terça-feira, 18 de janeiro de 2011

A DIALÉTICA DA NATUREZA(*).

Apresento abaixo extratos de um texto de Engels, escrito no século XIX. A partir dele, meu próximo post irá abordar os problemas sociais gerados pela ação violenta da natureza e os comentários que se fazem sobre a tragédia humana que acompanha as “catástrofes naturais”.

FRIEDRICH ENGELS

“Os animais, como já indicamos, modificam, por meio de sua atividade, a natureza ambiente, da mesma forma (mas não no mesmo grau) que o homem; e essas transformações por eles produzidas em seu ambiente, atuam, por sua vez, como já vimos, sobre os elementos causais, modificando-os. Isso porque, na Natureza, nada acontece isoladamente.

Mas, quando os animais exercem uma influência duradoura sobre o ambiente em que vivem, isso se dá independentemente de sua vontade, constituindo um fato puramente causal. O homem, porém, quanto mais se afasta da animalidade, tanto mais sua influência sobre a natureza ambiente adquire o caráter de uma ação prevista, que se desenvolve segundo um plano, dirigida no sentido de objetivos antecipadamente conhecidos e determinados.

O animal apenas utiliza a Natureza, nela produzindo modificações somente por sua presença; o homem a submete, pondo-a a serviço de seus fins determinados, imprimindo-lhe as modificações que julga necessárias, isto é, domina a Natureza. E esta é a diferença essencial e decisiva entre o homem e os demais animais; e, por outro lado, é o trabalho que determina essa diferença.

Mas não nos regozijemos demasiadamente em face dessas vitórias humanas sobre a Natureza. A cada uma dessas vitórias, ela exerce a sua vingança.

Cada uma delas, na verdade, produz, em primeiro lugar, certas conseqüências com que podemos contar; mas, em segundo e terceiro lugares, produz outras muito diferentes, não previstas, que quase sempre anulam essas primeiras conseqüências.

E assim, somos a cada passo advertidos que não podemos dominar a Natureza como um conquistador domina um povo estrangeiro, como alguém situado fora da Natureza; mas sim que lhe pertencemos, com a nossa carne, nosso sangue, nosso cérebro; que estamos no meio dela; e que todo o nosso domínio sobre ela consiste na vantagem que levamos sobre os demais seres de poder chegar a conhecer suas leis e aplicá-las corretamente.

Na realidade, a cada dia que passa aprendemos a compreender mais corretamente as suas leis e a conhecer os efeitos imediatos e remotos resultantes de nossas intervenções no processo que a mesma leva a cabo. Principalmente em virtude dos gigantescos progressos realizados pelas ciências naturais no século atual (XIX), cada vez mais nos encontramos em condições de conhecer as consequências mais remotas de nossas mais comuns atividades de produção.

Mas, se foi necessário o trabalho de milênios para que chegássemos a aprender, dentro de certos limites, a calcular os efeitos remotos de nossos atos orientados no sentido da produção, isso era muito mais difícil no que diz respeito aos efeitos sociais remotos (de longo prazos), desses atos.

Na verdade, porém, aprendemos nesse campo (do trabalho), gradualmente, por meio de uma longa e quase sempre dura experiência (e mediante a coordenação e investigação do material histórico), a compreender claramente as consequências sociais, indiretas e remotas, de nossa atividade produtiva, o que nos proporciona a possibilidade de dominar e regular também essas conseqüências.

Mas, a fim de conseguir essa regulação, não basta o simples conhecimento. Para isso, será necessária uma completa revolução em nossa maneira de produzir e, ao mesmo tempo, de toda a ordem social atualmente dominante.

A ciência social da burguesia, a economia política clássica, ocupa-se apenas com os efeitos sociais imediatos a serem obtidos através das atividades humanas dirigidas no sentido da produção e da troca. Isso corresponde inteiramente à organização social da qual ela é a expressão teórica. Daí a razão por que os capitalistas, cada um por seu lado, produzem e trocam tendo apenas em vista o lucro imediato e, assim sendo, só podem colocar em primeiro lugar os resultados mais próximos e diretos.

Considerando que qualquer industrial ou comerciante apenas se preocupa em vender, com um pouquinho de lucro embora, a mercadoria fabricada ou comprada, está claro que fica satisfeito e não mais se interessa pelo que possa acontecer com a mercadoria e com o seu comprador.

O mesmo (sucede) com as conseqüências naturais dessas mesmas atividades. Aos agricultores espanhóis estabelecidos em Cuba, que queimaram as matas nas encostas das montanhas (tendo conseguido, com as cinzas daí resultantes o adubo suficiente para uma só geração, para cafeeiros muito lucrativos), que lhes importava o fato de que mais tarde, os aguaceiros tropicais provocassem a erosão das terras que, sem defesas vegetais, transformaram-se em rocha nua?

Em face da Natureza, como em face da sociedade, o modo atual de produção só leva em conta o êxito inicial e mais palpável; e, no entanto, muita gente se surpreende ainda pelo fato de que as conseqüências remotas das atividades assim orientadas sejam inteiramente diferentes e, quase sempre, contrárias ao objetivo visado.”


(*) Extratos do Apêndice do livro DIALÉTICA DA NATUREZA de Friedrich Engels, escrito no final de 1875 e começo de 1876. O texto, que inicialmente recebeu como título: “a humanização do macaco pelo trabalho”, foi modificado posteriormente para “A servilização do trabalhador” e foi redigido originariamente como introdução a um trabalho mais extenso denominado “As Três formas Fundamentais da Servidão”.

Essas citações foram retiradas da 3ª edição do livro DIALÉTICA DA NATUREZA, editado em 1979 pela Editora Paz e Terra. Páginas 215 a 227. O texto não foi concluído por Engels.

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