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O livro Fahrenheit
451, de autoria do escritor estadunidense Ray Bradbury, transformado em
filme em 1966 pelas mãos do competente diretor François Truffaut, aborda o que
seria uma sociedade distópica, onde a função de um dos principais personagens,
um bombeiro, seria queimar livros, numa absurda inversão da lógica para sua
existência. O contexto seria no período da guerra fria, e a intensa censura que
se espalhava naquele momento, mas visto também como uma crítica mordaz ao
fascismo e ao nazismo, e à perseguição à intelectuais, homens e mulheres que
usavam da literatura para se opor às autocracias reinantes, às ditaduras, mas
também àqueles modelos de democracia que buscavam por outros meios impedir que
determinada opinião se disseminasse pela população, elevando os “riscos” de
revoltas populares. Como naquele momento afetava os Estados Unidos.
Mas esse artigo,
ou essas palavras que uso para abominar essa prática, que se mantém de forma
despudorada mesmo nos dias de hoje, sob argumentos tacanhos de “agressão à
moral e aos bons costumes”, por meio de hipócritas que escondem suas feições
fascistas, não é uma resenha literária ou cinegráfica. O que tento aqui é
destilar minha indignação, e dessa forma atrair e alertar um número maior de
pessoas, contra as práticas hediondas, pérfidas e fascistas, que se mantém em
curso, apesar de em parte derrotada nas últimas eleições.
Não bastasse a
estúpida e idiota ideia de emplacar uma medíocre tese de “escola sem partido”,
muitos oportunistas, alguns dos quais obtiveram apoio de uma massa descerebrada
e alienada, conseguiram se eleger, pois descobriram que a estupidez, e as falas
toscas, geram “likes” em uma sociedade transformada pelo medo e pela alienação
política e religiosa.
E não é somente
esses elementos que motivam a ação desses maus-elementos. Com perdão da
redundância. Mas se descobriu nos últimos anos, que a apoteose do ódio,
germinada pela desconstrução da democracia desde o impeachment golpista da
ex-presidenta Dilma Rousseff, e florescida em meio a espinhos durante quatro
terríveis anos de um governo liderado por um bronco desqualificado,
potencializa também alguns indivíduos à condição de “mito”, ou nas brechas da
democracia os transformam em parlamentares.
Essa forma de
direcionar os olhares na política, e as ações parlamentares ou governistas, não
foca no bem-estar das pessoas, ou da sociedade. Mas é uma postura perversa, que
visa por meio do ódio impedir que as pessoas possam raciocinar por meio da
liberdade de discussão e da boa prática política, ou até mesmo que possam
adquirir capacidade crítica, com liberdade de escolhas sobre o que lê, vê e
assiste, e, claro, como se comportar em suas individualidades e desejos.
São atitudes
mesquinhas, visando se projetarem às custas de valores adquiridos
culturalmente, por meio das religiões, mas que se perdem no tempo e não
acompanham as transformações que acontecem de gerações em gerações, embora,
paradoxalmente, retornem de tempos em tempos e se radicalizem.
Dessa forma
procuram encilhar as pessoas, a partir de suas imagens vistas nos espelhos
deformados que expressam mais do que a visão apresenta, como também aquilo que
seus diminutos cérebros de parcos neurônios identificam como “perigoso”, dentro
do que classificam “modelos” de sociedades, puras, puritanas, mas que não
subsistem a uma criteriosa análise de seus padrões e comportamentos, escondidos
nos escombros de uma moral hipócrita e malfazeja. Seus subterrâneos são podres,
por onde transitam marginais engravatados, e representam o que de pior existe
em um mundo desigual, de enormes concentração de riqueza nas mãos de poucos,
que se curvam religiosamente ao prazer de suas fortunas, manchadas com o sangue
de corpos inertes, frágeis, miseráveis, consumidos pelas dores vividas em um
mundo real que esses apóstatas pretendem esconder. Ou culpar essas pessoas por
suas desgraças. Isso sim, é abominável de se ver, mas que esses trânsfugas
desejam esconder, ou apresentar como “desígnios divinos”.
Imagem: Omelete |
Impedir que os
livros possam ser consumidos por quem desejar é uma prática nazifascista,
inaceitável, absurdamente recorrente por uma atitude canalha oportunista, para
além da interpretação ideológica, porque visa angariar seguidores desavisados,
ou completamente ensandecidos pelos discursos de ódio, lamentavelmente nos
últimos anos destilados também por diversos púlpitos e altares, de onde antigamente
se viam partir vozes de tolerância e empatia.
Pode-se dizer, em
seu favor despudorado, que esses indivíduos usam da liberdade para se
manifestarem. Mas pode uma sociedade sobreviver a práticas corriqueiras de
discursos que alimentam a intolerância e o desrespeito à própria liberdade das
pessoas? Onde se encontra o limite, a linha mesmo que tênue que diga haver um
ponto em que tais práticas devam ser abolidas, porque apostam, por meio de
mentiras, tergiversações e falsas alegações morais, e impedem que as pessoas
possam ser respeitadas em suas diferenças? É preciso que por meio dos mecanismos
da democracia, do Estado de direito, se possa fechar as brechas que esses
indivíduos encontram, em proliferar por meio de suas atitudes torpes, ações de
linchamentos físicos e morais, que prejudicam determinados segmentos sociais, e
até mesmo impõe riscos às vidas de pessoas pelo simples fato de fazer escolhas
de vida que lhes convêm.
Por fim, vou
direto ao ponto. Visto que isso que escrevo se refere a diversos atos e práticas
ocorridas no Brasil, mas não só por aqui, nos últimos anos. Preciso dizer que
o mote para este artigo partiu da minha indignação por saber que uma
Universidade no interior do Estado de Goiás, na cidade de Rio Verde, se quedou
para um comentário fascista, de um desses indivíduos, propagadores do ódio como
forma de se manter ativamente nas redes sociais, e conseguir por meios desses objetivos
pérfidos, angariar simpatias reacionárias e se projetar como parlamentar. Um político
goiano, deputado federal, que já estimulou o ódio aos professores, pregando que
alunos e alunas os filmem, caso algo dito em sala contrarie seus pressupostos
ideológicos ultra-direitistas. E, por meio da pressão, tentem impedir que a
realidade seja mostrada da forma como o conhecimento e a ciência deve se
comportar.
O mais trágico
disso é ver uma universidade se rebaixar ao ponto de retirar um livro de literatura,
da lista de indicações ao vestibular, sob o argumento do mesmo ser propagador
de pornografias. Obviamente, visto assim pela mente pornográfica desse pervertido
parlamentar.
Mas, se nem mesmo
uma universidade resiste a essas pressões estúpidas, e garante a liberdade de
expressão e valorização da literatura universalmente, que tipo de futuro
estaremos construindo nesses tempos tóxicos onde se permite estabelecer um index,
de livros proibidos, tal qual se fazia durante o período da inquisição, séculos
atrás, durante as longas e terríveis sombrias noites medievais, quando as fogueiras
e os enforcamentos eram estabelecidos como punição a quem ousasse contrariar os
valores definidos pela igreja.
Não há dúvidas,
precisamos urgentemente de um novo iluminismo, para romper mais uma vez com as
trevas que nos atormentam e desejam impedir que o conhecimento por meio da
ciência, garanta às novas gerações melhores dias, com transformações sociais e
tecnológicas que façam o mundo avançar, e não regredir como desejam esses canalhas
que nos querem impedir de sorrir. Faço aqui, para finalizar de fato, uma alusão
ao romance O Nome da Rosa, uma das grandes obras literárias de Umberto
Eco, quando por meio de mistérios e crimes inquisitoriais, o que se pretendia
era impedir que as pessoas naquele período das trevas medievais, tivessem
acesso a um dos livros da poética, de Aristóteles, o que trata do riso. O
argumento era que estimular as pessoas ao riso impedia que elas sentissem medo.
E pelo medo, ódio e maniqueísmo, se torna mais fácil controlar mentes incautas.
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Ótima análise.
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