Em outras
oportunidades, isso está registrado em alguns artigos neste blog, usei dessa
parte da mitologia grega para indicar o quanto se torna difícil buscar soluções
em meio a situações que nos são, ou de difíceis compreensão, ou por ignorarmos
um aspecto importante, a necessidade de compreensão da conjuntura na qual
estamos metidos. A resposta ao dilema da esfinge, nas circunstâncias em que
vivemos, seguramente não deixaria nenhuma pessoa surpresa com o resultado da
charada decifrada por Édipo.
“— Qual é o animal
que de manhã anda com quatro pés, à tarde com dois e à noite com três?” Algo
aparentemente simples ao ser indagado, mas não encontrava quem respondesse
corretamente. Assim é o dilema que penso estarmos vivendo. Não há surpresa, mas
relutamos em que fazer, embora o próprio governo nos empurre para a
radicalização.
Mas, existe um
ditado popular que, creio, a maioria conhece: “prudência e caldo de galinha,
não fazem mal a ninguém”. Em menos de um ano e meio estávamos às voltas com uma
apreensão terrível, será que conviveríamos por mais quatro anos com uma pessoa
abjeta a nos presidir, que sempre teve como um dos alvos prioritários a
universidade? E não creio que seja difícil responder se perguntarmos: estamos
livres desse estrupício? Talvez o estrupício, sim, por enquanto, mas não das
perversidades de sua turma cujo objetivo foi espalhar escolas militares por
todo o país, bem ao estilo produzido durante o 3º Reich, sob o comando de Adolf
Hitler, a partir de 1934. Sugiro que leiam sobre como estavam estruturadas as
escolas durante o regime nazista, em que se espelhou o governo Bolsonaro.
Não. Não estamos
livres da sombra que nos turvou o nosso caminho nas universidades por mais de
quatro anos. Um período sombrio para as ciências, as pesquisas, as
universidades públicas, e um ataque bem direto e objetivo às áreas de
humanidades, por seu caráter mais crítico e contundente nas análises históricas
e sociais.
Alguns poderão
dizer que é uma postura defensiva, e que não podemos abdicar de lutar pelos
nossos direitos. Tudo bem, nos cabe debater a situação, dialeticamente. Mas sem
estigmas, e muito menos subir o tom no discurso, como forma de radicalizar nas
ações. No entanto, que estejam abertos a receber o contragolpe quando dissermos
que nessa conjuntura posta, radicalizar agora contra o governo facilita o
retorno da extrema-direita ao Poder, a começar pelas eleições deste ano.
O que não quer
dizer que o governo não possa ser criticado. Isso é necessário em uma
democracia, até para que essa queda de braço não termine por fortalecer o lado
conservador de um governo que é de coalizão e está nas mãos de uma maioria
também conservadora no Congresso Nacional. Nem muito menos que devemos ficar de
braços cruzados e aceitar uma negativa do governo em nos negar reposição
salarial, diante de perdas que já chegam a 40% acumuladas ao longo de pelo
menos dez anos.
Mas se trata de
saber como lidar com uma situação complexa, tendo a convicção que não
desejamos, sob hipótese alguma, voltar aos tempos sombrios dos governos Temer e
Bolsonaro. E isso não está descartado. As eleições deste ano serão um momento
importante para sabermos isso.
Posto isso como
devemos lidar com essa complexidade, que nos coloca num fio de uma navalha?
Primeiro buscar incansavelmente negociação com o governo, mesmo com falas que
visam nos esmorecer, mas que termina tomando um efeito contrário. Facilitar as
coisas para quem tem uma atração inexplicável por greve. É Impressionante como
determinados setores do serviço público, e na universidade também, entram em
êxtase na defesa da greve. Compreendo que o movimento grevista deve ser a
última alternativa, quando se esgotam todas as tentativas nas mesas de
negociação, principalmente na setorial.
É incompreensível
buscar de imediato mobilização para greve, com mesas de negociação em
andamento, quando o martelo ainda não foi batido. Por outro lado, nos deixa
abismado em saber que por quatro anos de governo Bolsonaro, e mais os dois anos
de Michel Temer, nenhuma mesa de negociação foi aberta, e nem por isso se
chamou um movimento grevista. Me lembro que o último desses movimentos foi em
2015, durante o governo Dilma Rousseff, que, embora eu tenha defendido a greve
naquele momento, não desconheço que isso também foi fundamental para aumentar o
desgaste da presidenta, o que levou ao seu impeachment golpista. Ou seja, é um
paradoxo, crescer o movimento e buscar confrontar o governo quando são de
esquerda e estão abertos à negociação. Ao passo que essa mesma gritaria e
enfrentamento não se deu quando a universidade estava sendo atacada de todas as
maneiras, e ficamos por mais de quatro anos sem nenhum reajuste.
O que me revolta
também, é o fato de muitos de nossos colegas, inclusive quem defende a greve,
não aparecer nas frentes de lutas, necessárias para dar visibilidade ao
movimento. Uma boa parte se limita a parar suas aulas na graduação, mas
prosseguem em suas atividades cotidianas ligadas à pós-graduação e pesquisa.
Além de aproveitarem para acelerar a produção de alguns textos, necessários e
tudo isso com datas definidas.
Enfim, todo esse
processo de luta, que inclua a greve é complexo. E entendo que não obteremos
resultados só com paralisação, mas com muito debate com o governo, articulação
política e participação de forma efetiva e convincente, com propostas
coerentes, na mesa de negociação.
Não entro na
questão dos servidores técnicos-administrativos, mesmo considerando a greve
intempestiva. Porque esse segmento talvez seja o mais prejudicado em sua
carreira dentre todos os servidores públicos federais. Então considero sua luta
justa e apoio a decisão de deflagração de greve, pois penso que neste caso já
se passou de um limite aceitável. O que parece haver uma sinalização do governo
para atender a proposta de plano de carreira dos técnicos-administrativos.
Entendo diante de
tudo isso, e mesmo querendo ser prudente na questão da defesa de greve, que
houve uma falta de habilidade do governo ao dizer desde o começo das
negociações que teríamos 0% de reajuste, e que os aumentos nos benefícios não
atenderiam aos aposentados e aposentadas. Ao fazer isso, os interlocutores do
governo mexeram num vespeiro, pelo fato de termos um grande percentual de
perdas salariais nesses dez últimos anos, que está em torno de 40%.
Por fim, enfatizo
minha opinião pela negociação, mas penso, como a maioria, que ficarmos sem
reajuste este ano é inaceitável. Já apresentamos a proposta, e esperamos que o
governo tenha juízo, a fim de evitar a extensão das greves, e garanta um
percentual este ano que possa fazer diminuir as perdas salariais desse período.
E mais do que isso, que possa corrigir algumas distorções em nossa carreira, a
começar por cumprir o piso salarial do magistério, que ele próprio cobra que os
estados e municípios cumpram.
Resta o nosso
dilema. Uma paralisação nossa, diferentemente de uma fábrica, ou de um setor de
fiscalização, não afeta o processo de produção. Em alguns casos com parada
completa da cadeia produtiva. Uma greve no serviço público, tão atacado pelo
neoliberalismo e com um fantasma de uma reforma administrativa pairando sobre
nossos pescoços, só afeta na relação com o governo, e contribui para o desgaste
do mesmo. Mas não tem impacto político na sociedade. Seguramente ampliará
aquilo que nos consome e já é motivo de muitas preocupações: o aumento da
evasão de estudantes, principalmente em áreas de licenciaturas. Ademais,
complica muito nosso calendário, que, a muito custo, deveremos normalizar neste
ano. Sendo este mais um fator de desgaste e enfraquecimento das instituições de
ensino superior. Porque ao fim, e ao cabo, seremos obrigados a repor todos os
dias paralisados.
Não adianta fechar
os olhos para essas questões, porque afetam nossas rotinas, a depender do
quanto uma greve demora a chegar ao fim. Porque sabemos como ela começa, mas
não como ela pode terminar. Tudo isso deve ser balizado no momento em que
formos tomar uma decisão radical. Que poderá acontecer, caso o governo insista
em negar reajuste este ano. Torço para que o Governo Lula – porque votei nele e
o apoio - não repita os equívocos de outros governos, de direita, que por muito
tempo deixaram a comunidade universitária sob cerco permanente, tensões e
negativa de reconhecer nosso direito a reajuste anual.
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