sexta-feira, 24 de outubro de 2025

NÃO HÁ PAZ SOB OS ESCOMBROS DE GAZA

Por dois anos acompanhamos, em tempo real, um massacre sobre uma população civil em Gaza, território palestino, no Oriente Médio. Ação que explodiu a partir um ataque terrorista do Hamas contra a população israelense, no intuito de aprisionar civis que serviriam como base de troca por palestinos presos por Israel, transformou-se numa carnificina, que resultou em mais de mil mortos e centenas de pessoas sequestradas. Justificando o direito de defesa, embora seja quase sempre o agressor, o governo de Israel desencadeou uma ofensiva violenta que resultou, sem dados precisos, mais de 60.000 mortos. Número que efetivamente deve ser muito maior, visto que sob os escombros de Gaza centenas de corpos apodrecem sem que possam ser contabilizados nessa conta macabra no que se transformou esse conflito.

Mas é simplista temporalizar em dois anos um conflito que dura há mais de sete décadas a partir da criação do Estado de Israel. Historicamente podemos retroceder mais no tempo, ao final da primeira guerra mundial, quando o império turco-otomano derrotado viu seus domínios serem divididos entre os países vitoriosos. No caso específico, entre Inglaterra e França, a partir do acordo Sykes-Picot, protagonizado por Mark Sykes e François Georges-Picot.

Com a segunda guerra mundial, e os custos gerados para esses países, como de resto resulta sempre numa conta trágica o final de qualquer guerra, o Oriente Médio passou a ser influenciado politicamente pela União Soviética. Para conter esse avanço restou aos britânicos, junto com os EUA, apoiar a criação de Israel, como estratégia para que essa região não saísse do controle do Ocidente, pelo que ela possui de riquezas em seu subsolo, principalmente petróleo e gás.

Poderíamos acrescentar a esse contencioso os elementos religiosos que envolvem as três maiores religiões, o cristianismo, o judaísmo e o islamismo, surgidos de um mesmo tronco étnico-religioso. Vagaríamos então por séculos, e até milênios, de confrontos e de embates que fazem dessa região um dos maiores palcos de guerras ao longo de dois mil anos.

Não é simples entender o que acontece nesse solo, considerado sagrado por essas três religiões. Mas a partir dos interesses estratégicos do Ocidente, os objetivos e a perversão de como passou a ser tratado o povo palestino dá a indicação de que por trás das encenações de paz há muito mais a compreender por sobre o massacre genocida que, desta feita, se deu por transmissões de imagens perversas em tempo real.

A dificuldade maior em compreender a maneira como se deu a quase completa destruição de Gaza, que hoje é vista como escombros, está na forma como a mídia ocidental traz as informações, nitidamente tratando a população palestina como “terroristas”, equiparando pessoas que vivem suas vidas em cotidiano opressor pelo Estado de Israel àqueles que combatem, mesmo que por formas inaceitáveis, contra um poder bélico enorme, mais ainda quando sob o suporte dos Estados Unidos. Esse olhar sobre o povo palestino cria um estigma que se espalha por boa parte do mundo, quase que a justificar uma reação desproporcional, criminosa e genocida do governo israelense.

Ao não atacar as causas dessas desavenças, que significa de imediato reconhecer o Estado da Palestina, e que para isso signifique refazer o traçado reconhecido pela ONU em 1947 do território palestino e do território de Israel, esse conflito não terá fim. E a paz será apenas um arremedo de interesses econômicos e estratégicos sobre um solo devastado, em meio a escombros, onde se espalham sem que possam ser encontrados corpos de crianças, mulheres e idosos palestinos, de famílias inteiras que apenas desejavam, e desejam, viver em paz, em seu território e com um Estado-Nação.

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(*) Este artigo foi publicado, numa versão resumida, no Jornal O Popular, de Goiânia, no dia 21 de outubro de 2025. (https://opopular.com.br/opiniao/artigos/sob-os-escombros-de-gaza-1.3326431)