quinta-feira, 31 de março de 2011

OS DIREITOS HUMANOS COMO PRETEXTO PARA MAIS AGRESSÕES IMPERIALISTAS

Retrocedendo às posições tomadas anteriormente, durante o governo Lula, o Brasil da presidenta Dilma entrou por um caminho perigoso na política externa, ao votar no Conselho de Direitos Humanos da ONU a favor de investigação sobre violação de direitos humanos no Irã. Corre o risco de se tornar coadjuvante de um jogo dos Estados Unidos cuja estratégia é isolar aquele país e assim encontrar justificativa para que decisões semelhantes ao que ocorre na Líbia possam acontecer também com o país persa.

Os direitos humanos no mundo são atingidos indiscriminadamente. Por todos os continentes e em praticamente todos os países modalidades diferenciadas de desrespeito aos direitos das pessoas acontecem, sem que sejam tomadas quaisquer iniciativas para contê-los. Ou, quando o são, esbarram na própria contradição da lógica democrática. Afinal, aos miseráveis é garantida a liberdade para superar suas pobrezas. Mesmo que isso somente seja possível a partir de uma pedra de “crack”.

O Brasil, por exemplo, convive abertamente com casos explícitos de homofobia, ataques perpetrados por grupos de ideologias nazifascistas, acobertados pela hipocrisia de segmentos religiosos, intimidam e assusta quem livremente faz sua opção sexual. De forma hedionda, mesmo que no pretexto de liberdades políticas democráticas, vemos um projeto de lei que transforma em crime tais atos, que fere o direito da pessoa humana, ser atacado por setores religiosos. Parlamentares evangélicos se levantam, como a dar guarida a essas ações, e, portanto podem ser considerados cúmplices, ao tentar impedir que esses atos sejam considerados crimes.

Ora, não se pode confundir opinião, a respeito de se aceitar ou não determinado comportamento, com ações que visam até mesmo eliminar as pessoas que assumem determinadas posições. Qualquer um pode ter uma opinião contrária a determinado pensamento ou postura, só não pode violentar o direito das pessoas de serem diferentes. E diferentes da lógica construída por determinados valores culturais, que se forem impostos transformam-se em atos de intolerância. Pois se não ferem a lei, as pessoas não podem ser impedidas de tal ou qual escolha.

Como no Irã, também aqui no Brasil, a religião tenta determinar valores que se contrapõe às escolhas de vida das pessoas, relembrando os tempos medievais, quando não se podia ir contra os escritos dos chamados livros sagrados cristãos. E da intolerância e imposição dos dois lados, cristãos e muçulmanos deram início às escaramuças que atravessaram toda a idade média, e ainda permanecem em alguns países.

O que dizer também do bloqueio criminoso à Cuba? Seguramente a pequena ilha tem também problemas que agridem os direitos humanos. Como a tentativa de impedir manifestações de opiniões contrárias ao regime vigente, inclusive com prisões de chamados “dissidentes”, e ela tem sido bastante criticada por isso e já tem tomado iniciativa para libertá-los. Mas impedir, por imposições de sanções, que se estabeleça um livre comércio com aquele país, se constitui também violações aos direitos humanos, porque afeta sobremaneira a população. E isso acontece há mais de quarenta anos.

E Guantánamo? Há quantos anos se constitui em uma fortaleza imperialista estadunidense em solo cubano, transformada em prisão onde se pratica as mais vis práticas de torturas contra cidadãos suspeitos de terrorismos. Sem julgamento e sem o respeito aos direitos civis.

Da mesma maneira, por territórios ocupados pelos Estados Unidos, a prática de tortura é corriqueira e constantemente denunciada. O deslocamento de prisioneiros para países aliados, e com histórico de desrespeito aos direitos humanos, constitui-se em uma estratégia estadunidense para esconder-se das acusações. É sabido por todo o mundo que tais práticas se repetem acintosamente. Inclusive em navios-prisões, adaptados para realizar essas ações em águas internacionais, longe das fronteiras territoriais nacionais.

E no que se transformou o Afeganistão? Tanto quanto no Iraque, com as denúncias de torturas e humilhações na prisão de Abu Graib, e por todo o processo de ocupação naquele país, com sistemáticas violações dos direitos humanos, o que se vê também neste país, sob ocupação “humanitária” dos EUA é o total descontrole de soldados e a sistemática execução de civis.

Embora todos esses crimes sejam acobertados pelo Pentágono, as ações de instituições independentes, como o wikileakes, e de órgãos da imprensa que já se cansaram das mentiras da Casa Branca, trazem à tona todos esses frontais desrespeitos cometidos sob o pretexto de combater o terrorismo.

A Revista Rolling Stone, edição dos EUA, publica em seu último número uma reportagem especial denunciando flagrantes violações aos direitos humanos no Afeganistão. Cenas chocantes de fatos ocorridos em 2010 e bloqueados pelo Pentágono escandalizam o mundo. Coincidência, ou não, a divulgação desses fatos e fotos acontece justamente quando se inicia o ataque à Líbia. Diga-se de passagem, a partir de uma repentina mudança de atitude por parte da Hillary Clinton. Estranho, não? Ou seria uma estratégia para esvaziar a notícia?

A revista mostra em uma reportagem recheada de fotos, as ações de soldados 3º Pelotão da Companhia Bravo, alocada na província afegã de Kandahar, uma das regiões mais violentas daquele país. O texto informa que essa equipe demonstrava o desejo de matar, e escolheu um jovem de 15 anos. Mas ele não seria o único, outros teriam sido também assassinados pelo mesmo grupo, que nunca foi julgado pelos crimes. O grupo tirou fotos, que vazaram e foram publicados pela revista. Algumas delas insiro aqui no blog, outras, no entanto, são muitos fortes, chocantes. Mas elas podem ser verificadas no site da revista: (http://www.rollingstone.com/politics/photos/the-kill-team-photos-20110327/0602176).

No Oriente Médio, como se vê nas revoltas populares, a intolerância tem levado a população às ruas gritando por transformações sociais. Na maioria, países aliados dos Estados Unidos, com um velho histórico de desrespeito aos direitos humanos e de intolerância religiosa.

Quase por toda a África a situação é semelhante. Recentemente, na Costa do Marfim, sete mulheres foram assassinadas por forças leais ao governo derrotado nas urnas, mas que se recusa a aceitar a derrota (Carta Capital, nº 637, PP 48/49). Somente este ano mais de 400 pessoas já morreram no conflito e o número de deslocados, segundo a ACNUR (Alto Comissariado da ONU para Refugiados), poderá chegar a um milhão (http://www.acnur.org/t3/portugues/noticias/noticia/marfinenses-fogem-da-guerra-e-abandonam-abidjan/). No Congo, em Uganda, no Sudão, cuja crise em Darfur se manteve praticamente distante das preocupações “humanitárias” da ONU e das potências ocidentais a situação se repete.

Também a Rússia tem sistematicamente usado de todo o tipo de violência contra os grupos que se opõem ao governo. A Chechênia é um exemplo disso, muito embora a ação dos rebeldes seja também agressiva e com danos cruéis à população civil, a reação dos agentes do Estado é desproporcional, e as denúncias de práticas de torturas e eliminação de opositores e de profissionais da imprensa são constantes.

Da mesma maneira a China, potência em ascensão, reage com violência a qualquer protesto contra o governo. E impede que qualquer investigação seja feita contra violações de direitos humanos. Acrescente-se a isso a complexa situação do Tibete, como resolvê-la? A luz da soberania, ou com “intervenções humanitárias”?

Há alguns anos, para repelir as acusações do governo Bush, a China divulgou um documento com uma série de denúncias contra os EUA. As duas potências se acusam mutuamente por impedir que idéias divergentes se consolidem. A China, com um governo extremamente fechado e com poucas liberdades políticas; e os EUA com a neurose anti-terrorismo impõe com o patriot act uma forte restrição à liberdade individual, principalmente contra estrangeiros. Tornado lei em 26 de outubro de 2001.

Israel, então, com sua política criminosa de manter um cerco permanente contra a faixa de Gaza, impedindo até mesmo a chegada de produtos essenciais ao dia-a-dia dos palestinos, transforma aquela área em uma das maiores concentrações populacional do planeta, com a maioria das pessoas vivendo abaixo da linha de pobreza. E o que dizer das monarquias decrépitas do Oriente Médio, assentadas nas imensas reservas de petróleo, como a Arábia Saudita, o Bahrein, Emirados Árabes, e fiéis aliados dos EUA?

Vejam esse caso ocorrido nos Emirados, segundo reportagem da BBC Brasil, publicado na Folha Online em 30.03.2011: Mulher processa hotel por ser presa após denunciar estupro - Uma australiana,Alicia Gali foi condenada a 12 meses de prisão depois de ter alegado ter sido violentada por três colegas de trabalho, quando bebia com colegas no bar do Le Meridien Al Aqah Beach Resort, nos Emirados Árabes, em junho de 2008. A australiana acabou presa por ser ilegal, manter relações sexuais fora do casamento nos Emirados Árabes e foi acusada e condenada de ter feito ''sexo consensual''. Estupro só é considerado crime no país se quatro homens muçulmanos testemunharem o ocorrido. Após ter relatado o crime à polícia, Alicia Gali acabou sendo presa por adultério e cumpriu uma pena de oito meses. Ela foi perdoada em março de 2009 e regressou à Austrália.

Mas, também, sem dúvidas, essa situação de flagrantes desrespeitos acontece no Irã. Embora não sendo uma monarquia, seu regime escora-se na intolerância religiosa e sustenta-se também no chamado “ouro negro”.

Contudo, o que o diferencia dos demais? A velha rivalidade com os EUA e a “prepotência” do regime dos Aiatolás em não se curvar aos interesses imperialistas estadunidenses.

Portanto, todo esse histórico, ainda sendo um pequeno mosaico do que é de fato na realidade, nos dá a dimensão de como os direitos humanos são desrespeitados em todo o mundo. Repito, inclusive no Irã. E mesmo no Brasil, que até hoje não acertou as contas com seu passado, convivendo com a impunidade de torturadores “anistiados” pelos chefes que ordenaram assassinatos de militantes políticos.

Esperamos, pelo menos, que essa posição da política externa do Brasil seja uma sinalização de que a Comissão da Verdade será constituída. De resto, espalha-se pelas prisões de nosso país práticas corriqueiras de torturas e assassinatos praticados por grupos de extermínio. Embora investigações em curso levem alguns policiais à prisão a justiça os soltam, fortalecendo o sentimento de impunidade e levando à repetição desses crimes por quase todos os estados brasileiros. A estrutura Policial brasileira se mantém ainda dentro dos princípios formulados no período da Ditadura Militar.

Se há no geral violações aos direitos humanos, e se é fato que eles precisam ser investigados e combatidos, indistintamente, porque o Conselho de Segurança da ONU determina apenas que essa investigação se dê no Irã? Ora, ou se faz isso no geral, ou o Brasil não deveria servir de instrumento para atender os interesses rapaces dos Estados Unidos, que desejam ardentemente invadir o país persa a fim de consolidar seu controle sobre as três principais reservas de petróleo daquela região: Arábia Saudita, Iraque e o próprio Irã.

Enreda-se por um caminho perigoso, a diplomacia brasileira, na medida em que procura ser amável aos Estados Unidos com o intuito de obter deste país o aval para que o Brasil possa vir a participar como membro permanente do Conselho de Segurança. Vender a “alma”, ao estilo de Fausto (da obra de Goethe), que sucumbiu à Mefistófeles, tirará do Brasil a marca de ser um país que sempre procurou ostentar uma política externa independente. Principalmente na última década.

O Brasil pode ter tomado uma decisão, apoiando essa resolução contra o Irã, que irá consubstanciar futuramente o estabelecimento de sanções econômicas contra aquele país (o que nos afetará, inclusive, economicamente), o que sempre se constitui no primeiro passo para uma possível – e há muito desejada – invasão imperialista.

Ou se toma decisões que sejam regra geral para todos os países, e assim se acompanha de forma permanente, e com sanções pré-definidas, as violações dos direitos humanos, ou se estará fortalecendo a política hipócrita da potência hegemônica de nítidos interesses imperialistas.

Assim, pouco a pouco se tornará letra morta um dos valores fundamentais da consolidação dos Estados Nações: o respeito á soberania nacional. Se assim o for, se afirmará a nova estratégia de dominação dos Estados Unidos e demais potências européias, como denuncia o historiador Moniz Bandeira, de uma nova “doutrina da intervenção humanitária” (http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=17611). Obviamente, ela seguirá os passos das riquezas a serem exploradas de acordo com os interesses imperialistas.

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