias, e nos longos e
cansativos discursos que terminavam por esvaziar os plenários. E todos esses tem
uma única direção: a rigidez da pauta de reivindicações.
A “pauta” sempre funcionou como um
texto sagrado, um dogma, que não pode ser alterado. E a estratégia, sempre
equivocada, foi de garantir, independente das circunstâncias, ou das análises
das forças em disputas, a integralidade do que estava sendo apresentado. Os
governos (já que nos referimos a várias greves, com as mesmas práticas) é quem
deveriam ceder. Os que ousassem apresentar propostas alternativas seriam
considerados traidores, “pelegos” e aliados do “inimigo”.
Não somente neste caso, como em
outros, já que foram várias as greves nas duas últimas décadas, os erros foram
sendo repetidos e os comportamentos sectários, de absoluta inflexibilidade nas
pautas iniciais das reivindicações, levaram, quase sempre, a um final frustrado
desses movimentos. Embora com os representantes dos governos cedendo – mesmo que
não a contento do que nós sempre desejamos – esses “comandos” insistiam em
manter a defesa de uma pauta enrijecida. Quando o tempo se esvai, e o governo
retrai em sua posição e aproxima-se o prazo final para definir a Lei de
Diretrizes Orçamentárias, o “comando” (leia-se a Andes) resolve apresentar alterações
na pauta, mas ainda sem considerar os impactos que isso possa causar
financeiramente. Sempre são contrapropostas que pouco mudam em relação ao que
se propunha no início do movimento. Desejável por todos nós, mas impraticável
já que qualquer governo leva sempre em conta os impactos que esses aumentos
causam.
Para piorar, no que eu sempre
publicamente questionei, a Andes insiste em preparar suas greves organizando o
movimento de forma ampla, unindo as nossas reivindicações às de uma genérica categoria
de servidores públicos. O objetivo é nitidamente provocar um desgaste político
ao governo e ampliar seu grau de influência política, unindo a objetivos
ideológicos maiores, nos quais não desejo aqui entrar, já que isso não é
exclusividade da Andes. O problema é que, isso feito às custas de uma grande
expectativa da categoria quanto a resultados concretos em sua carreira,
constitui-se em uma perversa manobra política.
É um erro de estratégia monumental,
entrarmos em uma greve conjuntamente com as demais categorias do serviço
público, tendo como principal bandeira a correção de distorções em nossa
carreira.
Será sempre difícil atingir resultados
desejáveis quando dezenas de outras categorias lutam ao mesmo tempo por
reajustes salariais. Todas as demais carreiras que corrigiram suas distorções o
fizeram de forma isolada. Mas lamentavelmente a Andes se recusa a prosseguir as
discussões e se opõe sistematicamente a manutenção de uma mesa de negociação,
quando isso é exatamente o caminho correto a ser tomado. Tanto que uma das
últimas de nossas conquistas, um novo degrau em nossa carreira, a de Professor
Associado, foi conquistado em uma mesa de negociação, sem ter sido necessário
deflagrar greve para isso.
Jamais devemos entrar em um
movimento sem calcular os impactos que serão causados por aquilo que desejamos
na luta. Devemos ter o pleno conhecimento de até onde podemos ir em nossas
reivindicações. Não somente pelo que desejamos, mas também pelo que é possível
ser aceitável. Em se tratando de uma circunstância marcada pelo fato de
existirem dezenas de outras carreiras também reivindicando reajustes, devemos
ter clareza de que há limites para qualquer governo aceitar percentuais que
criem impactos muito elevados em suas contas. Esse é o erro ao sempre
insistirmos na greve geral, se o nosso objetivo maior não é o reajuste, mas a
correção em nossa carreira.
Mas que seja feita a ressalva, de
que pelo quadro criado, os percentuais que foram acordados – embora recusado
pela Andes e a maioria das assembleias dos professores – em alguns casos
ultrapassa o dobro do que foi oferecido a outras categorias. E que se diga
também que isso já vem sendo discutido há mais de um ano, embora no estilo
paquidérmico de um governo leniente, fortemente preocupado em dar resposta a
uma crise econômica que tem como origem uma forte inversão nos investimentos.
Por isso as pressões são necessárias, mas devem primar pela coerência,
objetividade e capacidade de compreender cada momento, e os limites que possam
estar sendo impostos nas negociações em curso. Até para que, ao final, quando
os resultados forem apresentados, não fique a frustração de que nada foi
conseguido e a luta teria sido em vão.
Na forma como o movimento foi
conduzido, por um “comando” avesso à negociação, e a ceder em suas pretensões
iniciais, levou inevitavelmente a greve para um beco sem saída. Esgotou-se sua
capacidade de apresentar justificativas para a continuidade. Só não é
concebível que a alternativa seja esquivar-se de por fim ao movimento, nem
iludir os professores com propostas alternativas, que já não fazem mais
sentido, porque perdeu-se o “timming” no processo de negociação. Como fazer
numa situação como essa? Radicalizar no discurso e culpar o “inimigo” interno
pelo fracasso de sua estratégia, pois não se sabe como encerrar a greve. Talvez
a aposta desesperada seja que uma maioria aprove a proposta de retorno, muito
embora esse mesmo “comando” insista em continuar a “luta”. Com isso, desfeito o
“comando”, responsabiliza-se os “conciliadores”, por um fracasso que foi criado
por sua impertinência e sectarismo político.
Tenho me espantado com algumas
discussões postadas nas redes sociais, e em alguns momentos fico preocupado com
a agressividade e o estilo fascista de alguns comportamentos intolerantes. Um
total desrespeito às opiniões divergentes de forma absolutamente desrespeitosa.
O Facebook parece um divã de psicanalista, onde todas as vozes surdas se fazem
ouvir, mas com um grau de intolerancia impressionante. E as diatribes são constantes.
Aberrações e ofensas são ditas demonstrando uma tendência perigosa que vem
sendo construída, inclusive dentro da universidade. Lamentavelmente, isso não
ficou somente restrito ao mundo virtual, e em muitas situações descambou para
agressividade explícita.
O que se espera, de um ambiente que
deve se pautar pela capacidade de conviver com opiniões diversas e antagônicas é
o respeito e a tolerância. Pois se isso não ocorre nos limites de uma
universidade pode-se esperar que a sociedade venha a entrar em um novo ciclo de
fascistização de imposições pelo argumento da força, e não, como deve ser na
academia, pela força dos argumentos.
Professores decidiram pela continuidade da greve e rejeitam acordo em 14/08/2012 |
É impraticável a continuidade da
greve. A conjuntura impõe que aceitemos a proposta apresentada, nitidamente
mais abrangente do que foi oferecido pelo governo às demais categorias. Não há
mais prazo para prosseguirmos em um movimento que já se esgotou no tempo que
lhe era permitido para que as negociações fossem feitas. Isso não significa a
aceitação do acordo como aquilo que queremos em definitivo para nossa carreira.
Mas concebendo o fato de que podem seguir adiante as discussões, em uma mesa
permanente de negociação sobre nossa carreira, como proposto no acordo e aceito
pelo governo.
Mas que no final do movimento não se
repitam as tensões de alguns desses momentos agressivos e intolerantes. Nem que
manobras na pauta final de nossa assembleia sejam postas com o intuito de
artificializar uma situação e de tumultuar um processo que, pelo ambiente
político, já não tem mais para onde prosseguir. Já não há muito mais o que
fazer. O que deve ser discutido, ao final, nessa que esperamos seja a última assembleia
desse movimento, é a aceitação ou não do acordo que está proposto e o
encerramento da greve com a retomada do calendário acadêmico.
E que saibamos sair dessa luta com
a clara percepção de que o que conseguimos não foi o ideal, mas o real, e que o
que nos foi oferecido supera claramente o que as demais categorias receberam. E
a luta? A luta continua, racionalmente, utilizando-se de estratégias inteligentes,
de negociação com o governo, mas de articulação política com parlamentares que
possam assumir a bandeira do resgate de uma carreira tal como imaginamos como
sendo a ideal. A nós, professores universitários, não está posto somente a
greve como forma de luta. Só precisamos adotar estratégias inteligentes, que
possam nos conduzir para vitórias mais consistentes, sem tantos desgastes como
vivemos nos últimos meses. E que saibamos reconhecer as transformações pelas
quais as universidades passaram nos últimos tempos. E a nossa em particular. Talvez
os mais novos não reconheçam isso, por não terem vivido esses vários momentos,
mas aqueles que estão aqui há mais de dez anos jamais poderão negar o salto que
tivemos. E, por mais que consideremos que temos crescido com muitos problemas a
serem corrigidos (o que é normal, já que é uma crise decorrente da expansão), não
podemos negar que as melhorias em nossas estruturas foram consideráveis.
Sermos pessimistas nesse momento só
nos impede de agir como se espera de educadores, com a plena necessidade de
incentivarmos nossos alunos a serem justos em seus julgamentos e a jamais
desconhecerem, porque é história, que já vivemos piores momentos em nossa
instituição. Alguns devem sair da caverna, ao invés de insistir em um olhar
aprisionado a ela, e de dentro dela.
Além do mais a universidade não
pode conviver com um clima onde as opiniões não devem ser expostas, porque se
teme comportamentos agressivos e intolerantes. Isso não corresponde a um centro
de conhecimento, mas a um quartel, onde se policia os comportamentos que
conflitem os interesses do comando.
“O comandante
sábio deve considerar a combinação de ganho e perda,
deve ter
discernimento das reais vantagens em situações difíceis e confiar nos seus
esforços.
Se for capaz de
perceber as vantagens prováveis, as dificuldades serão resolvidas.”
SUN TSU
Muito bom, parabéns pelo artigo.
ResponderExcluirMais uma vez o prezado colega Prof. Romualdo expõe seus pensamentos de forma clara e alentadora. Sou testemunha de que o presente artigo retrata, muitíssimo bem, os fatos e parabenizo o prezado colega pelo mesmo.
ResponderExcluirO texto do Prof. Romualdo Pessoa é m diagnóstico da nossa situação atual em relação à essa greve que muitos não querem ter fim. Quando o autor fala do "timming" que os andesinos e sinasefianos perderam ao apresentarem propostas me faz lembrar da assembleia que tivemos em nosso Campus do IFF em Itaperuna na semana passada em que se falou de "aditamentos" e "aditivos" nas propostas para dar fôlego a esse "movimento". Sábias palavras como foi sábio Sun Tzu.
ResponderExcluirA partir de sexta-feira, 31 de agosto, não estará mais nas costas do governo federal o ônus de negociar com os sindicatos os reajustes salariais dos servidores. A bola passará para o Congresso Nacional, que tem uma bancada de peso eleita por diversas categorias do funcionalismo, principalmente entre os integrantes do PT, partido da presidente Dilma Rousseff. Os parlamentares avaliarão a proposta do Projeto de Lei Orçamentária Anual de 2013 (Ploa 2013), que deverá ser enviada pelo Executivo no último dia deste mês. O texto modificado e aprovado pelos deputados e senadores será encaminhado para a sanção da presidente da República.
ResponderExcluirO Ministério do Planejamento vem barrando nas negociações pedidos de aumento, sob a alegação de que em tempos de crise o governo não poderá ultrapassar 15,8% divididos em três anos — praticamente a inflação esperada. Algumas categorias têm reivindicação de reajuste que chega a 151%. Se o Congresso decidir ir além do que o governo colocou no Ploa, terá que indicar também a fonte para fazer frente aos novos gastos. Atender todos os pedidos de reajuste do funcionalismo implica desembolso de aproximadamente R$ 90 bilhões, a metade da folha anual hoje.
FONTE: http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/economia/2012/08/27/internas_economia,319206/a-partir-do-dia-31-negociacoes-por-reajuste-serao-feitas-pelo-congresso.shtml
O prof. Romualdo, com conhecimento de causa, descreve muito bem o momento que vivemos na UFG e em outras IFES ainda paralisadas. Ele mostra com argumentos que o foco do movimento não é a carreira docente, mas sim o embate político-partidário. Tenho me perguntado a todo instante: os nossos dirigentes não vão tomar posição???!!!
ResponderExcluirAntônio Baleeiro - Engenharia Elétrica/UFG.
tÁ CERTO rOMUALDO, VAMOS NA ASSEMBLEIA FAZER VALER A VONTADE DA MAIORIA DOS PROFESSORES.
ResponderExcluirLembro que a greve de 2001, contra o PID (plano de incentivo a docência) depois de 100 dias de greve teve uma grande" vitória: mudou o nome para GED (gratificação de estímulo a docência.
Realmente, o professor Romualdo tem toda a razão. Eu mesma me senti oprimida na penúltima reunião, onde uma certa professora pediu para filmar a mim e a outros professores amigos por votarmos contra a continuidade da greve.
ResponderExcluirEm um local onde deveria-se respeitar a opinião alheia, ouvimos vaias e xingamentos. Isso é um absurdo!
Ótimo texto. Coerente e sensato.
ResponderExcluirGeógrafo e Analista da Receita Federal do Brasil Leandro Vecci