sábado, 23 de julho de 2011

AMY WINEHOUSE - DIÁLOGOS A RESPEITO DE UMA MORTE ANUNCIADA

Amy, como gostaríamos de vê-la
Em janeiro, quando Amy esteve no Brasil para se apresentar em Florianópolis e no Rio de Janeiro, o produtor cultural Rafael Blat escreveu um artigo sobre ela. Como temos uma afinidade entre um grupo de profissionais dessa área que freqüentaram o curso de Produção e Gestão de Projetos Culturais, no Instituto de Estudos Sócioambientais da Universidade Federal de Goiás (IESA/UFG) pudemos ler esse artigo e a partir disso trocamos uma série de emails falando da capacidade inata presente nessa belíssima cantora, de uma voz raríssima de se ouvir, que eu comparo a de Ella Fitzgerald, mas também de sua incapacidade em resistir ao domínio que a droga e o álcool exerciam sobre os seus gestos.
Como o Rafael afirma em seu artigo (cito apenas parte dele), a estranha coincidência de sua idade com a de tantos outros ícones da música mundial que sucumbiram à overdose e morreram prematuramente, foi o fato que mais comentamos. A partir disso o diálogo se dividiu entre as razões que motivam essas pessoas a enveredarem por um caminho que inevitavelmente encurtará a sua vida, e o inusitado que está presente nesses comportamentos, que são variados, diferentes e não obedecem á lógica que imaginamos haver diante da necessidade de se preservar a vida.
Um número cabalístico(?), 27, e uma morbidez aparentemente inerente ao ser humano em se deleitar com a decadência de um ídolo, como se vêem atraídos pelas desgraças e não perdem tempo em observá-las, representam interrogações que certamente motivam muitos psicanalistas a tentarem entender as atitudes do ser humano. Alguns dizem que em certos casos, de atração por esses comportamentos bizarros, presentes em muitos shows de rocks, representaria uma espécie de transferência psíquica por situações que determinada pessoa gostaria de fazer mas não teria coragem. Significaria uma transferência de imagens e gestos a sufocar situações peculiares, particulares, explosivas, decorrentes de condições de vida depressivas. Ou a necessidade de fuga de alguma realidade aflitiva, para a qual essas pessoas não encontram saídas.
No complemento disso, embora em casos extremos e bem reduzidos, a loucura por essa atração, quando não se vê a perspectiva da autoimolação, aquele fervoroso fã se julga no direito de completar sua obsessão, e parte para assassinar o ídolo no qual ele tanto se espelha e o fascina. John Lennon é um exemplo disso, mas não o único.
Por representar uma espécie de “crônica de uma morte anunciada”, para pegar emprestado o título de um livro do brilhante Gabriel Garcia Marquez, esse diálogo que travei com esses novos amigos que conquistei ao longo do curso ao qual me referi anteriormente, resolvi transformar nesse post para o Gramática do Mundo. Como não tive autorização de inserir os nomes dessas pessoas com quem dialoguei preferi não citá-los. Mas tomei a liberdade de usar suas frases porque elas nos ajudam a refletir sobre esse enigma chamado Amy Winehouse, bem como sobre os limites que a sensação de liberdade produz com o uso das drogas.
Certamente, tanto quanto Michael Jackson, que viveu seus últimos anos tendo que responder a diversas acusações e depois que morreu foi transformado em mercadoria por uma mídia sequiosa por lucrar com esses tipos de comportamentos, Amy também se transformará em uma mina de ouro. Em breve, quem sabe, o copo que ela usou para beber seu último gole, será leiloado por milhares de dólares. A morte, nesse mundo asqueroso e bizarro da construção de celebridades, se constitui, tanto quanto a capacidade dessas pessoas de nos impressionar com suas musicalidades, em um importante momento para se lucrar. Lucra-se, portanto, à custa da destruição de uma vida encurtada muito pela maneira como essa própria mídia trata esses ídolos. A mídia não os matam, naturalmente, mas suas mortes se constituem em ferrenhas disputas por seus espólios mercadológicos. E muitas vezes os conduzem em sua direção.
A seguir, o diálogo, sem praticamente nenhuma alteração, a não ser a retirada de alguma palavra ou frase fora do contexto. As minhas intervenções estão grifadas. Foi um diálogo entre amigos, que conquistei na coordenação do curso, e pelos quais tenho muito respeito. São questionamentos, não respostas. Dúvidas, não certezas. Indagações sobre o sentido da vida, da felicidade, da necessidade de ser livre num mundo que não nos permite mais ter liberdades. A data desse papo bem profundo foi janeiro deste ano.

Amy Winehouse
A cadência de uma estrela
Rafael Ribeiro Blat (janeiro, 2011)

“Amy Jade Winehouse nasceu a 14 de setembro de 1983 em Southgate,  no norte da grande Londres.Possui um história de vida bastante humilde,  comovente e trágica. Ora permeado em escândalos com álcool e drogas ou conquistas até o topo de popstar. Aos 27 anos de Amy ressaltamos um pequeno paralelo entre os geniais cantores : Jimi Hendrix, Jim Morrison, Kurt Coubain e Janis Joplin. O que ambos teriam em comum com Winehouse? Eles possuíam a atual idade da cantora quando faleceram. O que nos preocupa é uma pergunta que não quer calar? Será que Amy está tentando se recuperar, ou seria ou estratégia de marketing para reegué-la? Isso não importa, o que vale é que Amy não se compara nem com Madona, nem Britney, nem shakira ou outras grandes popstars. Amy é original, continua poderosa, seu som é envolvente, sua banda é impecável e sua performance vale a pena ser conferida. Seu Soul, seu R&B é genial”.
(...)
“Belo texto, Rafael!
...viva o mundo e sua confusa e imprevisível maneira de fazer brotar talentos e, nas suas histórias nunca encontradas em receitas, fazer explodir arte em todos os sentidos! Charles Chaplin, Grande Otelo, Jim Morrison, John Lennon, Amy...
a arte é uma megaforça irrefreável, que surge muitas vezes irrompendo tudo: cabeças, cidades, corpos, estrelas”.
Jimi Hendrix
(...)
Bom texto, Rafael.
De fato a Amy tem uma voz espetacular e de uma soniridade belíssima. Mas, infelizmente segue o mesmo destino de tantos outros personagens parecidos. Mas, diferente daqueles outros, mas tanto quanto Michael Jackson, ela vive vegetativamente em uma época que não é a cadência dela enquanto estrela que vira notícia, mas a decadência enquanto gente, consumida pelas drogas. Suas imagens estonteante, no pior sentido que podemos dar a essa palavra é disputadíssima pelos tablóides ávidos por venderem as desgraças das "celebridades". Uma pena que siga o caminho de Janis Joplin (que morreu de overdose com 27 anos), embora com semelhante competência. Infelizmente a Amy não conseguirá livrar-se do crack e outras drogas que ela consome, incluindo o álcool, para deleite desses carcarás midiáticos.

O comentário do (...) é muito bom, mas eu finalizaria dizendo "...fazendo-se explodir em drogas, sem nenhum sentido."
(...)

 “Amado mestre, a arte, musa insensível e devoradora, não importa com os seus receptáculos...
para ela, o que importa, é o SEU sentido...”
(...)

Eu sempre lamento uma vida desperdiçada. Quando pensamos que tantos lutam para viver possuindo tão pouco para isso e observamos outros que tendo tanto dão tão pouco valor à vida, é lamentável. Claro, muito embora isso não seja necessariamente uma escolha, mas uma condição de sua vida.
Mesmo assim é uma pena, principalmente quando tal pessoa pode tanto nos animar, e nos fazer feliz com aquilo que alguns denominam de "dom" recebido. Afinal a música é essencial para nossos "espíritos", principalmente quando apresentada com tanta competência.
Para mim é SEM sentido.
(...)

“Amado mestre, há muito mais coisas entre o céu e a terra do que supõe nossa vã filosofia (ditado novinho...)
Eu penso que não há como entendermos a força que determinadas almas têm embutidas nas suas passagens por aqui...
Olha só o jim morrison... será que se ele se 'comportasse' e 'tivesse dado sentido' (e o que é o que teria realmente sentido para ele e para cada um de nós?) ele teria feito o que fez? acho difícil...  e assim temos inúmeros outros exemplos como a própria Janis Joplin, o Kurt Kobain... e agora a Amy... de certa forma essa conduta deve ter sentido para eles, e para muitos não, acredito.
Será que se houvesse psicólogos e rivotril, prosac e outros, na antiguidade teríamos tantos gênios como Beethoven, Mozart, Vivaldi, Tchaikovsky?”
Janis Joplin
(...)
... esses viveram ainda uma época em que a loucura era bela. Morria-se de amor, aliás. Hoje, inversamente, mata-se por paixão. E morre-se inutilmente. As drogas, essas que você cita, inclusive, são a perversão da modernidade, da perda gradativa dos sentidos, da sensibilidade. Não há sensibilidade em Amy pelo que ela faz. A sensibilidade está naqueles que ainda tem essa capacidade de sentir prazer e gostar, como nós que discutimos aqui, embora com enfoque diferente, mas dentro de um mesmo objetivo que é exaltar a música e a voz dela. As drogas tiram de cada um essa capacidade.
Imagino sim, Janis Joplin com a idade de uma Elza Soares, que com toda sua excentricidade permanece aí encantando com sua voz sexagenária.
Não posso pensar por eles, mas pela minha maneira de ver o mundo, as coisas, as pessoas. Talvez eu seja "conservador", mas o país no qual muitos se miraram tanto hoje é o símbolo da decadência, em todos os sentidos, e por razões que não fazem sentido.
Prezo a vida, acima de tudo, e apesar de um velho militante comunista (o que sempre dava impressão de amargura aos que lutavam e combatiam com idéias revolucionárias), admiro aquela que é uma das maiores vozes da música mundial e tem uma das músicas mais belas que conheço:
 "Que mundo maravilhoso"... http://www.youtube.com/watch?v=8y3_kH9nYcA - Louis Armstrong
Devemos, então, viver a vida e esse mundo maravilhoso em sua plenitude, porque o mundo é maravilhoso (nós é que complicamos).
(...)

Quem pode dizer que a vida do outro é sem sentido? Se ela olhar pra nossa vida, quem disse que ela não dirá que a nossa vida é que é sem sentido? Agora, pode se ter a opinião própria de que é sem sentido, mas afirmar não podemos fazer isso.”
Kurt Cobain

(...)
Você já observou como a Amy vive, anda, olha, fala...? Ela nem tem mais condições de dizer o que é ter sentido. Eu vi um vídeo de um show dela no youtube em que  quando ela escorrega várias pessoas que assistiam (e são fãs) caem na gargalhada. Ela se tornou um espetáculo pelo ridiculo de algumas cenas em que está completamente fora de si. Vejo isso constrangido. Concordo, é o meu olhar. Mas não compreendo  como se pode encontrar algum sentido nisso. Nem consigo imaginar como ela pode encontrar algum sentido nesse comportamento bizarro.
Tá bom, Zé do Caixão tem um comportamento bizarro. É um ícone do cinema brasileiro, dito por quem entende, não por mim. Mas o que ele faz tem sentido naquilo que apresenta. A Amy, não. Ela simplesmente se destrói lentamente.
Olhe, estou gostando desse papo nosso, não sei se os demais estão. Tá sendo legal porque estou refletindo algumas coisas e me motivando a escrever no blog. Vamos ver o que vai sair.
(...)

“Respeito vossa explanação, amado mestre. Mas penso que tal assunto nos foge. O artista é movido por forças muito mais estranhas do que uma certa 'correção' na conduta e modo de viver...
Nunca vi e nunca usei nada além do cigarro (já parei tb) e álcool (última vez q tomei umas foi na morte do Jacko), portanto não faço apologia nenhuma às drogas. porém elas foram pontos destacados em inúmeras obras-primas... fazer o quê? é muito difícil tentar entender isso...”
(...)

É, talvez seja essa a questão. "o que leva artistas como Amy, Janis Joplin, Cássia Eller, Elis Regina... e tantos muitos outros, seguirem esse caminho?". E são brilhantes no que fazem. This is the question!
E aí, de fato você tem razão, nos foge à razão e está fora do nosso alcance. Mas podemos refletir e tentar encontrar algum sentido na vida.
Me lembrei de "Sociedade dos Poetas Mortos".
Carpe Diem!
(...)

Jim Morrison
“Complicado, Romualdo... Jim Morrison certa vez se meteu a cantar no show dos Jefferson Airplanes, que abririam o show pro Doors na Holanda, porém tava tão chapado que desmaiou no palco e não conseguiu cantar no próprio show! Sabe quem levou os vocais (e bem!)? O Manzarek! Jim teve que ir pro hospital... Esse era Jim Morrison, que morreu com 27 anos, mas os médicos disseram que 'por dentro' do corpo ele tinha uns 80...
Quanto aos fãs, esses são, na maioria uns sanguessugas.  Roger Waters do PinkFloyd criou um muro para separá-lo dos 'fãs'. Na embaixada americana em Washington os Beatles foram tratados como animais de estimação, inclusive com Ringo tendo o cabelo cortado por um filhinho-de-papai. Lennon mandou todos irem tnc e se mandou da 'festa'. E quem matou Lennon? Um 'fã'...
Mas, será que Amy, se não fizesse o que faz, seguiria na carreira?  Não sei... Até que ponto também não há um certo marketing nisso?
(...)

27?! será esse um número cabalístico? Janis, Jim Morrison... Amy também tem 27. Contudo isso, já que não sou cabalístico, longa vida a Amy e sua voz maravilhosa.
(...)

“Show de bola esse relato Rafael.... eu acho que ela morre esse ano, brincadeirinha....mas imaginem seria enigmático, até o Romualdo deixaria seu ceticismo de lado e passaria acreditar nas sicronicidades  da vida.”
(...)

Acho que nesse caso podemos falar em diacronias. Se aplica mais ao que estamos abordando. Mas não sou cético quanto ao destino da humanidade. Haveremos de encontrar uma saída...

2 comentários:

  1. com licença mais vou postar esse texto no meu blog também para divulgar esse pensamento. concordo com tudo que foi escrito aqui.

    Link da postagem
    http://estudandodireitonet.blogspot.com/2011/07/morre-amy-winehouse.html

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  2. Professor, infelizmente as drogas derrotou mais um. Mas, o que me deixa chateada as vezes é a repetição desenfreada da mídia em relatar os fatos que aconteceram com Amy e com outros famosos. Realmente foi lastimável a morte de Amy, no entanto, ela não foi a única entre os famosos e também não será a última, penso que esse círculo numca se fechará e que as drogas continuará a afetar grande parte da população, uma vez que, não são apenas os famosos que sofrem desse mal.

    Eu achei interessante quando você relatou no blog dzendo que, possivelmente os pertences de Amy serão leiloados por uma fortuna. Certo dia eu li algo a respeito disso, e no texto dizia que a mídia aproveitava-se até da morte para fazer com que a população consumisse e é realmente isso que acontece, quando Amy morreu praticamnete acabaram os estoques de CD da cantora. Enfim, o discurso sobre drogas, mídia, consumismo não tem fim.

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