Escrevi esse artigo depois do primeiro turno das eleições de 2022. Reitero aqui o que disse, e insisto que não há uma estratégia da esquerda para conter esse viés conservador e fascista que se impõe em nosso país. Com o quadro eleitoral dessas eleições municipais, podemos afirmar que a reeleição do presidente Lula em 2026 está sob forte ameaça. A menos que a esquerda mude o rumo, reforce a organização entre os trabalhadores, nas periferias das cidades (dominada pelo neopentecostalismo) e, principalmente, entre a juventude. Ao mesmo tempo que retorne à critíca visceral sobre as desigualdades sociais geradas e mantidas pelo capitalismo, e procure estabelecer uma estratégia que leve em conta a totalidade do funcionamento de nossa realidade, procurando fugir de bolhas que somente isolam a esquerda e compreendendo o conservadorismo que impera na sociedade a partir, principalmente, de uma base religiosa reacionária. Se não fizermos isso, estaremos sujeitos à mesma punição imposta à Sísifo, condenado pelos deuses, segundo a mitologia grega, por não cumprir o prometido. (Outubro de 2024)
Nas primeiras
horas da segunda-feira pós-eleitoral, em que alguns festejam em meio aos
escombros de uma tempestade conservadora, reacionária, refleti comigo mesmo, no afã de tentar convencer os que lerem ou ouvirem o que tenho aqui a
dizer, que nem sempre a experiência de anos de militância consegue acompanhar
com serenidade e coerência as mudanças conjunturais da sociedade.
Eu me consumo aqui
em meio a uma ressaca, ou como se eu tivesse sido massacrado em uma luta de MMA
e ganhado por pontos o primeiro round. Isso para mim reflete o resultado
eleitoral desse Brasil profundo, de mentalidades arcaicas, dominadas por sicofantas,
farsantes, falsários e pilantras. Mentalidades que se apegam a uma espiritualidade
canhestra, de comportamentos desajustados do ponto de vista da ética e do
respeito humano, mas que se apegam aos discursos moralistas hipócritas de
fariseus acanalhados, pérfidos sugadores de massa cerebral, de gente frágil,
alienada, ressentida por uma realidade da qual não compreende em sua dinâmica e
se apega ao discurso que lhe amedronta do púlpito ensandecido, pela viralidade
de pregações que apostam no medo, na alienação e no desespero.
Mas do lado em que
eu sempre me postei, temos feito o certo? Adotado estratégias que, ao longo dos
últimos anos, tentem entender o que se passa pela cabeça de cada um desses
indivíduos que se juntam e compõem o que conhecemos como sociedade brasileira?
Ou será que nas últimas décadas não nos afastamos da realidade e nos metemos em
bolhas, de onde falamos e gritamos para nós mesmos, sem que isso ecoe pelos
cantos por onde a hipocrisia campeia e da forma como sempre consolidou comportamentos
dantescos, violentos, misóginos, machistas e oportunistas?
Não quero parecer
arrogante, como se possuísse o dom da verdade e que minhas palavras fossem as únicas a iluminar essas trevas que nos cercam. Reconheço minha pequenez nesse
ambiente de disseminação de “verdades incontestáveis” espalhadas celeremente
pelas redes sociais, com milhões de visualizações. Aqui, sei que falo e me
comunico com algumas dezenas, de amigos e amigas que comungam das minhas ideias,
mas nem sempre me dão o crédito necessário a ponto de dividir essas opiniões
com muitas outras pessoas. Percebo que os que me leem, refletem, às vezes
concordam, mas deixam de lado palavras que não se escoram em princípios de
autoridades. Algo que se tornou muito comum entre as pessoas mais esclarecidas.
É preciso citar expressões e falas de eminências intelectuais para ser ouvido e
acreditado.
Me permiti ao
longo deste ano refluir em meu ímpeto de produzir artigos para o meu blog e meu
canal no YouTube. Percebi que o alcance era muito restrito e o conteúdo estava
repetitivo, porque, com perdão da arrogância, em minhas análises eu já havia apontado
o diagnóstico daquilo que nos carcomia enquanto sociedade, e como os cérebros
humanos se deterioravam.
Por isso, quero me
expressar relembrando o que já estava escrito em um desses textos, e pelo que
se poderá ver, a quem tiver paciência de chegar ao final, que nada do que
estamos passando é surpreendente, porque já estava em curso há anos, em um
processo de transformação de uma realidade social que invertia o caminho que
pensávamos estar em fase de construção, por um viés progressista. Nos enganamos.
Nos fechamos em bolhas, falando para nós mesmos, com discursos virulentos
identitários, como se isso fosse suficiente para o convencimento de mentes
conservadoras e reacionárias. Despertamos com força o ódio, e vimos ser
naturalizada uma violência que é parte de uma estrutura que compõe, com as
fissuras que se ampliam, um sistema putrefato, carcomido, mas que no auge de
sua crise torna mais perverso e insuportável suas contradições.
Deixamos de
procurar entender os mecanismos de funcionamento desse sistema, e o embate que
existe nele por meio da luta de classe, e nos prendemos a lutas corporativas,
setorizadas, invertendo qualquer lógica de compreensão revolucionária e
transformadora, que nos aponta a necessidade de travar uma luta que aglutine
todos os setores, ao invés de segmentá-los. Caímos na armadilha da
globalização, por onde a segmentação e a separação se constituiu num elemento
forte para a consolidação da lógica individualista que se espalhou pelo mundo
desde o final do século passado. Abrimos, assim, o caminho para a ação de
missionários, comerciantes da fé, que se espalharam pelos rincões perdidos
desse país, e pelas periferias abandonadas, e constituíram formas de
organização que estavam na origem de nossas organizações revolucionárias: as
células.
O ressentimento, a
revolta, o medo, a sensação de abandono, a pobreza crescente, tudo isso, jogou
multidões nas garras desses oportunistas, e prenderam as pessoas num ambiente
de controle moral e de costumes arcaicos. Retrocedemos séculos e vimos ser
transportados para o mundo atual os valores de uma idade média e de uma
antiguidade onde deuses e demônios disputavam as mentes frágeis de pessoas
ignorantes e desconhecedoras da realidade. Onde se encontravam esses valores?
Onde sempre estiveram, em ditos "livros sagrados", cientificamente incomprováveis,
historicamente falseados e absurdamente citados anacronicamente.
A planitude do
mundo se apresentou em toda a sua plenitude, repleto de estupidez, ignorância e de visões fantasmagóricas e estapafúrdias. Como no filme “A Vila”, vivemos em uma
realidade construída, falseada, dominada pelo medo e pelo temor de sermos
punidos por entidades vingativas que nos controlam: "Aquelas de Quem Não
Falamos". Por isso me inspirei no livro “O mundo assombrado pelos demônios”,
de Carl Sagan, para escrever um dos meus últimos artigos, que passo em seguida
a me referir, espero que não parem por aqui, e observem o que publiquei em meu
blog em maio de 2021...
(*) CENÁRIOS
SOMBRIOS E UM MUNDO SEM RUMO – BIOPODER, FASCISMO E HIGIENISMO (Artigo
publicado no Blog Gramática do Mundo. Link de acesso: https://gramaticadomundo.blogspot.com/2021/05/cenarios-sombrios-e-um-mundo-sem-rumo.html
(**) Veja também pelo Canal Romucapessoa, no YouTube: https://youtu.be/Iazk6TiaCHI
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