sábado, 25 de março de 2017

UNIVERSIDADE, PARA QUE E PARA QUEM?

Nos últimos anos tenho refletido sobre qual perfil de universidade deveria nos empolgar e nos envolver. Ou, como dizia Milton Santos, com a ideia de universidade. “...É a partir da idéia sempre renovada de universidade que julgamos as universidades concretas e sugerimos mudanças”.[1]
Fui bastante crítico em alguns artigos que escrevi no Blog Gramática do Mundo,[2] o que não significa ter uma visão pessimista ou negativa do que temos sido e nos transformado. Mas penso que podemos ser melhor, naquilo que deve ser a essência de uma universidade.
Por anos passei lidando com lutas travadas nesse ambiente, na tentativa de encontrarmos o melhor caminho para uma instituição que cumpre um papel importante no desenvolvimento regional e nacional, bem como na formação de jovens que se qualificam para enfrentar com competência o mercado de trabalho.
Não restam dúvidas que a universidade brasileira sofreu impactos significativos a partir de amplos investimentos nos últimos governos. Até o primeiro governo da presidenta Dilma Rouseff. Mas fundamentalmente durante os governos Lula, com o programa de reestruturação e expansão das universidades federais (REUNI). No entanto, devemos refletir sobre a universidade permanentemente, e nos inquietarmos quando não identificamos nela um ambiente de renovação e de enfrentamento com a acomodação.
As universidades brasileiras, e a UFG não foi exceção nessa regra, foram bem servidas nesse processo de expansão. Ampliaram-se significativamente as estruturas, novas universidades foram criadas, houve um aumento significativo de novos cursos e expandiu-se como nunca as vagas, possibilitando que um número maior de jovens tivesse acesso ao ensino superior público e gratuito. Os investimentos em pesquisa foram acompanhados pelo incentivo a criação de novos cursos de pós-graduação, ampliando o número de cursos de mestrado e doutorado. Políticas de inserção social, por meio de mecanismos até então inexistentes, o sistema de cotas para jovens negros e/ou oriundos da rede publica de ensino, abriu caminho para uma maior democratização no acesso às universidades.
Tudo isso foi efetivado por meio de processos complexos de discussão nas instituições, mas com pouca margem de opções sobre como aplicar os recursos. Naturalmente, não se podia vacilar em relação à aceitação, como uma condição essencial para a expansão e modernização das estruturas existentes nas universidades. Mas até em que ponto se planejou, e se analisou como seria futuramente a capacidade dessas instituições em manter o crescimento proposto? Diante de uma crise econômica que sangrava a maioria dos países de todo o mundo, os investimentos federais teriam condições de serem mantidos? Bem, o futuro chegou, e nos deixou diante de uma situação absolutamente complicada quanto aos rumos da universidade. O que fazer?
Neste momento precisamos apontar caminhos diferentes daquele que foi marcado por uma euforia diante da disponibilidade de recursos, que nos deixou anestesiado para analisar de forma competente os riscos que existiam na adoção de algumas exigências focadas na necessidade de ampliar o número de vagas, de criação de novos cursos e de contratação de mais professores como consequência dessas medidas.
Verificamos, num dos aspectos que nos prende especificamente neste artigo, a graduação, que não houve uma análise criteriosa dos impactos que se seguiriam à criação de alguns cursos, principalmente no tocante à existência de um mercado que pudesse absorver os futuros profissionais, além da expectativa em relação à procura pelos mesmos, e isso mesmo visto como uma relação dialética, entre a absorção do mercado e a escolha pelos jovens de cursos que lhes garantissem essa possibilidade.
Mas, o mais grave, contudo, foi a não preparação da universidade para as mudanças em curso, desde a criação do ENEM até a implantação do SISU, que gerou uma espécie de desorganização interna e uma excessiva mobilidade dos estudantes na indefinição sobre qual curso ele desejaria seguir e se formar. Tornou-se comum a troca de cursos até o segundo ano, com o deslocamento principalmente daqueles cuja perspectiva de inserção no mercado, com salários desvalorizados, são mais críticos. Principalmente num ambiente de crise econômica, recessão e retração do mercado de empregos.
Essa situação é ruim para o país, não somente para a universidade, pois traz como consequência a insuficiência de profissionais em determinadas áreas, afetando sobremaneira as licenciaturas, área de formação de professores.
Isso não é um problema restrito a uma única universidade, mas a todo o sistema. Contudo, internamente, cada universidade deveria se preparar para lidar com essas situações. Ao não fazer isso se criou uma situação que torna o sistema mais caro, na medida em que cresce muito a evasão e reduz a proporção entre professor e aluno. A contradição visível é que, muito embora tenha sido reduzido o funil da entrada, já que se ampliaram consideravelmente as vagas, houve uma redução do número de formandos, estreitando-se o funil na saída. Alguns cursos neste ano não conseguiram colar grau de mais do que cinco alunos, sendo preciso que a universidade aglutinasse numa mesma solenidade de formatura até seis cursos, algo absolutamente impensável quando se proporcionou há alguns anos a implantação do REUNI.
São desafios como esses que tornam necessário uma mudança de rumo na UFG. Precisamos redefinir as prioridades, mas é essencial, repensar qual é o sentido dessa instituição, que não somente a formação e preocupação com o mercado. Isso passa por valorizar mais a graduação, estimular os novos estudantes e incentivar os professores a compreenderem que o fortalecimento da qualidade na pós-graduação passa pela boa formação de base dentro da universidade, ou seja, de estudantes de graduação com competência e desejo de prosseguir nos estudos visando um mestrado ou doutorado.
Além do mais, não podemos nos esconder das discussões de questões que dizem respeito à educação de maneira geral, no âmbito da sociedade, porque elas dizem respeito à maneira como aqueles profissionais que formamos serão inseridos na sociedade e no ambiente de trabalho. Participar de discussões sobre, por exemplo, decisões que afetam a valorização dos professores, por meio de questionamentos e/ou sugestões às medidas adotadas pelo estado e município, constitui-se numa quase obrigação, que reforça de forma ampla o sentido da universidade, da formação de saberes, mas também de identificação com a sociedade. O acompanhamento de reformas, como a do ensino médio, não deve se dar somente a partir de convites recebidos para participação em audiências públicas, mas a universidade deve se colocar como protagonista nessas discussões, antecipando-se a decisões que venham a ser irreversíveis, ou quase isso, como aconteceu na recente discussão e aprovação de uma reforma do ensino médio que já tramitava há anos no Congresso Nacional.
Esses são elementos que nos embalam na decisão de disputar a condição de mais do que um gestor. Mas um reitor e um condutor de decisões que não se limitem somente a valorizar os aspectos quantitativos e estruturais, mesmo que sem esquecer destes. Mas também a resgatar aqueles elementos que sempre fizeram da universidade um templo de saber e a uma instituição respeitada e admirada na sociedade.
No próximo artigo abordarei a importância da pós-graduação e as necessárias medidas para fortalecê-la.
É PRA FRENTE QUE SE ANDA!

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